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HOUVE UMA VEZ DOIS VERÕES
	               roteiro de Jorge Furtado
	               versão de 15 de Março de 2001
produção: Casa de Cinema de Porto Alegre
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CENA 1 - PRAIA - EXTERIOR/DIA
	Uma praia se perde no horizonte, quase vazia. O vento surge e
	some em linhas de areia branca, o céu é branco e o mar quase
	marrom. Muito ao longe, um HOMEM se aproxima. CHICO e JUCA, 16
	anos, estão sentados numa duna quase na beira da praia, olhando
	para o mar. Chico está de boné. Juca tem uma tala no pescoço.
	Chico dá uma olhada na direção do Homem que se aproxima: quarenta
	anos, copo de cerveja na mão, relógio.
	               CHICO (OFF)
	               Esta é a maior praia do mundo, trezentos e
	               cinqüenta e três quilômetros, está no livro dos
	               recordes. Talvez seja também a pior praia do
	               mundo, principalmente em março. Em janeiro e
	               fevereiro pode até ser divertido, mas em março é
	               um saco. A gente tem que inventar coisas para
	               fazer todo tempo. Não é fácil.
	O homem se aproxima e, quando chega exatamente na frente dos
	dois, pisa num buraco. O Homem quase cai, derramando um pouco de
	cerveja.
	Chico e Juca ficam imóveis. O homem examina o buraco, tapado por
	jornais e areia, uma evidente armadilha.
	O homem, furioso, olha para os lados, olha para os dois, volta a
	olhar para os lados.
	Juca e Chico não movem um músculo do rosto. O homem olha
	fixamente para os dois. Uma lágrima escorre pelo rosto de Juca.
	               CHICO (OFF)
	               Quando eu estou louco para rir mas não posso,
	               penso em coisas muito tristes. Minha mãe
	               reclamando da casa. Meu pai tentando nos convencer
	               que esta é a melhor praia do mundo. Meu pai
	               fazendo contas para pagar nossas férias. Um filho
	               que eu posso ter um dia me olhando fazer contas
	               para pagar as férias dele. Eu tentando convencer
	               um filho que eu posso ter um dia que esta é a
	               melhor praia do mundo. Quase sempre funciona.
	O homem recua, de olho fixo em Chico e Juca, pisa no buraco e cai
	para trás. O homem se estatela na areia, derrama toda a cerveja
	na própria cara.
Juca dá uma gargalhada.
	               CHICO (OFF)
	               Quase sempre.
	Os dois se levantam e saem correndo, rindo. O homem grita, tenta
	se levantar. Juca e Chico correm pelas dunas.
Créditos Iniciais.
CENA 2 - PLAYLAND - INTERIOR/NOITE
	Um flíper (uma casa de diversões eletrônicas). Chico e Juca estão
	jogando fla-flu (pebolim). Duas meninas entram. Juca olha para as
	duas. Uma é MORENA, cabelo curto e nariz fino. A outra é RUIVA,
	sardas, olhos claros. Pedem duas cocas. Juca olha para Chico.
	Juca pega a bolinha do fla-flu e, disfarçando, joga na direção
	delas. Vai atrás.
	               JUCA
	               Com licença?
	Juca se abaixa e pega a bolinha junto aos pés das duas. As
	meninas ficam olhando para ele, de tala no pescoço.
	               JUCA
	               Obrigado.
	               MORENA
	               O que aconteceu?
	               JUCA
	               A bolinha caiu.
	               MORENA
	               No pescoço.
	               JUCA
	               Ah. Desloquei a terceira vértebra cervical. Eu
	               estava pegando onda, fui dar um drop, meu parceiro
	               estava no tubo, pranchou. Mas tudo bem, já estou
	               pronto para outra. Vocês estão aqui?
	               MORENA
	               Estamos, né?
	               JUCA
	               Quero dizer, estão passando o verão aqui?
	               MORENA
	               Não. Meu namorado está botando gasolina, estamos
	               indo para o Rosa. Sabe a praia do Rosa? Fica em
	               Santa Catarina depois do...
	               JUCA
	               Então tchau.
	Ele se vira, dá as costas, deixa ela falando sozinha. Volta para
	o jogo.
	               CHICO
	               E aí?
	               JUCA
	               Namorado de carro, não dá para meter. Ainda mais
	               com cachumba.
	               CHICO
	               Tu disse que estava com cachumba?
	               JUCA
	               Claro que não. Eu estou na fase de maior contágio.
	               Se eu cuspir em ti tu tá frito.
	               CHICO
	               Eu já tive cachumba. Todo mundo já teve cachumba.
	O centroavante segura a bola, toca sutilmente de lado para o
	ponteiro esquerdo que, numa roleta precisa, acerta o canto
	direito do gol, sem chances para o arqueiro. Gol de Chico.
	Termina o jogo.
	               CHICO
	               Cinco a três. (vão saindo) Vamos pro outro?
	               JUCA
	               Não, vou dormir. O médico disse que a cachumba
	               pode descer pro saco, já pensou? Eu de sunga, na
	               praia, caminhando de perna aberta.
	               CHICO
	               Não, não pensei.
Os namorados das meninas entram.
	               MENINA
	               (para Juca) Esse é o meu namorado.
	Juca fica olhando para o cara algum tempo. Sorri, abraça o
	sujeito, fica abraçado nele.
	               JUCA
	               Aí, brother. Tudo certo? Firmeza. (tosse sobre o
	               cara, tosse, tosse) É isso aí. Boas ondas.
Vão saindo. Juca pára.
	               JUCA
	               (para o cara) Tu já teve cachumba?
	O cara faz que não. Juca sorri e sai. O cara fica se apalpando no
	pescoço, preocupado.
CENA 3 - PLAYWORLD - INTERIOR/NOITE
	Chico entra em outro flíper, este com mais brinquedos eletrônicos
	e menos jogos de mesa. Chico compra duas fichas. Vai para um
	brinquedo de tiro ao pato.
	               CHICO (OFF)
	               Meu recorde nos patos é setenta e dois. Meu vice-
	               recorde é cinqüenta e quatro. Quase sempre eu faço
	               entre quarenta e cinco e cinqüenta, cinqüenta e
	               dois. O dia dos setenta e dois patos foi um
	               acontecimento, eu estava em estado de graça,
	               atirava nos patos antes deles aparecerem. Eu
	               estava integrado em alguma força cósmica, sabia
	               que o pato ia subir, o anjo da guarda do flíper
	               estava pousado no meu ombro e dizia: lá vem um
	               pato. No dia em que eu conheci a Roza o anjo da
	               guarda do flíper não estava me dizendo nada sobre
	               os patos. Sorte dos patos e também sorte minha. No
	               game-over a luz da máquina se apagou e ela
	               apareceu no reflexo.
	Chico vê o reflexo de Roza na máquina. Vira-se. (Cena em câmera
	lenta.)
	ROZA, 18 anos, vestido de alcinha e cabelo preso, tenta colocar
	uma ficha no pimbal. Chico fica admirando a beleza da moça, só
	comparável a sua inaptidão para lidar com a máquina. Roza põe a
	ficha no lugar errado, não entra. Põe a ficha no lugar certo mas
	aperta o botão errado e a máquina devolve a ficha.
Chico se aproxima.
	               CHICO
	               É no outro buraco.
	               ROZA
	               Já tentei, não deu.
	               CHICO
	               Tu apertou no botão errado. Põe de novo.
Ela põe a ficha no buraco certo.
	               CHICO
	               Agora aperte o botão "play".
	               ROZA
	               Qual é?
	               CHICO
	               O grande, com a luz vermelha, escrito "play".
Ela aperta e a máquina se acende.
	               ROZA
	               Deu! Obrigado.
	Ela joga. Ele põe outra ficha na sua máquina e finge atirar nos
	patos. Uma CRIANÇA se aproxima e fica olhando Chico atirar. Chico
	nem olha para os patos, não tira os olhos de Roza.
	Ela é péssima, mal consegue botar a bola em jogo. Quando
	consegue, perde a bola sem tocar nela nenhuma vez. Joga outra
	bola e perde. Chico erra nos patos. Roza perde mais uma bola.
	Chico erra nos patos. Roza perde mais uma bola, e mais uma.
	As duas máquinas informam game-over quase ao mesmo tempo. A
	criança olha para Chico.
	               CRIANÇA
	               Tu é horrível.
	Chico sorri. Vai comprar mais fichas, encontra-se com Roza no
	caixa.
	               ROZA
	               Vou eu botar mais dinheiro fora.
	               CHICO
	               Quer churros?
	               ROZA
	               O quê?
	               CHICO
	               Tu... quer comer um churros? Eu pago.
	               ROZA
	               Já comprei uma ficha.
	               CHICO
	               Depois a gente volta.
Roza observa Chico alguns segundos.
	               ROZA
	               Tudo bem.
CENA 4 - PRAÇA - EXTERIOR/NOITE
Chico e Roza observam o vendedor de churros preparando a massa.
	               CHICO
	               Meu nome é Chico. Francisco.
	               ROZA
	               O meu é Roza. Roza com z.
	               CHICO
	               Por que com z?
	               ROZA
	               O cara do cartório era meio analfabeto. Só
	               descobri que era com z há três anos. Achei legal.
	               Rosa com "s" tem muitas. Com z, só eu.
	               CHICO
	               O meu Chico é com "x" e com "q".
