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               ESTA NÃO É A SUA VIDA
	               pré-roteiro de Jorge Furtado
	               versão de outubro de 1990
produção: Casa de Cinema de Porto Alegre
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SEQÜÊNCIA 1 - O PÚBLICO
	Um móbile feito com pedaços de espelho. Os espelhos estão
	suspensos em 45 graus (em relação ao chão). No chão, fora de
	quadro, nove monitores de vídeo, virados para cima. Nos
	monitores, imagens de rostos, olhos, bocas. A câmara enquadra
	apenas o móbile de espelhos, com fundo negro, refletindo
	fragmentos das imagens do vídeo. Trilha sonora. Ouvem-se pedaços,
	quase incompreensíveis, de conversas.
	               LOCUÇÃO
	               Eu não sei quem você é. Eu não posso saber quem
	               você é. Eu nunca saberei quem você é. Você está em
	               casa, vendo TV. Ou você está numa sala de cinema.
	               O seu anonimato é a sua segurança. Não se
	               preocupe. Esta não é a sua vida.
Letras brancas sobre fundo preto com o título do filme:
ESTA NÃO É A SUA VIDA
SEQÜÊNCIA 2 - GENTE COMUM
	"Retratos" de pessoas comuns, trabalhando ou simplesmente olhando
	para a câmara. A cada pessoa corresponde uma frase da locução.
	               LOCUÇÃO
	               Este homem não come vidro.
	               Na última quarta-feira, esta mulher não deu a luz
	               a sêxtuplos.
Esta criança jamais sobrevoou o pólo norte.
Este menino tem cinco dedos em cada mão.
	               Este homem não utiliza esteróides anabolizantes e
	               leva mais que dez segundos para correr cem metros.
Estas cinco pessoas nasceram em dias diferentes.
Esta mulher tem 25 anos e ainda não é avó.
Este homem não é sósia do Dawid Bowie.
	               Esta senhora não matou a mãe e o pai a golpes de
	               machado.
SEQÜÊNCIA 3 - NÚMEROS
	Pessoas trabalhando ou olhando para a câmara. Devem ser imagens
	bonitas e extremamente dignas. Nada de miséria extrema ou de
	sorrisos e abanos para a câmara. Quando o texto fala em números,
	há inserts muito rápidos de estatísticas, detalhes quase
	incompreensíveis de números. Gráficos computadorizados, pessoas
	falando na TV. O ritmo da montagem é muito rápido, ao contrário
	da SEQÜÊNCIA 2.
	               LOCUÇÃO
	               Gente comum. Eles não têm nome, você sabe.
	               Sessenta e oito milhões de brasileiros vivem em...
	               No terceiro mundo, um quinto das crianças de até
	               um ano de idade... Trinta por cento da população
	               ganha menos de... Números. Gente comum. "Seus
	               ombros suportam o mundo".
OBSERVAÇÃO: Estas frases serão ditas assim mesmo, incompletas.
SEQÜÊNCIA 4 - SORTEIO
	Detalhe de um globo metálico, daqueles de sorteio. Uma bolinha
	cai, com o número 2. Forma o número 302.
	               LOCUÇÃO
	               Apartamento trezentos e dois.
	Detalhe de um dedo apertando o número trezentos e dois do
	interfone de um edifício. Espera. Aperta outra vez.
	               LOCUÇÃO
	               Ninguém em casa. Outra vez.
	Detalhe do globo. A bolinha cai e forma o número 447. Câmara se
	aproximando de uma casa. Mostra o número 447 na parede.
	               LOCUÇÃO
	               É uma casa.
Mão tocando a campainha. Homem abre a porta.
	               OFF
	               Bom dia!
	               HOMEM
	               (estranhando) Bom dia.
	               OFF
	               O seu nome alguma vez já saiu no jornal?
	               HOMEM
	               Como é?
	               OFF
	               É uma pesquisa, pra televisão. O seu nome já saiu
	               no jornal?
	               HOMEM
	               O meu nome? Já. Mais de uma vez, faz tempo.
	               (pausa) Eu era jóquei. Ganhei um monte de corrida.
	               (pausa) O senhor não lembra do Apolo Russo?
	               OFF
	               É o senhor?
	               HOMEM
	               Era um cavalo. Já morreu. Mas o meu nome saía
	               sempre.
Mão pega um envelope no meio de uma pilha.
	               LOCUÇÃO
	               Outra vez.
	Detalhe da mão abrindo o envelope. Aparece um nome de rua.
	Detalhe de um mapa onde aparece o nome da rua. Placa do nome da
	rua.
	               LOCUÇÃO
	               Rua ................  Começa no número ..... e
	               termina no número ..... .
	Globo metálico. Agora aparece o sorteio inteiro, formando um
	número. Se for uma casa, detalhe do número da casa e locução
	dizendo "É uma casa". Se for um edifício, locução dizendo "tem
	.... apartamentos". Novo sorteio.
