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A que ponto chegamos

Imagine que um dos grandes jornais americanos (ou ingleses, franceses, alemães, pode escolher) publicasse a informação de que o presidente da república confessou ter tentado estuprar um menino. Imagine as precauções do jornal antes de publicar tal informação, imagine o destaque que esta informação teria na edição do jornal, a repercussão na sociedade, o destaque que seria dado a esta informação pelos outros grandes veículos da imprensa. 
 
Imaginou? Pois agora desimagine, estamos no Brasil da imprensa suicida. 
 
A Folha de S. Paulo publicou na sua edição de sexta-feira, 27/11/09, a informação de que o presidente Lula confessou ter tentado estuprar um “menino” quando esteve preso. Tal informação aparece escondida no meio de uma suposta análise de um filme feita por um obscuro “editor da Editora Contraponto e colunista da Folha“. Não há chamadas na capa do jornal, nem mesmo na página onde está a notícia, alertando para o fato de que o presidente da república, hoje aprovado por cerca de 80% da população brasileira, é um maníaco estuprador. 
 
Todos os presentes na cela onde o suposto crime de tentativa de estupro teria ocorrido negam o fato, incluindo o ex-menino. Todos os presentes na reunião onde o presidente teria confessado o seu crime dizem que se tratava de uma piada. E mais: nenhum dos presentes na reunião lembra da presença do tal “editor da editora” na sala, única fonte da notícia. Não há, portanto, nenhuma base para a acusação de crime gravíssimo que o jornal Folha de S. Paulo faz ao presidente da república.
 
Lula ocupa o centro da vida política brasileira há pelo menos 25 anos, sua vida foi virada e desvirada pelo avesso muitas vezes. Esta tentativa de estupro, que teria ocorrido numa pequena cela com mais de uma dezena de presos e que teria sido contada pelo próprio Lula na presença de várias pessoas, veio a público, pela primeira vez, nesta sexta-feira, na Folha de São Paulo.
 
No dia em que informou ao país que o presidente Lula é um criminoso violento e pedófilo, o jornal Folha de S. Paulo preferiu destacar em sua capa os 50 anos do Asterix e as melhores receitas de sorvetes para o verão paulista. A Folha de S. Paulo, com seus 21 mil exemplares diários vendidos em banca, caminha para virar um jornal de bairro, escrevendo fofocas e grosserias nas letras miúdas das páginas internas, municiando marocas paulistas que ainda levam o jornal a sério.
 
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Exclusivo! Colega de Serra revela que o governador paulista abusou de um papagaio!
 
Um ex-colega de exílio do governador José Serra, que preferiu ficar anônimo, afirmou que o possível candidato a presidência confessou ter molestado um papagaio em sua adolescência.
 
“Serra contou que um dia, quando abriu a geladeira para pegar sorvete, não percebeu que o papagaio voou para dentro do congelador. Serra fechou a porta e deixou o papagaio lá dentro. Ao abrir a geladeira, minutos depois, viu o papagaio congelado. Na tentativa de salvá-lo, José Serra colocou o papagaio no micro-ondas e o bicho ardeu em chamas! Para apagar o fogo, Serra botou o louro embaixo da torneira aberta. O papagaio despertou e disse: “Mas que tempo louco!” Fiquei chocado com tamanha crueldade!”
 
Não perca na edição de amanhã:
 
Marina Silva protesta contra elefante que abusa de formiguinha!
 
Aécio dá a português uma mochila no lugar do paraquedas!
 
Ciro joga Joãozinho amarrado no lago!
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LEITURAS DA FOLHA
Lixo em estado puro
 
Por Alberto Dines em 30/11/2009
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=565IMQ012
 
Vamos criar uma igreja e deixar de pagar impostos? A manchete da Folha de S.Paulo de domingo (29/11) foi a mais comentada dos últimos tempos. Nem parecia ser o mesmo jornal que dias antes, na sexta-feira, produziu um lixo jornalístico dos mais repugnantes e que desde então está ocupando a seção de cartas dos leitores quase inteira.
 
A propósito da estréia do filme Lula, o filho do Brasil, a Folha publicou um depoimento do seu colunista Cesar Benjamin, dissidente do PT, a propósito de um comentário cabeludo feito há 15 anos pelo então candidato à presidência Lula da Silva (FSP, 27/11, pág. A-8).
 
Como foi constatado no dia seguinte, o comentário foi efetivamente feito mas em tom de troça, conversa de fim de expediente. A Folha rasgou e tripudiou sobre todos os seus manuais de redação, pisoteou 20 anos de trabalho dos seus ouvidores ao aceitar como verdadeira uma fofoca estapafúrdia sem qualquer diligência sobre a sua veracidade.
 
Não foi desatenção, erro involuntário, tropeço de um redator apressado: a Folha reservou uma página inteira para que o colunista contasse a sua saga nos cárceres da ditadura iniciada quando contava apenas 17 anos. Seu relato é impressionante, mas de repente, para desqualificar os 30 dias em que Lula passou no xadrez, Cesar Benjamin conta a sua anedota em três enormes parágrafos e com ela fecha o artigo.
 
Imprensa marrom
 
À primeira vista, parece mais um golpe publicitário da família Barreto (que produziu o filme), em seguida percebe-se que a denúncia é a vera, fruto de um ressentimento pessoal que um jornal do porte da Folha, que se assume "a serviço do Brasil", não tem o direito de perfilhar.
 
A direção da Folha simplesmente não avaliou o tamanho do desatino. No dia seguinte, tentou consertar: mancheteou uma de suas páginas com o justo desabafo de Lula classificando o texto como "loucura" (FSP, 28/11, pág. A-10). No domingo, certamente arrependida, a direção da Folha providenciou a evaporação do assunto. Ficou apenas a reprovação do seu ouvidor Carlos Eduardo Lins da Silva.
 
Tarde demais. Já no sábado (28/11) o Estado de S.Paulo repercutia o episódio com destaque e, no mesmo dia, a Veja já o incorporara à sua edição. O Globo manteve-se à distância desta porcaria.
 
Se o leitor não sabe o que significa "imprensa marrom", tem agora a oportunidade de confrontar-se com este exemplo – em estado puro – do jornalismo de escândalos e achaques.

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