	               ROZA
	               É?
	               CHICO
	               Mentira, é Chico mesmo. Tu quer doce de leite ou
	               creme?
	               ROZA
	               Doce de leite.
	               CHICO
	               Os dois com doce de leite.
	               ROZA
	               Eu nem sei porque existe churros com creme, nunca
	               vi ninguém pedir com creme, doce de leite é muito
	               melhor.
	               CHICO
	               É bom que exista o de creme. É mais legal comer
	               pensando "eu estou comendo o melhor" do que comer
	               pensando "eu estou comendo o único que tinha para
	               comer".
	               ROZA
	               Isso é.
	               CHICO
	               Sua casa é por aqui?
	               ROZA
	               Não. Lá perto não tem flíper. Vamos comer na
	               praia?
CENA 5 - PRAIA - EXTERIOR/NOITE
Chico e Roza caminham pela praia, comendo churros.
	               ROZA
	               Por que tu tira férias em março?
	               CHICO
	               É mais barato.
	               ROZA
	               Tá perdendo aula?
	               CHICO
	               Só uma semana. Na primeira semana nunca acontece
	               muita coisa. E tu?
	               ROZA
	               Eu gosto de praia em março. Tem menos gente.
	               CHICO
	               Tu vai à praia que horas?
	               ROZA
	               De tarde. Acordo para almoçar. Teve uns dias que
	               eu não fui, mas essa última semana eu vou
	               aproveitar. Em janeiro e fevereiro tu fica em
	               Porto Alegre?
	               CHICO
	               Fico. E tu?
	               
	               ROZA
	               As vezes eu viajo. Tu viu como as tatuíras brilham
	               com a lua? São fluorescentes.
	               CHICO
	               Fosforescentes.
	               ROZA
	               Qual a diferença?
	               CHICO
	               Fluorescentes é de flúor, fosforescentes é de
	               fósforo. As lâmpadas são fluorescentes, as
	               tatuíras são fosforescentes.
	               ROZA
	               Tu tá com doce de leite no queixo.
	Ela passa o dedo no queixo dele, tirando o doce de leite. Ele
	fica olhando para ela, recortada contra a lua cheia. Ela oferece
	o dedo para ele. Ele chupa o dedo dela.
	               CHICO
	               Tu tá cheia de açúcar.
Ela limpa o açúcar com a mão, ele segura o braço dela.
	Beijam-se, um beijo longo e silencioso, iluminado pela lua e
	pontilhado por tatuíras fosforescentes.
CENA 6 - CASINHA DO SALVA-VIDAS - EXTERIOR/NOITE
	Chico e Roza estão sentados na casinha do salva-vidas olhando
	para o mar.
	               ROZA
	               Tu vai fazer vestibular?
	               CHICO
	               Ano que vem.
	               ROZA
	               Para quê?
	               CHICO
	               Não sei ainda. Comunicação ou letras. Ou desenho
	               industrial. Se bem que eu gosto de computação
	               também.
	               ROZA
	               Eu fiz para arquitetura mas não passei. Este ano
	               nem me inscrevi. Quero viajar, tô guardando
	               dinheiro. Acho que vou para a Austrália.
	               CHICO
	               Por que para Austrália?
	               ROZA
	               Tenho uma amiga que foi para lá. Austrália é bom
	               que é bem longe. Tu fica lá, na Austrália, bem
	               longe, todo mundo pensando que tu deve estar muito
	               feliz.
	               CHICO
	               Tu fala inglês?
	               ROZA
	               More or less. E tu?
	               CHICO
	               Estou no cultural.
	               ROZA
	               Tu é virgem?
	               CHICO
	               Não. Quer dizer, mais ou menos.
	               ROZA
	               Como assim?
	               CHICO
	               Acho que sou.
	               ROZA
	               Acha?
	               CHICO
	               É que eu tive umas histórias, mas nada muito,
	               assim, profundo.
	               ROZA
	               Sei como é. Quer deixar de ser?
	               CHICO
	               Quero, claro.
Pausa. Roza fica olhando para Chico.
	               CHICO
	               Tu quer dizer, agora?
	               ROZA
	               Pode ser. Quer?
	               CHICO
	               Bom... acho que sim.
	               ROZA
	               Acha?
	               CHICO
	               Claro que sim.
Beijam-se. A lua reflete no mar, as tatuíras passeiam pela areia.
CENA 7 - CASINHA DO SALVA-VIDA - EXTERIOR/DIA
	Chico acorda, sol na cara suja de areia. Roza não está. Ele
	encontra a ficha do flíper. Olha para a praia, quase deserta.
Chico desce da casinha e vê as pegadas de Roza se afastando.
CENA 8 - PRAIA - EXTERIOR/DIA
Chico segue as pegadas.
	As pegadas de Roza se dirigem para a grama na beira da praia.
	Chico ainda consegue seguir um pouco as pegadas de areia na grama
	mas logo elas desaparecem, misturadas com outras.
CENA 9 - PRAÇA - EXTERIOR/DIA
Chico procura Roza pela praça vazia. Guarda a ficha de flíper.
CENA 10 - EDIFÍCIO QUEBRA-MAR - EXTERIOR/DIA
	Juca e Chico saem do apartamento e caminham pelos corredores do
	prédio. Juca carrega uma sacola com pão e leite.
	               JUCA
	               Tu comeu?
	               CHICO
	               Comi.
	               JUCA
	               Mentira.
	               CHICO
	               Juro.
	               JUCA
	               Jura por Deus?
	               CHICO
	               Juro.
	               JUCA
	               Pela alma da tua mãe?
	               CHICO
	               Juro.
	               JUCA
	               Pela bunda da Silmara?
	               CHICO
	               Juro.
	               JUCA
	               Não acredito.
	               CHICO
	               Comi. Juro. Na verdade, ela é que me comeu.
	               JUCA
	               Tá brincando? Que rabo! Será que ela dá para mim?
	               CHICO
	               Tá louco?
	               JUCA
	               O que que tem? Vocês tão namorando?
	               CHICO
	               Não. Não sei. Não falei com ela ainda.
	               JUCA
	               Mas tu tá a fim?
	               CHICO
	               Tô.
	               JUCA
	               Que rabo! Será que ela não tem uma amiga?
	               CHICO
	               Não sei.
	               JUCA
	               Deve ter. E a amiga deve dar também. Se uma dá, as
	               outras também dão.
	               CHICO
	               Por quê? Eu já transei e tu não.
	               JUCA
	               Transou ontem. Se tu tivesse transado há tempo eu
	               também já tinha. É melhor que punheta?
	               CHICO
	               É totalmente diferente.
	               JUCA
	               Como assim?
	               CHICO
	               É diferente.
	               JUCA
	               Diferente como?
	               CHICO
	               Muito melhor. É outra coisa.
	               JUCA
	               Não sei. Acho que vou morrer de vergonha de me
	               acabar na frente de alguém. Fico ridículo, já me
	               vi no espelho. (faz a careta) A guria vai me ver
	               me acabando é vai ter um ataque de riso, tenho
	               certeza.
	               CHICO
	               Não vai. É muito bom.
Juca pega um pão na sacola e come um pedaço.
	               JUCA
	               Bom como?
	               CHICO
	               Tu pára de pensar, isso é o melhor. Parece que...
	               tu tá explodindo e ficando inteiro ao mesmo tempo.
	               É quente, molhado.
Juca come mais um pedaço de pão.
	               JUCA
	               Continua.
	               CHICO
	               Não enche o saco.
	               JUCA
	               Que cor era a calcinha?
	               CHICO
	               Juca, não enche o saco.
CENA 10A - EDIFÍCIO QUEBRA-MAR - EXTERIOR/DIA
Chico e Juca saem do prédio, caminham na direção da praia.
	               CHICO
	               Não sei onde ela mora.
	               JUCA
	               A gente acha. Não tem ninguém nessa praia. Vamos
	               procurar. Tenho que passar em casa, deixar o pão e
	               trocar de camisa.
	               CHICO
	               Por quê?
	               JUCA
	               Não sei o que está escrito nessa camisa. E se a
	               guria pergunta o que está escrito? Elas adoram
	               perguntar essas coisas. Se ela pergunta o que está
	               escrito na minha camisa e eu não sei, não dá para
	               trepar.
	               CHICO
	               Quem vai trepar? A gente só vai procurar por ela
	               na praia.
	               JUCA
	               Nunca se sabe. Vou botar a branca da zoomp. Ou
	               então a listada da forum. Não, a listada da forum
	               é meio gay. A branca da zoomp. Merda, por que eu
	               não cortei meu cabelo ontem! Se soubesse que hoje
	               eu ia trepar...
	               CHICO
	               Tu nem sabe se ela tem alguma amiga. E se tiver,
	               pode ser um trubufu.
	               JUCA
	               Hoje eu como até gorda.
Chico e Juca fazem a curva da esquina e se afastam.
CENA 11 - PRAIA - EXTERIOR/DIA
	Chico e Juca caminham pela praia, agora mais cheia que das outras
	vezes. Juca está vestindo uma camisa com a cara do Shakespeare e
	um texto escrito: ...But love is blind and lovers cannot see the
	pretty follies that
	themselves commit. Shakespeare
	Crianças brincam, alguns homens jogam futebol. Passa um
	sorveteiro.
	               CHICO
	               Vamos voltar?
