Ana Luiza Azevedo (Diretora): Um filme parte sempre de uma ideia. Às vezes, ideias originais baseadas em histórias reais ou que estão na cabeça do realizador ou produtor, mas pode também partir de uma imagem ou de uma adaptação de obra literária. O Murilo Salles diz que as ideias dos filmes dele sempre partem de uma imagem. Enfim, Antes que o mundo acabe é uma história adaptada de uma novela do Marcelo Carneiro da Cunha.
Giba Assis Brasil (Montador): Eu tinha o hábito de ler com meus filhos na cama. Pelo menos 5 dias por semana lia com eles. Um dos livros que li foi o Antes que o mundo acabe, do Marcelo. Lembro que, enquanto lia o livro, meus filhos se interessaram tanto que pensei – esta história dá um filme infanto-juvenil muito legal.
Ana: Duas questões te desafiam na hora de fazer um filme: que história contar e como contar. A história do Antes que o mundo acabe tinha elementos suficientemente desafiadores. Para começar, é um livro epistolar. E cartas não são nada cinematográficas. Como transformar cartas em audiovisual? Esse desafio me instigava. Ao mesmo tempo, o personagem faz seu rito de passagem através do olhar, das fotos, e isso é uma coisa super sedutora. O cinema levou muitas pessoas a fazer seu rito de passagem. Mas a foto também não é cinema! Foto é uma imagem parada. A passagem da imagem parada para a imagem em movimento também era outra brincadeira que me agradava. E é o princípio do cinema. O filme está cheio dessas brincadeiras.
Giba: O que nos interessou desde o início na história foi construir um personagem como esse menino, que está num momento de passagem e de descoberta da vida e do mundo. A relação dele com os amigos, com a namorada e com o pai que ele nunca conheceu. Esse pai fotógrafo, ligado à diversidade do mundo e das pessoas, à maneira como vivem, se vestem, lidam com a música e com o dia a dia e o seu relacionamento familiar também nos atraiu muito. E o livro insiste muito nisso. Estamos nos tornando cada vez mais iguais. A diversidade está virando coisa de almanaque, deixando de ser real, concreta. Foi a partir daí que começamos a pensar em como poderia ser o Antes que o mundo acabe em outros sentidos. Nunca levamos no sentido da catástrofe, essa história de 2012. O mundo acaba quando tu rompes um relacionamento e a tua namorada não quer mais saber de ti, quando tu fazes tudo certo e tem alguém te acusando de ladrão, quando tu tens toda uma estrutura familiar e descobres um pai que não sabias que existia, quando passas uma vida inteira dentro de um colégio e aí termina aquele período e tens que encarar o mundo lá fora, sair da tua cidade sem saber o que vais encontrar. Tentamos juntar esses mundos todos que estão se acabando.
Jorge Furtado (Roteirista): Há diferenças entre roubar uma bala do supermercado, um computador da escola, dinheiro de uma bolsa ou ações da bolsa? Se o seu amigo não diz a verdade, ou mente, ou comete um crime, pode continuar sendo seu amigo? Se a garota que você ama não lhe ama, a vida continua? Se o seu pai não está bem certo se foi, é ou será bom ser seu pai, você ainda assim pode amá-lo?
Acho que uma boa história deve fazer perguntas, e Antes que o mundo acabe é uma boa história, que começou no livro do Marcelo e passou pelas mãos dos roteiristas a caminho do filme. Acredito, como o escritor Kurt Vonnegut, que uma história é uma máquina, que pode ser ajustada, melhorada, turbinada, mas seu combustível são as paixões humanas, nossos desejos e medos ancestrais. Sem eles a história não anda.