Dando ritmo e fluência

Giba: O material chega na mão do montador  repetido, fora da ordem e com tempo sobrando dos dois lados. Então eu começo a assistir para ver qual é a melhor de todas aquelas repetições. Normalmente, o material vem com indicações da diretora, sinalizando os problemas que aconteceram em uma tomada, as opções de mudanças de plano etc. É o que a diretora acha, em princípio, que seria o ideal. Enquanto assisto, vou marcando as melhores tomadas. Quando chega a hora de montar, já tenho a escolha mais ou menos definida. O trabalho de ordenação, hoje em dia, é feito pelo computador quase que automaticamente. Na época da moviola, tínhamos que cortar os pedaços, colar na parede e depois ir colando de acordo com os números que havíamos marcado (risos).

É, principalmente, um processo de junção, de estabelecer o ritmo, a fluência de um plano para outro ou de uma cena para outra. É isso que consome mais tempo no processo de montagem. Às vezes, a tomada que achamos melhor não vai juntar bem com a próxima e nem com a anterior. Às vezes, temos que voltar atrás nesse processo de escolha por causa disso. O processo de montagem é escolha, síntese e determinação de ritmo e fluência.

Ana
: Três momentos definem o filme que vamos fazer. Primeiro, o roteiro, que é quando definimos no papel que história vai ser essa. O segundo momento é a filmagem, que é quando a gente tem que abrir mão de muita coisa ou adaptar tantas outras de acordo com as possibilidades de produção. Mas sempre surgem boas surpresas e aquilo que era um monte de letrinhas vai criando vida e o roteiro vai se transformando em imagem. A montagem é o terceiro momento, quando “embaralhamos” tudo o que foi filmado e repensamos o filme mais uma vez. O Giba tem uma participação fundamental neste processo. Ele tem o olhar de autor.

Giba
: Independente da relação pessoal entre montador e diretor, o montador tem sempre alguma autonomia para oferecer opções, mas a palavra final é sempre do diretor. Há momentos em que as opiniões dos dois divergem. O montador pode insistir, mas não adianta porque a palavra final é do diretor e tem que ser assim, porque ele tem a concepção do filme desde o início.

Uma das dificuldades da montagem é que tínhamos muitos detalhes de finalização. Isso acaba prolongando o processo. Uma coisa depende da outra. Durante a filmagem, quando o menino joga videogame, ele está na verdade interagindo com uma tela vazia e atua de um jeito. Na montagem, eu imagino uma coisa que está ali, ponho uma figurinha qualquer, e monto com o tempo que eu acho que aquilo tem. Aí, a Ana contrata o pessoal da Cápsula e da Makako, que são as duas produtoras que fizeram o trabalho de finalização, e eles nos dão uma solução que é ótima, mas que está com o tempo um pouquinho maior ou um pouquinho menor do que aquele que eu tinha feito. E aí eu tenho que refazer a montagem. É um processo de idas e vindas sempre.

O primeiro corte ficou muito grande, com mais de duas horas. Diminuímos bastante as cenas que se passavam na administração da escola. A ida para Porto Alegre era muito maior e cortamos bastante. Ficou em dois pequenos planos. Tínhamos vários flashbacks e cenas do pai, cortamos cerca de 20 minutos do primeiro corte para o corte final. O primeiro corte do filme é fazer da melhor maneira possível a junção de tudo que foi filmado, mesmo sabendo que algumas coisas provavelmente vão ser tiradas mais adiante. É o único jeito de conseguir ver tudo que foi filmado. Para ter uma ideia, foram 530 horas de montagem, em 108 dias de trabalho.