	               JUCA
	               Outra vez?
	               CHICO
	               Ela pode ter chegado agora.
	               JUCA
	               Vamos perguntar.
	               CHICO
	               Perguntar como?
	               JUCA
	               Se alguém conhece a Roza. Roza com z.
	               CHICO
	               Para todo mundo?
	               JUCA
	               Não, só para as gurias. Deixa que eu pergunto.
	Juca se aproxima de VIOLETA, 16 anos. Ela está sentada sob o
	guarda-sol, lendo uma revista, de camiseta e biquini.
	               JUCA
	               Oi. Tudo bem? Por acaso, tu não conhece uma menina
	               chamada Roza? Roza com z. Ela está numa casa por
	               aqui.
	               VIOLETA
	               Conheço.
	               JUCA
	               Conhece?
	               VIOLETA
	               Conheço.
Chico se aproxima.
	               JUCA
	               (para Chico) Ela conhece.
	               CHICO
	               Ó.
	               VIOLETA
	               Oi.
	               CHICO
	               Tu sabe onde ela mora?
	               VIOLETA
	               Não, só encontro na praia.
	               CHICO
	               Sabe de alguém que conhece ela?
	               VIOLETA
	               Não. Acho que ela vem sempre sozinha.
	               JUCA
	               Meu nome é Juca. Esse é o Chico.
	               VIOLETA
	               Oi.
	               JUCA
	               Seu nome como é?
	               VIOLETA
	               Violeta.
	               JUCA
	               Posso te chamar de Vi?
	               VIOLETA
	               Não.
	               JUCA
	               Desculpe.
	               VIOLETA
	               Tudo bem.
	               CHICO
	               E tu... não viu ela hoje?
	               VIOLETA
	               Não.
	               CHICO
	               Bom... então tá, obrigado. A gente vai dar mais
	               uma procurada.
Violeta larga a revista, levanta-se, tira a camisa.
	               VIOLETA
	               Eu vou com vocês.
	               JUCA
	               Vai? Boa, vamos.
	Os três caminham pela praia. Juca no meio, caminha sem tirar os
	olhos de Violeta.
	               VIOLETA
	               Legal essa camisa.
	               JUCA
	               Ah, brigado.
	               VIOLETA
	               O que está escrito?
	               JUCA
	               O amor é cego e os amantes não podem ver as
	               bonitas folias que eles mesmo cometem.
	               VIOLETA
	               Bonitas folias?
	               JUCA
	               É. É do Shakespeare.
	               VIOLETA
	               Faz tempo que tu não corta o cabelo?
	               JUCA
	               É, tava deixando. Mas vou cortar.
	               VIOLETA
	               Achei legal.
	               JUCA
	               Vou cortar um dia. Não sei quando. Talvez eu
	               deixe.
	               CHICO
	               A Roza te disse onde mora em Porto Alegre?
	               VIOLETA
	               Não. Vocês moram onde?
	               CHICO
	               Tristeza.
	               JUCA
	               Floresta.
	               VIOLETA
	               Onde na Floresta?
	               JUCA
	               Perto da Cristóvão.
	               VIOLETA
	               Eu moro na Cristóvão.
	               JUCA
	               Tá brincando? Perto dos bombeiros?
	               VIOLETA
	               Não, mais para cima. Sabe o Hospital Militar?
Juca e Violeta param de caminhar. Chico pára também.
	               CHICO
	               A Roza te disse se ia a algum lugar?
	               VIOLETA
	               (para Chico) Eu só vi a Roza uma vez. (para Juca)
	               O que aconteceu no teu pescoço?
	               JUCA
	               Tu já teve cachumba?
	               VIOLETA
	               Já. Tu tá com cachumba?
	               JUCA
	               Não, não, é que eu tô fazendo uma pesquisa.
	               Desloquei a terceira vértebra cervical. Eu estava
	               pegando onda, fui dar um drop, meu parceiro estava
	               no tubo, pranchou. Mas tudo bem, já estou pronto
	               para outra.
	               VIOLETA
	               Tu surfa?
	               JUCA
	               Surfo. E tu?
Chico vai saindo.
	               CHICO
	               Eu vou procurar mais um pouco.
	               JUCA
	               Isso aí.
	               VIOLETA
	               Tchau.
	Chico caminha pela praia. Ao fundo, Juca e Violeta seguem
	conversando.
CENA 12 - PRAIA - EXTERIOR/DIA
	Passagem de tempo, Chico caminha entre as árvores na beira da
	praia, procurando Roza. Vê uma MENINA DE COSTAS, parecida com
	ela, namorando com um RAPAZ, sentados no chão. Chico faz a volta
	para tentar ver o rosto da menina. Ela o vê, se assusta e fecha o
	zíper da calça.
	               CHICO (OFF)
	               Procurei Roza todos os dias. Na praia e no flíper.
	               Ela sumiu.
	Chico desce para a praia e passa por Juca, já sem tala no
	pescoço, e Violeta, que estão se agarrando sob um guarda-sol.
	Abana. Eles abanam.
	               CHICO (OFF)
	               Juca passou três dias chamando a Violeta de Vi,
	               Vivinha, Viviquinha, essas coisas. E ainda não
	               comeu.
CENA 13 - BAR DE PRAIA - INTERIOR/NOITE
	Juca dá um beijinho em Violeta e sai da mesa, arrastando Chico,
	que estava entrando no bar, pelo braço. Juca está de jaqueta,
	boné e echarpe.
	               CHICO
	               Que roupa é essa?
	               JUCA
	               Depois te explico. Ela tá sozinha em casa, a mãe
	               só volta no fim-de-semana. Tu tem que me ajudar.
	               CHICO
	               Quer que eu segure ela pra ti?
	               JUCA
	               Tu tem que ir junto, com outra guria. A gente come
	               uma pizza aqui, depois vai para casa dela. Aí a
	               gente joga carta, toma um vinho. O resto deixa
	               comigo. Gravei uma fita só com umas baladas, não
	               tem erro. Tu tem que ir. Com outra guria.
	               CHICO
	               Que guria?
	               JUCA
	               Qualquer uma. Convida alguém.
	               CHICO
	               Quem?
	               JUCA
	               Sei lá. Te vira. Pelo amor de deus, Chico.
	               CHICO
	               Eu não tenho grana, tô duro.
	               JUCA
	               Eu pago o jantar e o vinho.
	               CHICO
	               Não. Eu não estou a fim de arrumar uma guria
	               assim.
	               JUCA
	               Assim como?
	               CHICO
	               Eu vou procurar a Roza. Acho que ela tá em outra
	               praia.
	               JUCA
	               A Roza sumiu, Chico, deve ter voltado para Porto
	               Alegre.
	               CHICO
	               Ela disse que ia aproveitar essa última semana na
	               praia. Deve ser outra praia.
	               JUCA
	               E como é que tu vai procurar ela em outra praia se
	               tu não tem dinheiro nem pra jantar? Te dou cem
	               reais.
	               CHICO
	               Cem reais? Tá louco?
	               JUCA
	               Cem reais. (mostra duas notas de cinqüenta) Olha
	               aqui. Por favor, Chico. Amanhã tu procura a Roza.
Chico pega as duas notas, põe no bolso.
	               CHICO
	               Tá, vou ver.
	               JUCA
	               Se tu não for quero o dinheiro de volta.
	               CHICO
	               Vai para lá.
	Juca volta para a mesa com Violeta. Chico dá uma olhada pelo bar.
	Vê uma guria sozinha. Se aproxima. O namorado dela chega, beijam-
	se. Chico desvia, disfarça.
	Chico vê CARMEM, 18 anos, saia curta, mini-blusa, conferindo o
	cardápio numa mesa da calçada. Chico se aproxima.
	               CHICO
	               Oi.
Carmem olha para ele desconfiada.
	               CARMEM
	               Oi.
	               CHICO
	               Tá sozinha?
	               CARMEM
	               Por quê?
	               CHICO
	               Eu estou. Quer jantar comigo?
	               CARMEM
	               Não, obrigado.
Chico dá outra olhada pelo bar, mas só vê meninas acompanhadas.
	               CHICO
	               Olha, é o seguinte. Está a fim de ganhar cinqüenta
	               reais?
	               CARMEM
	               (mais desconfiada) A troco?
	               CHICO
	               O meu amigo ali está com uma namorada. Ele quer
	               comer uma pizza e depois jogar carta na casa dela.
	               E quer que eu vá junto. Me pagou cem reais. Te dou
	               cinqüenta para tu ir comigo.
	               CARMEM
	               Cinqüenta reais para comer uma pizza, tomar vinho
	               e jogar carta com vocês?
	               CHICO
	               É.
	               CARMEM
	               Até que horas?
	               CHICO
	               Meia-noite, no máximo.
	               CARMEM
	               Só isso?
	               CHICO
	               Só. Prometo. Comer e jogar carta. Depois a gente
	               vai embora e deixa os dois.
Ela abre a bolsa e mostra um tubo de spray.
	               CARMEM
	               Sabe o que é isso aqui?
	               CHICO
	               Não. O que é?
	               CARMEM
	               Spray repelente para urso. É feito de pimenta. Se
	               eu jogar isso na tua cara tu fica sem enxergar uns
	               dois dias.
	               CHICO
	               Não te preocupa. É só para comer e jogar carta
	               mesmo. Eu prometo.