Câmera na porta. Mão toca a campainha. Alguém abre a porta.
	               OFF
	               Bom dia. O seu nome já saiu no jornal?
	               ALGUÉM
	               ......
	               OFF
	               É uma pesquisa, pra televisão. O seu nome já saiu
	               no jornal?
	               ALGUÉM
	               Não.
	               OFF
	               Nem uma vez? O senhor (a senhora) tem certeza?
	               ALGUÉM
	               ....
	               OFF
	               O senhor já apareceu na televisão ou já deu alguma
	               entrevista no rádio?
	               ALGUÉM
	               Não.
	               OFF
	               Nós queremos fazer um filme sobre a sua vida.
	               ALGUÉM
	               ......
SEQÜÊNCIA 5 - ENTREVISTA
	Interior da casa de ALGUÉM. Começa a entrevista. Vamos descobrir
	o que esta pessoa sente, o que ela pensa, quais os seus sonhos, o
	que ela esperava na infância, o que ela pretende fazer no futuro,
	como e onde ela começou a namorar. Vamos ouvir a opinião de
	amigos e filhos. Enfim, vamos traçar, em alguns minutos, a sua
	história de vida.
	O entrevistador nunca aparece, todas as perguntas são OFF. Sempre
	que possível, reforçar os depoimentos com imagens. Documentos,
	fotos, detalhes da casa. A maior parte da entrevista será rodada
	em vídeo. Todo o resto, tudo que for possível, será feito em
	filme, 35 mm. A entrevista deve tentar formar uma imagem completa
	desta pessoa.
Algumas perguntas possíveis:
	- Nome (completo). Resposta em filme.
	- Idade
	- Estado civil.
	- Filhos
	- Ocupação
	- Local de nascimento
	- Pai e mãe.
	- Ocupação do pai e da mãe.
	- Descrição do pai e da mãe.
	- Irmãos.
	- Onde passou a infância. (Rua, bairro ou cidade. Nós vamos com
	ela neste lugar).
	- Colégio onde estudou.
	- O que gostaria de ter sido.
	- Locais onde trabalhou.
	- Locais onde brincava / passeava / namorava.
	- Onde e como conheceu o marido/esposa/namorado(a).
	A partir daí, o roteiro é uma incógnita. A SEQÜÊNCIA 5
	(entrevista) pode ser dividida em várias outras, dependendo do
	que acontecer.
	Pode ter trilha (em alguns momentos) e locução. Sempre que for
	mencionada alguma data, podemos fazer uma referência, com
	table-top de jornais ou material de arquivo, a acontecimentos
	daquela data. Sempre que o entrevistado fizer referência a alguma
	coisa que aconteceu "por acaso" ("eu conheci uma pessoa..." ou
	"eu resolvi viajar para..." ou "minha mãe morreu...") podemos
	usar, de novo, uma imagem de sorteio: o globo de bolinhas, o
	papagaio, aquelas roletas de programas de auditório, dados,
	aqueles ratinhos que escolhem uma casinha em quermeses,
	"pescaria".
SEQÜÊNCIA 6 - RETORNO AO ANONIMATO
	Esta seqüência deve recolocar nosso entrevistado no anonimato, na
	multidão. Pode ser uma edição de cenas da entrevista intercalada
	com o sorteio na ordem inversa, terminando com o mapa da cidade e
	planos de multidão.
SEQÜÊNCIA 7 - FINAL
	Igual à SEQÜÊNCIA 1. Móbile de espelhos refletindo imagens de
	vídeo. Agora, estas imagens são do nosso entrevistado. A locução
	final pode começar na SEQÜÊNCIA 6, se ela não tiver fragmentos do
	áudio da entrevista. Trilha. A locução final põe nosso
	entrevistado nas estatísticas, sempre citando seu nome,
	incluindo-o entre milhares de outros. Ele volta a ser um número.
	Mas permanece a idéia de que cada um daqueles números tem uma
	história única de vida.
	OBSERVAÇÃO: As frases da locução final serão completadas após
	conhecermos melhor o protagonista do filme.
LOCUÇÃO
	               (ALGUÉM) é um dos 68 milhões de brasileiros que
	               ..... / (ALGUÉM) vive com ..... / (ALGUÉM) acha
	               que ..... / (ALGUÉM) faz parte dos setenta e cinco
	               por cento da população do planeta que ..... / Você
	               sabe, gente comum. / Não se preocupe. / Esta não é
	               a sua vida.
ESTA NÃO É A SUA VIDA
Créditos finais.
FIM
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	(c) Jorge Furtado, 1990-1991
	Casa de Cinema de Porto Alegre
	http://www.casacinepoa.com.br
	01/10/1990
| Anexo | Tamanho | 
|---|---|
| estanao1.txt | 8.75 KB |