Engraçado o Jorge ter perguntado justamente hoje "para que raios serve um soneto?". Eu também não sei, é claro, e talvez exatamente por isso esteja há alguns dias tentando compor um. Não consegui, mais uma vez - quase sempre que eu tento sonetear, termino me passando das canônicas 14 linhas. No caso, são 22 dodecassílabos, dois quartetos além do necessário. Ou os meus temas são muito pretensiosos, ou me falta a concisão do sonetista, ou mais provavelmente as duas coisas.
Em todo caso, se alguém se dispuser a remontar o meu sononononeto, deixando-o do tamanho clássico praticado por Shakespeare, Petrarca e Camões (sem falar no meu favorito Glauco Mattoso), eu agradeço. Cheguei a pensar em oferecer um prêmio simbólico para quem fizesse a melhor tentativa. Mas aí estaria de certa forma negando o meu tema, e principalmente fornecendo uma falsa resposta à pergunta do Jorge. Fiquem, portanto, à vontade.
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DO INTERTEXTO
Comete plágio quem copia por ganância
Dizendo que aquilo é seu, como um falsário
Foi sem querer? Então é plágio involuntário
Que alguns preferem chamar de ignorância
Parafrasear é copiar modificando
Somando à idéia ou frase de outro o teu estilo
O pós-moderno já incorpora tudo aquilo
Voluntoplagioparafrasampleando
Mas se eu digo "isso é de outro, na verdade"
Aí entramos na área da citação
Que algumas vezes é explícita, outras não
Nas várias formas da intertextualidade
Como a epígrafe, a paródia, a tradução
Ou o pastiche, a alusão, a referência
Que nos exigem mais leitura e paciência
Pra poder identificar onde é que estão
Lavoisier disse que toda a natureza
Se transformava, e na cultura com certeza
Só o que se cria é o intertexto universal
Ficam de fora os românticos, por certo
E eventualmente um que outro analfabeto
Que ainda acredita ou sonha ser original
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12h20. Hoje de manhã o Jorge me chamou atenção para alguns problemas de métrica: o verso 2 tem uma sílaba a menos; os versos 4 e o 16, embora dodecassílabos, têm acentos secundários na 3ª e na 8ª sílaba (quando deveriam ser na 4ª e na 8ª), e o verso 10 começa com uma série de vogais em hiato, de pronúncia complicada. Segue então uma segunda tentativa.
DO INTERTEXTO (versão 2)
Comete plágio quem copia por ganância
Fazendo seu o que não é, como um falsário
Foi sem querer? Então é plágio involuntário
Que em outros tempos se chamava ignorância.
Parafrasear é copiar modificando
Somando à idéia ou frase de outro o teu estilo
O pós-moderno já incorpora tudo aquilo
Voluntoplagioparafrasampleando.
Mas se eu digo "isso é de outro, na verdade"
Então entramos na área da citação
Que algumas vezes é explícita, outras não
Nas várias formas da intertextualidade
Como a epígrafe, a paródia, a tradução
Ou o pastiche, a alusão, a referência
Que nos exigem mais leitura e paciência
Para encontrar e entender com precisão.
Lavoisier disse que toda a natureza
Se transformava, e na cultura com certeza
Só o que se cria é o intertexto universal
Ficam de fora os românticos, por certo
E eventualmente um que outro analfabeto
Que ainda acredita ou sonha ser original.