	               CARMEM
	               E quem paga a conta aqui?
	               CHICO
	               Ele paga.
	               CARMEM
	               Tudo bem. Cadê o dinheiro?
CENA 14 - CASA DE VIOLETA - INTERIOR/NOITE
	Juca abre o vinho sempre olhando de forma romântica para Violeta.
	Ela, um pouco bêbada, gostando. Carmem, achando ridículo,
	observa. Chico olha pra ela meio que se desculpando pelo amigo.
	Juca serve o vinho no copo com a boca virada para baixo.
CENA 14A - CASA DE VIOLETA - INTERIOR/NOITE
	Chico e Carmem estão na mesa. Carmem está com a bolsa na mão,
	desconfiada. Violeta pega copos e Juca abre a segunda garrafa de
	vinho.
	               JUCA
	               Vocês sabem jogar dorminhoco?
	               CARMEM
	               Dorminhoco? Não. Sei jogar pôquer, escova, buraco.
	Violeta, que evidentemente já bebeu mais do que devia, arruma as
	cartas.
	               VIOLETA
	               É fácil. Dezessete cartas, às, rei, dama e valete
	               dos quatro naipes.
	               JUCA
	               E um coringa.
	               VIOLETA
	               E um coringa.
	               JUCA
	               Quatro cartas para cada um e um recebe cinco.
	               VIOLETA
	               Tem que formar os quartetos, cada um passa uma
	               carta por vez.
	               JUCA
	               Quem pega o coringa tem que ficar uma rodada, não
	               pode passar de primeira.
	               VIOLETA
	               É fácil.
	               JUCA
	               Quem formar primeiro baixa as cartas na mesa. O
	               último a baixar é o dorminhoco.
	               VIOLETA
	                (para Juca) Queima a rolha pra marcar.
Carmem põe a mão na bolsa.
	               CARMEM
	               Rolha? Que rolha? (para Chico) Tu não falou em
	               rolha.
	               VIOLETA
	               A gente queima uma rolha e marca o dorminhoco de
	               preto. Sai com água.
	               JUCA
	               Melhor! Vamos fazer assim: quem perder tem que
	               tirar uma peça de roupa.
	               VIOLETA
	               Isso! Melhor que rolha!
	               JUCA
	               Combinado?
	               CARMEM
	               (larga a bolsa) Pode ser. É melhor que rolha.
	               JUCA
	               Ótimo!
Violeta põe as cartas na mesa. Juca serve o vinho.
	               VIOLETA
	               (para Carmem) Corta.
Carmem corta o baralho, Violeta dá as cartas.
CENA 15 - CASA DE VIOLETA - INTERIOR/NOITE
	Passagem de tempo. Chico, só com um pé do tênis, está sem camisa,
	de calça. Violeta, quase dormindo, está de sutiã e saia. Carmem
	está completamente vestida. Juca está só de cueca e meias.
	               CHICO (OFF)
	               Com cinqüenta reais dá para comer quatro dias,
	               dormindo na barraca. Posso ir de ônibus e voltar
	               de carona, parando em cada praia. Ela diz que vai
	               a praia de tarde, eu viajo de manhã e procuro na
	               praia de tarde.
	Carmem baixa as cartas. Chico baixa as cartas. Juca baixa as
	cartas. Violeta continua de cartas na mão, fecha os olhos,
	cabeceia de sono.
	               JUCA
	               Violeta!
	               VIOLETA
	               O quê?
Ela acorda e baixa as cartas.
	               JUCA
	               Violeta! A saia!
	               VIOLETA
	               Ainda tenho as meias.
	               JUCA
	               Duas?
	               VIOLETA
	               Duas. Com licença.
	Violeta levanta. Cambaleia, quase cai. Chico levanta para segurá-
	la. Ela caminha para o sofá. Deita. Tenta tirar a meia mas não
	consegue. Deita a cabeça no sofá, fica com a meia pela canela.
	               CHICO
	               E agora?
	               JUCA
	               Deixa que eu tiro.
	Juca levanta e puxa a meia-calça de Violeta. Ela adormeceu
	profundamente.
	               JUCA
	               (tentando acordá-la) Violeta! Violeta!
	               CARMEM
	               Deixa ela dormir. (olha o relógio) Acabou o jogo.
	               Meia-noite. Obrigado pelo jantar e pelo vinho.
Chico veste a camisa.
	               CHICO
	               Eu vou contigo.
	               CARMEM
	               (para Juca) Tu não é colega do Gustavo?
	               JUCA
	               Que Gustavo?
	               CARMEM
	               O Cabeça, da Praça da Matriz.
	               JUCA
	               Sou. Por quê?
	               CHICO
	               Eu vou levar ela para a cama.
Chico ergue Violeta e a arrasta para o quarto.
	               CARMEM
	               Eu sabia que te conhecia. Eu sou prima do Gustavo.
	               JUCA
	               Prima? Do Cabeça?
	               CARMEM
	               É, prima.
	               JUCA
	               Olha só. Legal. E o Cabeça vai bem?
	               CARMEM
	               Faz tempo que eu não vejo.
	               JUCA
	               Pois é.
	               CARMEM
	               Bom, a gente se vê por aí. Obrigado pela pizza. E
	               pelo vinho.
	               JUCA
	               Ainda é cedo.
	               CARMEM
	               O combinado foi meia-noite.
	               JUCA
	               Que combinado?
	               CARMEM
	               Ele me pagou cinqüenta reais para eu ficar até a
	               meia-noite.
	               JUCA
	               Ah, é?
	               CARMEM
	               É.
	               JUCA
	               Quanto tu quer para ficar mais um pouco?
	               CARMEM
	               (ela sorri) Se for para jogar esta bobagem,
	               quinhentos. (insinuando-se) Agora, se tu quiser
	               fazer alguma coisa mais interessante... cento e
	               cinqüenta.
CENA 16 - QUARTO DE VIOLETA - INTERIOR/NOITE
	Chico larga Violeta na cama mas um botão da gola de sua camisa
	fica preso no sutiã, um daqueles que prende pela frente. Chico
	fica debruçado sobre Violeta na cama e tenta soltar o botão da
	camisa. Não consegue. Puxa o botão mas ele não se solta. Chico
	tira a camisa. Tenta soltar o botão mas ele está muito preso.
	Chico tenta arrancar o botão e ele fica preso por um fio de linha
	no sutiã. Chico resolve partir o fio de linha com os dentes.
	Quando ele está mergulhado entre os seios de Violeta ela acorda,
	sem entender muito o que está acontecendo.
	               VIOLETA
	               Chico?
Chico consegue soltar o botão.
	               CHICO
	               Oi?
	               VIOLETA
	               Chico, eu acho que eu bebi demais.
	               CHICO
	               Acho que sim. A gente já vai.
	               VIOLETA
	               Tá. Eu vou dormir. Pede desculpas pra eles. Diz
	               pra eles que eu acho que bebi demais.
	               CHICO
	               Tá bom. Dorme.
Violeta vira de lado e dorme. Chico veste a camisa. Juca entra.
	               JUCA
	               Cadê aquele dinheiro que eu te dei?
	               CHICO
	               Só tenho cinqüenta. Por quê?
	               JUCA
	               Me empresta.
	               CHICO
	               Para quê?
	               JUCA
	               Para dar para a Carmem. Fim de semana meu pai
	               chega e eu te pago.
	               CHICO
	               Vou precisar do dinheiro amanhã.
	               JUCA
	               Chico, tu não tinha dinheiro nenhum, esse dinheiro
	               eu te dei para tu me fazer um favor que tu devia
	               fazer de graça. Eu preciso do dinheiro agora e tu
	               não quer me emprestar?
	               CHICO
	               Tá bom.
Chico entrega o dinheiro a Juca.
	               JUCA
	               Fica aí.
Juca sai. Chico olha Violenta dormir. Senta e pega uma revista.
CENA 17 - SALA DE VIOLETA - INTERIOR/NOITE
	Juca entra na sala. Carmem está sentada no braço do sofá. Juca se
	aproxima, mostra a nota.
	               JUCA
	               O resto eu te dou depois.
	Carmem sorri, pega o dinheiro, guarda. Põe a mão no ombro de
	Juca. Ele sorri. Ela se aproxima e beija-lhe a boca. Afasta-se.
	Ele abre os olhos.
	               CARMEM
	               O resto eu te dou depois. Tchau.
	Ela sai. Juca fica parado no meio da sala. Chico aparece na porta
	do quarto.
	               CHICO
	               Ela já foi?
	               JUCA
	               Já.
	               CHICO
	               E o dinheiro?
	               JUCA
	               Eu gastei.
CENA 18 - PRAIA - EXTERIOR/DIA
	Chico e Juca caminham pela praia. Vêem o Surfista, de camisa e
	pescoço enrolado numa echarpe, sentado numa cadeira na beira da
	praia. A Morena está sentada no chão, ao lado dele. Juca esconde
	o rosto. Vêem Carmem com um SUJEITO. Ela abana para eles. Chico
	abana, Juca vira a cara.
	               CHICO (OFF)
	               Passei os últimos dias de praia procurando a Roza.
	               Não encontrei. Voltei para Porto Alegre.
CENA 18A - PORTO ALEGRE - EXTERIOR/DIA
	Imagens de Porto Alegre, muitos edifícios, muita gente na rua,
	muitas garotas da idade de Roza.
