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Reeleger ou não reeleger?

Recebi esta semana, como muitos devem ter recebido, e-mail da campanha "NÃO REELEJA NINGUÉM", segundo seus divulgadores "o único jeito democrático de moralizar e dar dignidade ao Congresso Brasileiro."

Achei a ideia péssima. Se fosse levada a sério, seria um salvo-conduto perfeito pros canalhas: "já que eu não vou me reeleger mesmo, tenho quatro anos pra fazer qualquer coisa." Não sendo levada a sério, o que é a única hipótese possível, é apenas mais uma variação do "todo político é corrupto", uma afirmação tão inconsequente como "todo advogado é ladrão" ou "todo médico é viciado em barbitúricos" ou "todo cineasta mama nas tetas do governo". Enfim, uma bobagem, que pode até ter alguma comprovação estatística parcial (qualquer afirmação tem), e pode mesmo render algumas boas piadas, mas não é o caso. Essa proposta do "não reeleja ninguém" não tem nem a virtude de ser engraçada.

Mesmo assim, a roda da bobagem se move. Já tem 12.600 referências no Google - quase todas, claro, achando a proposta genial. Alguns querendo ir mais longe, como sempre: se há deputados corruptos, o jeito é fechar o Congresso. Como o corno que flagrou a mulher e vendeu a cama.

O próprio texto original da campanha se autodefine como "radical": "É uma idéia radical. Será que é capaz de dar um sustinho nos caras-de-pau que habitam o oceano de carpetes, mamatas e ar-condicionado do Congresso Nacional?" Aliás, boa parte dos comentários na blogosfera vão por este lado: "Um tanto quanto radical, mas dá muita vontade de fazer." "Uma decisão radical, que não deixe dúvidas quanto à nossa força, a força do povo e do seu voto."

Ora, radical! Me lembra a definição do velho Karl: "Ser radical é ir à raiz, e a raiz é o homem." Muita gente parece não perceber a diferença entre ser radical e ser sectário. Agora, um pouco mais simplificada, a confusão é entre radicalidade e falta de noção.

Mas há exceções, felizmente. Como o jornalista Marcelo Soares, que em seu blog "E você com isso?" escreveu, com propriedade:

Beleza, você não reelege ninguém. Ótimo. Mas aí, pra poupar tempo de se informar, você vota no primeiro que aparece, esquece em quem votou e deixa o cara lá durante quatro anos fazendo o que bem entende, sem você ficar de olho. A merda será exatamente a mesma, só mudarão as moscas.

Ou o professor de literatura Idelber Avelar, que faz uma proposta alternativa e muito mais consequente:

Que tal, indignados, lançar a campanha "Não reeleja nenhum membro da bancada ruralista"? Que tal "Não reeleja donos de concessões de rádio e televisão"? Que tal (...) uma campanha "Não reeleja membros da bancada evangélica", esse grupo em guerra permanente contra a saúde das mulheres? Ah, isso dá muito trabalho, né? Tem que pesquisar, ir atrás, essas coisas. É mais fácil vociferar contra tudo o que está aí.

Já eu prefiro a campanha pela extinção do Senado - aliás, defendida com a necessária seriedade pelo Raul Pont quando foi candidato ao mesmo em 1994 (não sei se hoje ele manteria a proposta). Não porque "todo senador é safado" (outra meia-verdade estatística), mas porque o Senado no Brasil não faz sentido, é uma mistura das piores características da Câmara dos Lordes inglesa com a representação federativa estadunidense, num país que (felizmente) não tem lordes e (circunstancialmente) não resultou de uma união de estados independentes.
 

"Não reeleja ninguém" significa "meu deputado me decepcionou"? Ou "não lembro em quem eu votei?" Qual é o teu caso?
 
TEM MAIS
 
O Deputado Federal Ariosto Holanda (PSB/CE) propôs ano passado a extinção do Senado.

Na Zero Hora de 26/04/2009, o ex-coordenador do Fórum Social Mundial Jeferson Miola defendeu uma série de medidas para a reforma política, inclusive a extinção do Senado.
 
Já o cientista político David Fleischer tem argumentos interessantes pela manutenção do Senado.

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