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RUMMIKUB
	               Texto final 03/08/2007
	               Jorge Furtado
produção: Casa de Cinema de Porto Alegre
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E-rrê!
Olá!!!
Que saudade!
Nossa! Quanto tempo?
Ao vivo assim... oito anos!
Tudo isso... Que horror...
Essa é a Tereza.
Santa Tereza, para te agüentar...
Mas o que é isso? Quem é essa mulher?
Oi.
	Olha isso! A última vez que eu te vi tu não tinha os dois dentes
	da frente!
Que exagero! Ela tinha 11 anos.
E quando é que troca os dentes?
Com 4, 5... E o guri?
Dormindo... Ele chegou faz pouco. E essas luvas?
Ayrton Senna!
Tu tá mais para Fittipaldi.
Se eu sou o Fittipaldi tu é quem? O Fangio?
Eu sou só um ano mais velho que tu.
Um ano e 10 meses, quase dois.
(para a Mulher) Essa bola era tua!
Minha? Do jeito que você jogou?
Acho melhor subir um pouco a picanha.
Também acho.
	O problema é que cortou um pouco fininha... Pode secar. E aí fica
	dura.
Picanha dura é horrível.
	Vem cá, a salada de vocês já está pronta? Ou vocês vão botar um
	pé de alface na mesa e chamar de salada? Eu aqui, fazendo tudo...
	Tudo? E quem espetou os coraçõezinhos? Hein? Sessenta corações
	sangrentos de sessenta galinhas mortas... Quem?
Olha que honra! Foi sentir o cheiro da picanha...
	Meu Deus... Menino!! Como você está lindo... Você é a cara da sua
	mãe! Isso é que eu chamo de sorte!
Oi.
Oi. Tudo bom?
Tudo.
Dá tempo de uma partidinha?
Claro...
Querem jogar?
Não.
Depois.
E aí?
Tudo certo. Não foi à praia?
Não. Não gosto muito.
Tava ótima.
Você foi para Ferrugem?
Fui.
Onde?
Um bar.
Bom?
Não. Ruim.
O que é isso?
Estragão.
Estragão?
Um tempero. Experimenta.
Hmm.
Eu estou fazendo um peixe. Não como carne.
Que peixe é?
Garoupa.
	MÃE GAÚCHA
	Tu não me deixa torrar esta picanha!
	Com o tempo que vocês levam para jogar eu faço churrasco e ainda
	molho a grama.
Por isso que você perde.
Para quem?
Não esquece que eu tenho o caderninho. E eu trouxe o caderninho.
Hoje tem a Mangueira. Uma da manhã.
	Mangueira... Mangueira... Gaúcho torce pela Mangueira se achando
	carioca. Carioca mesmo é Vila Isabel, Imperatriz ou, no máximo,
	Portela. Mangueira é coisa de turista!
	Vai falar mal da Mangueira? Vai? E o Cartola? Jamelão? São
	turistas? Tu nem carioca é, só nasceu lá, está em São Paulo faz
	trinta anos. Tu é a paulista mais paulista que eu conheço.
Considero isso um elogio.
Não foi minha intenção.
	O que gaúcho entende de samba? O negócio de vocês é rancheira,
	vocês dançam de bota e calça de lã.
Ah é? E o Lupicínio? Hein? "Há pessoas com nervos de aço..."
Eu, por exemplo, pra jogar contigo.
Deu ou não deu?
Só um pouquinho...
	Só um pouquinho? Faz dez minutos que tu tá mexendo nestas pedras
	e este oito preto continua solto na mesa. Não tem o que fazer com
	este oito preto, desiste!
Calma aí... Eu posso bater.
	Eu também poderia bater, se tivesse o que fazer com este oito
	preto e o coringa solto! Não tem!
Calma!
Você vai à praia amanhã?
Se tiver tempo bom...
Que horas?
Eu acordo cedo.
Cedo é quando?
Sete, sete e pouco.
Muito cedo. Bom... Boa noite.
Boa noite.
(para todos) Boa noite.
	Boa noite. (para a Mãe Paulista) Desculpe, mas aí não tem 40
	pontos.
Tem 42. 15 do jogo de 5, o 2 que eu botei ali e 25 do coringa.
O coringa vale 20.
Rá! Quer apostar?
Quero. O coringa vale 20.
Vamos ligar para o Valdir.
Que Valdir?
O Valdir, do Clube do Comércio.