CENA 19 - QUARTO DE CHICO - INTERIOR/DIA
	Chico em seu quarto, observa a tabela periódica de elementos
	químicos. Fecha o livro, vira-se para um pequeno teclado
	(Cassio). Sobre uma das teclas está a ficha de flíper. Ele toca
	alguma coisa sem usar a tecla com a ficha. Pára. Examina a ficha.
	               CHICO (OFF)
	               Eu podia descobrir as impressões digitais dela na
	               ficha, se eu já não tivesse segurado e esfregado
	               esta ficha mil vezes. E se não tivesse que estudar
	               para a prova de química orgânica. Ligações
	               covalentes, pra que eu vou usar isso na vida?
	               Talvez ela já esteja na Austrália.
Toca o telefone. Ele atende.
	               CHICO
	               Alô?
	               CHICO
	               É.
	               CHICO
	               Claro.
	               CHICO
	               Tudo.
	               CHICO
	               Como é que tu conseguiu meu telefone?
	               CHICO
	               Sei.
	               CHICO
	               Não, estava estudando.
	               CHICO
	               Química orgânica.
	               CHICO
	               Quero, claro.
	               CHICO
	               Sei. Que horas?
	               CHICO
	               Tudo bem.
	               CHICO
	               Tá.
	               CHICO
	               Outro.
	Chico desliga o telefone, fica parado alguns segundos e dá um
	grito.
CENA 20 - QUARTO DE CHICO - INTERIOR/NOITE
	Chico fala olhando para si mesmo no espelho enquanto experimenta
	várias camisetas. Juca vai alcançando camisetas e jogando as já
	experimentadas na gaveta.
	               CHICO
	               Ela disse alô, eu disse alô, já achando que era
	               ela mas não podia ser ela. Ela disse é o Chico? e
	               eu disse é, aí já achando que era ela mesmo. Aí
	               ela disse é a Roza. Com z, lembra? Eu disse,
	               claro. Ela disse, tudo bom?, eu disse tudo. Aí ela
	               disse que queria me ligar mas não tinha o meu
	               número. Eu perguntei como ela conseguiu. Ela disse
	               que encontrou uma amiga da praia que tinha, deve
	               ser a Violeta.
	               JUCA
	               Argh.
	               CHICO
	               Eu disse sei e ela perguntou se estava
	               interrompendo alguma coisa, eu disse não, eu
	               estava estudando química orgânica. Aí ela
	               perguntou se eu queria encontrar com ela, eu disse
	               que sim, claro, é lógico. Não, eu acho que eu só
	               disse quero, claro. Aí ela perguntou se eu sabia
	               de um bar na Nilópolis, um que tem umas mesinhas
	               brancas e um toldo amarelo, perto do posto.
	               JUCA
	               O Coquinho.
Camiseta azul, gola redonda.
	               CHICO
	               O Coquinho. Eu disse sei e perguntei que horas.
	               Ela disse oito, oito e meia. Eu disse tudo bem,
	               ela disse então a gente se vê lá. Eu disse tá. Ela
	               disse um beijo. Eu disse outro.
	               JUCA
	               Vai com a azul. No Coquinho só tem moinhos, a azul
	               é mais moinhos. O que tu vai dizer? Tem camisinha?
Camiseta preta, gola vê.
	               CHICO
	               A gente não vai trepar no Coquinho.
	               JUCA
	                (dá uma camisinha para Chico) Leva camisinha.
	               CHICO
	               Uma só?
	               JUCA
	               Ué? Não ia trepar e agora quer duas?
	               CHICO
	               Só se der algum problema. Tudo bem, uma chega, a
	               gente não vai trepar.
	               JUCA
	               Tu sabe o que vai dizer para ela?
	               CHICO
	               Sei.
CENA 21 - MESA - INTERIOR/NOITE
Chico, de camiseta vermelha, toma um gole de guaraná.
	               CHICO
	               Eu pensei muito naquela noite. Claro que eu nunca
	               vou esquecer, tu sabe disso. Talvez tenha sido
	               mais importante para mim do que para ti, deve ter
	               sido. Mas eu queria que fosse importante para ti
	               também. Queria não, eu quero. Eu não quero que
	               aquela seja nossa única noite. Quero que seja a
	               primeira.
Juca olha para Chico.
	               JUCA
	               Tá legal. Esse "queria não, quero", parece que tu
	               errou e corrigiu na hora. Mas a camiseta azul é
	               melhor.
CENA 22 - BAR COQUINHO - EXTERIOR/NOITE
	Chico, de camisa azul, está sentado numa mesa de rua no Coquinho.
	Bebe um guaraná, de canudo. O guaraná tem aquele gelos furados,
	Chico espeta um gelo e larga o canudo sobre o copo, com o gelo
	pendurado como um anel.
	Chico fica olhando o gelo derreter pendurado no canudo. O gelo
	pinga magicamente no exato ritmo da música.
	O anel de gelo está quase se partindo. Chico passa os olhos pelo
	bar, nada de Roza. O anel de gelo se movimenta, vai cair. O gelo
	cai no copo.
	               ROZA
	               Oi.
	               CHICO
	               Oi.
	Chico se levanta. Beijam-se de maneira meio atrapalhada. Sentam.
	Chico sorri, Roza também.
	               CHICO
	               Bom te ver.
	               ROZA
	               Também queria te ver.
	               CHICO
	               Legal. Eu pensei muito naquela noite.
	               ROZA
	               Eu não pensei nada, acho que estava louca. A gente
	               nem usou camisinha.
	               CHICO
	               Não, eu quero dizer que eu pensei muito sobre
	               aquela noite. Claro que eu nunca vou esquecer, tu
	               sabe disso.
	               ROZA
	               Nem eu vou esquecer. Eu estou grávida.
Chico fica olhando para Roza. Ela sorri.
CENA 23 - PRAÇA - EXTERIOR/NOITE
Roza mostra a Chico uma tabela de cores de um teste de gravidez.
	               ROZA
	               Olha aqui. Se ficar vermelho, ou cor de rosa, é
	               porque tu não tá. Se der verde, ou azul, é porque
	               tu tá. Quanto mais azul, mais é certo que tu tá
	               grávida.
	               CHICO
	               E aí?
	Ela mostra, numa agenda, uma tirinha de papel, metade branca,
	metade verde, bem clarinho. Chico examina a tirinha na luz.
	               CHICO
	               É meio verde mesmo.
	               ROZA
	               Essa foi a primeira que eu fiz, semana passada.
	               Esta eu fiz ontem.
Ela mostra uma tirinha metade branca e metade muito azul.
	               CHICO
	               E tu fez mais de uma vez?
	Ela mostra a ele um folha da agenda com várias tirinhas, todas
	muito azuis.
	Uma PAI e uma MÃE com seus DOIS FILHOS estão comprando pipocas.
	Chico olha para as crianças enquanto fala com Roza.
	               ROZA
	               Eu vou tirar.
	               CHICO
	               Como?
	               ROZA
	               Vou abortar.
	               CHICO
	               Mas como?
	               ROZA
	               Numa clínica. Uma amiga minha conhece.
	               CHICO
	               Não é perigoso?
	               ROZA
	               Sempre é, um pouco. Ela disse que é um lugar
	               chique, sala de espera, cheio de gente. Na zona
	               sul.
	               CHICO
	               Como é que faz?
	               ROZA
	               É uma máquina, um tubo, tipo um aspirador. O cara
	               enfia o tubo, liga a máquina e pronto.
	               CHICO
	               Pode ser perigoso.
	               ROZA
	               Se eu fizer logo, não é tanto. Quanto mais cedo,
	               menos perigoso.
	               CHICO
	               Eu posso te ajudar?
	               ROZA
	               Não sei. Tu tem mil reais?
	               CHICO
	               Mil reais? Custa mil reais?
	               ROZA
	               Custa dois mil reais. Eu acho que consigo mil, já
	               tenho seiscentos. Se tu não tiver, tudo bem.
	               CHICO
	               Mil reais?
	               ROZA
	               Mil reais. Eu posso conseguir mais um pouco se
	               vender o celular.
	               CHICO
	               Tu tem celular?
	               ROZA
	               Tenho, mas é de cartão. (anota o número, dá o
	               papel a ele) Me liga. Se eu conseguir mais que
	               mil, te aviso. Se tu me ligar e outra pessoa
	               atender é porque eu vendi o celular.
	               CHICO
	               Tá.
	               CHICO
	               Eu acho que ia ser legal ter um filho contigo.
	               ROZA
	               É. Quem sabe, mais tarde.
	               CHICO
	               É.
CENA 24 - BRIC - INTERIOR/DIA
	Objetos variados expostos num bric: um carrinho de bebê, um
	cavalinho, uma cadeirinha de bebê. Chico entrega um amplificador
	para um VENDEDOR. O cara testa o amplificador. Chico examina
	sapatinhos cor-de-rosa. Chico fica olhando para os objetos à
	venda.
	               CHICO (OFF)
	               O filho que eu não vou ter com Roza nunca vai
	               mentir para a mãe que o amplificador estragou para
	               poder vender por seiscentos um amplificador que
	               vale mil e juntar com o dinheiro da poupança para
	               pagar um aborto.
CENA 25 - PRAÇA - EXTERIOR/DIA
	Chico e Roza num banco de praça. Ela chora, ele conta o dinheiro.
	Termina de contar, põe o dinheiro na agenda dela.
	               CHICO
	               Falta duzentos. Vou pedir para o Juca, talvez ele
	               tenha.
	               ROZA
	               Melhor não dizer para ninguém. Eu consigo.
	               CHICO
	               Quer que eu vá contigo?
	               ROZA
	               Não precisa. A minha amiga vai, ela tem carro.
	               CHICO
	               Quando tu vai?
	               ROZA
	               Logo que der. Acho que amanhã. Eu te ligo.
	               CHICO
	               Liga?
	               ROZA
	               Ligo.
Ela dá um beijo nele, enxuga as lágrimas e sai.
CENA 26 - QUARTO DE CHICO - INTERIOR/DIA
	Chico em sua casa, sentado, olha o telefone. Ele pega o telefone
	e confere o botão que regula a altura do toque, põe no volume
	máximo. Larga o telefone.
	Levanta-se, caminha pelo quarto. Vai até o teclado e toca a mesma
	música, agora com um som fraquinho. Vai até o telefone. Confere o
	fio do telefone, verifica se está bem conectado na parede. Pega o
	fone e escuta rapidamente. Desliga e fica olhando para o
	telefone.
Pega o telefone e disca.
	               CHICO
	               Roza?
	               CHICO
	               Tu tá com a Roza?
	               CHICO
	               Ah, é? Quando?
	               CHICO
	               E... tu conhece a Roza de onde?
	               CHICO
	               Ah, é?
	               CHICO
	               Não, ela me falou que ia vender o celular, mas não
	               pensei que fosse tão rápido. Ela não te deixou
	               nenhum número?
	               CHICO
	               Bom, se ela ligar tu podia dar um recado?
	               CHICO
	               Tudo bem, eu sei que ela não vai ligar, mas SE ela
	               ligar, tu pode dizer que o Chico telefonou?
	               CHICO
	               Tá bom, obrigado.
CENA 27 - QUARTO DE CHICO - INTERIOR/NOITE
Juca está jogando tetris no computador. Chico está na cama.
	               JUCA
	               Quem disse que o filho era teu?
	               CHICO
	               Não enche o saco.
	               JUCA
	               Tô falando sério. Quem disse que era teu?
	Juca tem um espaço certinho para uma pedra comprida de quatro,
	vermelha. Mas ela não vem.
	               CHICO
	               Eu sei que era meu. Ela sabia.
	               JUCA
	               Sabia que precisava de mil reais, isso é que ela
	               sabia. Pode ter pedido pro outro cara, ele não
	               deu, ela te procurou.
	               CHICO
	               Era meu. Eu sei que era.
	O espaço da pedra de quatro continua vago, Juca empilha as outras
	pedras nos cantos.
	               JUCA
	               Ela vendeu o celular.
	               CHICO
	               Ela disse que ia vender.
Surge uma pedra vermelha. Cai e se encaixa na buraco.
	               JUCA
	               Ela não te ligou, não te deu endereço. Tu não acha
	               estranho?
Quatro fileiras desaparecem.
CENA 28 - BAR COQUINHO - EXTERIOR/NOITE
Chico no bar, sozinho. Olha entre as mesas.
	               CHICO (OFF)
	               Achei estranho. Passou uma semana e eu achei muito
	               estranho. Passou um mês e eu tive certeza que ela
	               estava na Austrália, rindo da cara do idiota que
	               pagou o aborto para ela.
CENA 29 - PLAYWORLD - INTERIOR/NOITE
Chico joga pimbal.
	               CHICO (OFF)
	               Passou um ano e eu estava no mesmo flíper, jogando
	               na mesma máquina, na mesma praia, a maior e pior
	               do mundo. Felizmente era dezembro, o meu pai
	               juntou uma grana este ano. Prometeu que no ano que
	               vem nós vamos tirar férias em janeiro. Meu recorde
	               no pimbal era quarenta e oito mil e eu já estava
	               com cinqüenta e seis. Sessenta! Sessenta e dois
	               mil. Sessenta e quatro!
	               CHICO
	               Setenta mil!
Juca se aproxima.
	               JUCA
	               Setenta mil?
	               CHICO
	               Setenta e dois!
A bola passa. Game over.
	               CHICO
	               Merda!
Acende-se o placar: record!
	               JUCA
	               Recorde da máquina!
	O cursor do placar dos recordes está piscando no décimo lugar. O
	primeiro, segundo, terceiro, quinto e sétimo lugares estão
	ocupados por Roza, com z. O placar também indica as datas dos
	recordes.
Chico e Juca ficam olhando para o placar.
CENA 30 - RODOVIÁRIA - EXTERIOR/DIA
	Chico, de mochila, na fila para comprar passagens da rodoviária.
	Confere o dinheiro na carteira, olha para o quadro de avisos.
	               CHICO
	               Ela sabia jogar, sabia jogar muito bem. Ela fingiu
	               que não sabia para eu ajudar.
	               JUCA
	               Talvez o filho fosse teu.
	               CHICO
	               Que filho? Ela nem tava grávida.
Chico chega no balcão.
	               CHICO
	               (ao vendedor) Noiva do Mar. Só ida.
	               JUCA
	               Tu disse que viu o exame.
Chico pega a passagem e sai.
	               CHICO
	               Vi umas tirinhas de papel, podia ser qualquer
	               coisa. Ela me fez vender meu pioneer. Eu vou matar
	               aquela guria.
Chico está entrando no ônibus.
	               JUCA
	               Esquece.
	               CHICO
	               Esquece um cacete. Ela deve estar numa praia,
	               procurando idiotas como eu.
Chico embarca no ônibus interpraias. Senta e abre a janela.
	               JUCA
	               Ela pode estar na Austrália.
	               CHICO
	               Eu encontro.
CENA 31 - ÔNIBUS - EXTERIOR/DIA
	O ônibus passa pela estrada entre dunas e lagoas. Chico, com a
	cara grudada o vidro, olha os fios que correm ao lado da estrada.
	Parece que é o fio que se move, descendo e subindo, uma linha
	preta embarrigando sobre um céu azul e nuvens ralas.
CENA 32 - CALÇADA - EXTERIOR/DIA
	Chico, de mochila nas costas, caminha perto de um parque de
	diversões, vazio. Vê um HOMEM, arrumando a máquina de um
	carrossel. Chico se aproxima para falar com o homem mas ele
	desaparece.
CENA 33 - BAR - EXTERIOR/NOITE
	Chico caminha por uma calçada cheia de gente, mesas nas calçadas.
	Uma guria está chorando, outra guria consola. Um gordo ri alto.
	Um garçom traz dois chopes.
CENA 34 - CHAFARIZ - EXTERIOR/DIA
Chico lava os pés na fonte de uma praça.
CENA 35 - ÔNIBUS - EXTERIOR/DIA
	Chico passa de ônibus e vê Carmem num treiler. Ela está comendo
	um chesseburger.
CENA 36 - FLÍPER - INTERIOR/NOITE
Chico caminha entre as máquinas de um flíper.
CENA 37 - CALÇADA - EXTERIOR/NOITE
	Chico está sentado sobre o capô de um carro. Um HOMEM chega e
	entra no carro. Chico levanta, faz menção de falar com o homem
	mas ele liga o carro e parte.
CENA 38 - PRAIA - EXTERIOR/DIA
	Chico caminha pela praia, observando as meninas. Uma MENINA se
	parece com Roza, de costas. Ele se aproxima e vê que é outra
	menina.
CENA 39 - CALÇADA - EXTERIOR/DIA
	Chico está sentado num muro. Um VELHO, carregando um cão fila
	pela coleira, fica parado, encarando Chico.
Chico levanta e vai saindo de fininho.
CENA 40 - ESTRADA - EXTERIOR/DIA
	Chico pede carona. Uma kombi, dirigida pára. Ele embarca na
	kombi.
CENA 41 - KOMBI - EXTERIOR/DIA
	Chico, com uma cara de enjôo, tenta sorrir para seus companheiros
	de viagem, QUATRO PESCADORES. Chico olha um balaio cheio de
	peixes.
	Um pescador oferece a Chico uma garafa de cachaça com ervas e uma
	cobra dentro. Chico bebe um gole.
	A kombi balança. Chico olha o balaio. Um Pescador fuma. Chico
	vomita no balaio de peixes.
CENA 42 - ESTRADA - EXTERIOR/DIA
	Chico desce da kombi no meio da estrada. Os pescadores partem,
	xingando.
Chico, enjoado, sai caminhando pela estrada.
CENA 42A - LOJA DE BUJIGANGAS - INTERIOR/DIA
Chico, viajandão, passa entre as bujigangas das lojas.
CENA 43 - BAR DE CALÇADA - EXTERIOR/NOITE
	Chico, no bar, come um sanduíche. Ouve o barulho de um pimbal,
	alguém jogando muito bem. Chico interrompe a mordida no meio.
	Entra no flíper.
CENA 44 - FLÍPER - INTERIOR/NOITE
	Chico se aproxima por trás da máquina onde há alguém marcando
	muitos pontos. Chico, de longe, espia quem está jogando.
	É uma criança. Chico morde o sanduíche. Chico pára de mastigar,
	parece ter reconhecido a criança. Aproxima-se.
	               CHICO
	               Oi.
	               CRIANÇA
	               Não atrapalha.
	               CHICO
	               Eu te conheço.