	Alô Valdir? Sou eu. Desculpe eu ligar esta hora, mas quanto é que
	vale o coringa? (...) Ah, desculpe, não, eu quero falar com o teu
	pai. Você tem a voz igual... (...) Ah, é? Nossa... Não sabia
	não... (...) Nossa... (...) Bom, desculpe então... (...) Diz para
	ele que eu mandei um abraço, que eu estou torcendo por ele...
	(...) Tá bom... (...) Boa noite.
O que foi?
Está no hospital, se recuperando de uma cirurgia.
Que droga... E o coringa?
Não perguntei, imagina.
E agora?
O coringa vale 25.
Vinte.
Quer apostar?
Apostar o quê, pra eu ter que te emprestar para me pagar?
Te dou um cheque.
Tem fundo?
	Eu vou lhe dizer uma coisa que eu quero dizer há muito tempo.
	Você é um idiota!
Sou idiota mas pago minhas contas!
(saindo) Idiota!
O coringa vale 20!
Bom dia. Ou boa noite?
Boa noite. Eles continuam brigados?
Acho que sim.
Por que eles brigaram?
Por causa de um oito preto.
Parece sério. (...) Você gosta muito de samba, não é?
Quem não gosta de samba...
Eu sei. Ruim da cabeça.
Não necessariamente. Pode ser doente do pé.
Pois é.
O que você estava desenhando?
Cogumelos.
Deixa eu ver?
São bonitos. E comestíveis.
Ou venenosos. Ou alucinógenos.
Estes são venenosos?
Não.
Eu sei fazer um molho de cogumelos com estragão.
Mesmo?
Sei.
Lê isso.
	A terra, mãe da natureza, é também seu túmulo. A mesma terra que
	lhe serve de sepultura é útero. E, saídos deste útero, filhos de
	todo tipo encontramos, sugando o seu seio natural. Muitos deles
	excelentes, dadas as suas muitas virtudes. Alguns deles sem
	virtude alguma, e, assim mesmo, todos diferentes.
	Oh, enorme é a poderosa graça que têm as ervas, plantas e pedras,
	com suas reais qualidades, pois nada vive na terra que seja tão
	vil que não tenha um bem especial para lhe doar. E nada é tão bom
	que não possa ser mal-empregado e, contrário à sua própria
	origem, chegar as raias do abuso. Mal-aplicada, a virtude
	transforma-se em vício, e o vício, pela ação, pode por vezes ser
	dignificado.
	Dentro da corola ainda criança desta florzinha mínima o veneno
	encontrou abrigo, e a medicina encontrou poder. Ao ser cheirada
	esta partezinha traz euforia a cada parte do corpo; ao ser
	provada, mata todos os sentidos e ainda o coração. Acampam-se, de
	sentinela, a graça e a desgraça, dentro do homem e das plantas,
	defendendo reis tão rivais.
É certo que eles não são venenosos?
Praticamente certo.
Praticamente certo?
É. Praticamente certo.
Faltam talheres.
E pratos.
E copos.
A gente vai buscar.
O que foi?
Os pratos.
É verdade. Os pratos.
A gente só chama de idiota quem não é idiota.
	Eu sei... Eu também acho que você é um idiota. Mas eu te adoro.
	(para a Mulher do Pai Gaúcho) Eu adoro o teu marido.
Eu sei.
E aquele dinheiro... eu vou te pagar.
Eu também te adoro. Não precisa pagar nada.
Eu faço questão. Te considero muito.
Tu é minha irmã. (para a Mulher) Ela é minha irmã.
Você também. E sabe do que mais?
O quê?
Vamos ao jogo.
Ao jogo.
Não, eu vou dormir, boa noite.
Bom dia ou boa noite?
Bom dia.
Estava desenhando?
Escrevendo.
O quê?
A letra de um samba.
	Vela leva a seta tesa
	Rema na maré
	Rima mira a terça certa
	E zera a reza
	Zera a reza, meu amor
	Canta o pagode do nosso viver
	Que a gente pode entre dor e prazer
	Pagar pra ver o que pode
	E o que não pode ser
	A pureza desse amor
	Espalha espelhos pelo carnaval
	E cada cara e corpo é desigual
	Sabe o que é bom e o que é mau
	Chão é céu
	E é seu e meu
	E eu sou quem não morre nunca
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	(c) Jorge Furtado, 2007
	Casa de Cinema de Porto Alegre
	http://www.casacinepoa.com.br
03/08/2007
| Anexo | Tamanho | 
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| rummikub2.txt | 6.88 KB |