	               CRIANÇA
	               Sorte tua.
	               CHICO
	               A gente não se viu no ano passado?
	               CRIANÇA
	               Game-over! Tu me atrapalhou. Tu me fez perder uma
	               ficha!
	               CHICO
	               Eu te compro outra.
Chico vai até o caixa. Pede uma ficha a moça do caixa. É Roza.
	               ROZA
	               Ó.
	               CHICO
	               Ó.
CENA 45 - HOTEL - INTERIOR/NOITE
	A Criança está dormindo no sofá de um pequeno apartamento de
	hotel. Roza tira o som de uma televisão portátil. Chico está na
	sala, Roza vai até o quarto, pega a carteira, tira o talão de
	cheques. Chico pára na porta do quarto.
	               ROZA
	               Quer os juros da poupança?
	               CHICO
	               Quero. Quanto dá?
	               ROZA
	               Tu me deu oitocentos, faz um ano. Acho que dá uns
	               mil.
	               CHICO
	               Tá bom.
	Ela faz o cheque. Ele entra no quarto, tira a ficha do flíper do
	bolso.
	               CHICO
	               Essa ficha é tua. Lembra?
	               ROZA
	               Pode deixar aí.
Ela estende a mão com o cheque.
	               CHICO
	               Esse cheque tem fundo?
	               ROZA
	               Vou botar o telefone atrás. Tá bom assim?
Ela escreve o telefone e entrega o cheque a ele.
	               CHICO
	               (ele pega o cheque e confere) Outro celular. É teu
	               mesmo?
	               ROZA
	               (mostra o celular) Quer conferir?
	               CHICO
	               Quero.
	Chico senta na cama, pega o telefone do quarto olha o número no
	cheque e disca. O celular dela toca.
	               ROZA
	               Quer que eu atenda?
Ele desliga o telefone. Ela guarda o celular.
	               CHICO
	               O que tu ganhou com isso?
	               ROZA
	               No verão passado? Catorze mil reais. Vinte e dois
	               caras, quinze caíram. Estou devolvendo mil. Ganhei
	               catorze mil.
	               CHICO
	               Vinte e dois caras?
	               ROZA
	               Vinte e três, na verdade. Mas um eu nem procurei,
	               ele trabalha de office-boy, sustenta a mãe e o
	               irmão, só descobri depois. Deixei para lá. Eu
	               preciso dormir.
	Roza pega um vidro de mertiolate, abre. Roza senta numa cadeira e
	apoia o pé sobre a cama. Começa a passar mertiolate entre os
	dedos do pé.
	               CHICO
	               Tu não ficou com medo de engravidar de verdade?
	               ROZA
	               Eu tomo pílula.
	               CHICO
	               E a aids? Se o cara usa camisinha, não funciona.
	               ROZA
	               É, eu sei. Mas eu só escolho caras de pouca
	               experiência. Ou nenhuma, como tu.
	               CHICO
	               Dava para ver assim, de longe?
	               ROZA
	               Quase sempre dá. Mais alguma coisa?
Ela troca o pé.
	               CHICO
	               Ele é teu filho?
	               ROZA
	               Meu irmão.
	               CHICO
	               E a tua mãe?
	               ROZA
	               Não sei onde anda.
	               CHICO
	               Teu pai?
	               ROZA
	               Morreu.
	               CHICO
	               Não tem mais ninguém?
	               ROZA
	               Onde?
	               CHICO
	               Tua família.
	               ROZA
	               Tenho um tio. Um idiota, casado com uma imbecil.
Ela abaixa o pé e fecha o vidro de mertiolate.
	               CHICO
	               Isso tudo não dá muito trabalho? Porque tu não
	               cobra para transar? É mais prático.
	               ROZA
	               E tu acha que alguém ia pagar mil reais para
	               transar comigo?
	Chico olha para ela. Pega o cheque e rasga e pedacinhos. Joga os
	pedacinhos do cheque sobre cama. Ela fecha e larga o vidro de
	mertiolate.
Chico tira os tênis e joga no chão.
	Roza vai até a porta do quarto e se certifica que a criança está
	dormindo na sala. Fecha a porta do quarto.
	Roza, tirando a blusa, olha para Chico e sorri. Chico também
	sorri.
	A blusa de Roza cai no chão, junto aos tênis de Chico. A colcha
	da cama cai e provoca uma revoada de pedacinhos de cheque pelo
	quarto.
CENA 45A - FACHADA DO HOTEL - EXTERIOR, DIA
Fachada do hotel - A luz de um quarto se apaga.
CENA 46 - MINIGOLFE - EXTERIOR/DIA
	Manhã/quase ninguém na rua. Chico caminha por um campo de
	minigolfe. Entra numa das pistas. A pista, de cimento, tem como
	obstáculo um grande calombo. Chico chuta uma tampinha, posiciona
	a tampinha no centro da pista. Chico observa o trajeto que a
	tampinha deverá fazer para chegar no buraco, além do calombo.
	Chico olha para a tampinha e dá um chute, seco.
A tampinha sobe e desce o calombo e cai exatamente no buraco.
Chico sorri.
CENA 45B - QUARTO DE HOTEL - INTERIOR/AMANHECER
	Roza faz as malas. A Criança dorme. Roza guarda suas roupas e as
	roupas da criança. Junta tralhas variadas, pega a televisão
	portátil. Acorda a Criança.
	Roza, cheia de bagagem e carregando a Criança (ou arrastando pela
	mão), sai do quarto.
CENA 47 - FLÍPER - INTERIOR/DIA
	Chico entra no flíper. INÁCIO, 30 anos, está no balcão conferindo
	um livro caixa. Chico se aproxima.
	               CHICO
	               Oi. A Roza tá aí?
	               INÁCIO
	               Tu conhece ela?
	               CHICO
	               Conheço.
Inácio marca o livro e fecha.
	               INÁCIO
	               Sabe onde ela mora?
	               CHICO
	               Aqui na praia sei. Num hotel. Por quê?
	               INÁCIO
	               Não mora mais.
	               CHICO
	               Eu estive lá ontem.
	               INÁCIO
	               Ela se mandou, hoje. Sem pagar a conta. Eu estive
	               lá, procurei no quarto. Tu não tem um telefone, um
	               endereço dela em outro lugar?
	               CHICO
	               Não. Acho que ela mora em Porto Alegre. Ela não
	               deu o endereço no hotel?
Inácio volta para o balcão e abre o livro caixa.
	               INÁCIO
	               Deu, deve ser falso, claro. O telefone que ela deu
	               é de uma gráfica. Ela te deu um cano também?
	               CHICO
	               Deu.
	               INÁCIO
	               Quanto?
	               CHICO
	               Mil reais.
	               INÁCIO
	               Vagabunda. Daqui ela tirou seiscentos e cinqüenta,
	               do caixa. Mais duzentos que eu emprestei. E mais
	               uma televisão portátil. Colorida. Se tu encontrar
	               com ela, dá um recado para mim?
	               CHICO
	               Dou.
	               INÁCIO
	               Diz que eu confiei nela. Ajudei quando ela estava
	               precisando, dei pra ela um dinheiro que eu não
	               podia dar. Eu vi que ela não valia nada mas mesmo
	               assim ajudei. Eu gostava dela. E ela me sacaneou.
	               Diz pra ela que ela é uma vagabunda. Que o Inácio
	               mandou dizer que ela é uma vagabunda.
	               CHICO
	               Pode deixar. Eu digo.
CENA 47A - PIER - EXTERIOR/FIM DE TARDE
Chico come churros sozinho. Limpa a boca e sai.
CENA 48 - QUARTO DE CHICO - INTERIOR/NOITE
	Chico em seu quarto, larga a mochila. Pensa. Tira os tênis. Fica
	olhando para os tênis no chão, pensativo. Dentro do tênis tem um
	pedacinho do cheque.
	Chico pega o pedacinho do cheque, vira. No lado de trás, com a
	letra de Roza, estão anotados os seis primeiros números de um
	telefone celular. Chico fica olhando para aqueles números.
	(Montagem de cenas muito curtas, pessoas dos mais variados tipos,
	nos mais diferentes lugares, atendendo telefones celulares. Todas
	atendem e dizem "alô". Sobre as cenas, OFF de Chico e Juca).
CENA 49 - CALÇADA - EXTERIOR/DIA
Homem de terno e gravata atende o celular.
	               JUCA (OFF)
	               Faltavam dois números?
CENA 50 - SUPERMERCADO - INTERIOR/DIA
Mulher fazendo compras atende o celular.
	               CHICO (OFF)
	               Dois números. Os últimos. Não consegui lembrar.
CENA 51 - CARRO - EXTERIOR/DIA
Mulher dirigindo atende o celular.
	               JUCA (OFF)
	               Noventa e nove possibilidades.
CENA 52 - ESCRITÓRIO - INTERIOR/DIA
Homem atende o celular.
	               CHICO (OFF)
	               Cem.
CENA 53 - SALA DE AULA - INTERIOR/DIA
Professor, no quadro negro, atende o celular.
	               JUCA (OFF)
	               Cem?
CENA 54 - CONSULTÓRIO DENTÁRIO - INTERIOR/DIA
Dentista atende o celular.
	               CHICO (OFF)
	               Claro. O zero-zero também conta.
CENA 55 - SALA - INTERIOR/NOITE
Mulher atende o celular.
	               JUCA (OFF)
	               Cem. Tu ligou pra cem celulares?
CENA 56 - PÁTIO DE ESCOLA - EXTERIOR/DIA
Menina atende o celular.
	               CHICO (OFF)
	               Quarenta e oito. Tive sorte.
CENA 57 - LOJA DE ROUPAS - INTERIOR/DIA
Homem atende o celular.
	               JUCA (OFF)
	               E o que foi que ela disse?
CENA 58 - LOJA DE DISCOS - INTERIOR/DIA
Roza atende o celular.
	               CHICO (OFF)
	               Ela disse alô.
	               ROZA
	               Alô.
CENA 59 - BAR COQUINHO - EXTERIOR/FIM DE TARDE
Chico e Juca numa mesa.
	               JUCA
	               Chico, eu acho que eu não conheço ninguém mais
	               idiota do que tu. Tu gastou uns cinqüenta reais em
	               telefone pra achar uma guria que roubou teu
	               amplificador e cobra mil reais pra transar! A
	               prima do Cabeça cobra cento e cinqüenta!
	               CHICO
	               Eu não estou a fim da prima do Cabeça.
	               JUCA
	               Vai dizer que tu tá a fim dessa guria?
	               CHICO
	               Não sei. É diferente.
	               JUCA
	               Pode ser diferente, mas não pode ser oitocentos e
	               cinqüenta reais de diferença. Tu pagou mil reais
	               por uma trepada.
	               CHICO
	               Quinhentos. Mil por duas.
	               JUCA
	               É. Mesmo assim é trezentos e cinqüenta reais mais
	               caro que a prima do Cabeça. O que que ela faz?
	               CHICO
	               Como assim?
	               JUCA
	               O que ela faz por quinhentos reais?
	               CHICO
	               Não enche o saco.
	               JUCA
	               Sabe o que a prima do Cabeça faz por cento e
	               cinqüenta?
	               CHICO
	               Sei, tu já me contou mil vezes.
	               JUCA
	               Tu acha que ela vem?
	               CHICO
	               Não sei. Disse que vinha.
	               JUCA
	               Será que ela não tem uma amiga mais em conta?
	               CHICO
	               Pode ser. Pergunta para ela.
Roza chega.
	               ROZA
	               Ó.
	               CHICO
	               Ó.
	               JUCA
	               Oi.
	               CHICO
	               Esse é o Juca.
	               ROZA
	               Oi.
	               JUCA
	               Posso te fazer uma pergunta?
	               ROZA
	               O quê?
	               JUCA
	               Tu aceita vale refeição?
	               ROZA
	               Gracinha.
Juca levanta e vai saindo.
	               JUCA
	               (para Roza) De repente, te ligo.
	               ROZA
	               (para Juca) Isso. Vai guardando tua mesada e me
	               liga no ano que vem. (para Chico) O que tu quer?
	               CHICO
	               Queria te ver.
	               ROZA
	               Já viu. O que mais?
	               CHICO
	               O que que foi?
	               ROZA
	               Não posso demorar, meu irmão tá sozinho.
	               CHICO
	               Eu te levo.
	               ROZA
	               Tá de carro?
	               CHICO
	               Te levo de táxi.
	               ROZA
	               E como tu volta? Eu moro longe, na zona sul.
	               CHICO
	               Volto de ônibus. Vamos.
CENA 60 - TÁXI - EXTERIOR/NOITE
	Chico e Roza no banco traseiro de um táxi.
	               
	               CHICO
	               Tu tá trabalhando onde agora?
	               ROZA
	               Numa loja.
	               CHICO
	               E o dinheiro?
	               ROZA
	               Que dinheiro?
	               CHICO
	               O dinheiro que tu tem guardado? Por que não usa?
	               ROZA
	               Não posso, tenho que guardar.
	               CHICO
	               Para ir pra Austrália?
	               ROZA
	               É, isso, para ir para a Austrália. (ao motorista)
	               A próxima o senhor entra à direita.
	               CHICO
	               Quanto custa duas passagens para a Austrália?
	               ROZA
	               Porque duas?
	               CHICO
	               O teu irmão.
	               ROZA
	               Não vou levar o meu irmão para a Austrália. (ao
	               motorista) O senhor cuide que a próxima é
	               preferencial.
	               CHICO
	               Ele vai ficar com quem?
	               ROZA
	               Com o meu tio.
	               CHICO
	               Tu disse que ele era um idiota, casado com uma
	               imbecil.
	               ROZA
	               Disse. Ele é um idiota casado com uma imbecil. Vou
	               fazer o quê? Também, nem sei se eu estou a fim de
	               ir para a Austrália. (ao motorista) Atrás daquela
	               Brasília o senhor pára.
O táxi. Pára.
	               ROZA
	               Ele vai continuar.
	               CHICO
	               Não, eu pego um ônibus.
	               ROZA
	               Não tem ônibus aqui esta hora, só lá embaixo. Vai
	               com o táxi, eu pago até aqui.
	               CHICO
	               Eu caminho até lá embaixo. (ao motorista) Quanto
	               foi?
CENA 61 - CALÇADA - EXTERIOR/NOITE
	O táxi vai embora, Chico fica com Roza na calçada. Ela abre a
	porta do prédio, acende a luz do corredor.
	               ROZA
	               É melhor tu não subir, o meu irmão tá dormindo.
	               CHICO
	               O que que tem? A gente não faz barulho.
	               ROZA
	               Chico, olha. Vai embora. Eu gosto de ti, tu é
	               legal, legal mesmo. Mas vai embora.
	               CHICO
	               Eu não quero ir embora.
	               ROZA
	               Eu não quero complicar tua vida. Esquece. Já foi.
	               
	               CHICO
	               Eu não tô a fim de esquecer. Complicar minha vida
	               por quê?
	               ROZA
	               Chico. Eu estou grávida.
A luz do corredor se apaga.
CENA 62 - COZINHA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/NOITE
Roza lava a louça. Chico seca.
	               CHICO
	               Tu acha que pode ser meu?
	               ROZA
	               Chico, por favor. Acho que não.
	               CHICO
	               Acha ou não?
	               ROZA
	               Não sei, não importa. Eu não estou te pedindo
	               nada.
	               CHICO
	               Não sabe? E se for?
	               ROZA
	               Se for, é. Eu não quero nada. É meu.
	               CHICO
	               Tu vai tirar?
	               ROZA
	               Não sei. E melhor tu ir embora.
	               CHICO
	               Eu não quero ir embora. E não sei se quero que tu
	               tire. Tu tem dinheiro guardado.
	               ROZA
	               Que dinheiro, uma merreca.
	               CHICO
	               Eu posso trabalhar.
	               ROZA
	               Não viaja, Chico.
	               CHICO
	               Estou falando sério.
	               ROZA
	               Não, não tá, tu tá viajando. Tu quer trabalhar,
	               casar e criar dois filhos que não são teus?
	               CHICO
	               Um pode ser meu.
	               ROZA
	               Não interessa, pode não ser. Acho que não é.
	               CHICO
	               Não interessa mesmo. Mas eu não quero ir embora.
	               Eu gosto de ti. Gosto muito de ti.
	               ROZA
	               Eu também gosto de ti.
	               CHICO
	               Pois então?
	               ROZA
	               Pois então o quê?
	               CHICO
	               Eu gosto de ti, tu gosta de mim. Por que que eu
	               tenho que ir embora? Tá esperando alguém?
	               ROZA
	               Não, não estou.
Roza desliga a luz da cozinha.
	               ROZA
	               Vamos pro meu quarto.
CENA 63 - QUARTO DE ROZA - INTERIOR/NOITE
Chico, na janela, observa a rua.
	               CHICO (OFF)
	               Se eu tivesse batido o recorde no tiro ao pato no
	               dia em que eu conheci a Roza talvez eu não tivesse
	               conhecido a Roza e a gente não teria um filho.
Chico observa Roza dormir.
	               CHICO (OFF)
	               Eu posso ter um filho por ter errado num pato. Eu
	               não sei o que isso significa, mas deve significar
	               alguma coisa.
Chico vai para a cama.
CENA 64 - QUARTO DE ROZA - INTERIOR/DIA
	Amanhece. Chico acorda, a cama vazia. Senta-se na cama. Levanta.
	Vê a bolsa de Roza na mesinha de cabeceira, ao lado de uma
	televisão portátil.
CENA 65 - COZINHA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/DIA
Chico entra na cozinha. Vê um bilhete.
"Fui levar o guri no colégio. Esquenta o leite. Já volto."
	Chico vê a leiteira no fogo, com leite. Na mesa da cozinha há
	duas xícaras limpas e um copo plástico, com um resto de
	chocolate. Farelos de pão sobre a toalha. Chico, movendo-se no
	ritmo da música, pega o copo plástico e lava.
	Limpa o farelo de pão da mesa, junta o farelo na mão. No meio do
	farelo há um pequeno pedaço de alumínio. Chico examina o alumínio
	e lê: TER.
	Chico joga o farelo e o pedacinho de alumínio no lixo. Tenta
	acender o fogão, mas não consegue. Procura fósforos. Não
	encontra.
CENA 66 - QUARTO DE ROZA - INTERIOR/DIA
	Chico vai até o quarto e vê a bolsa de Roza. Despeja a bolsa
	sobre a cama: carteira, algum dinheiro solto, cigarro, presilha
	de cabelo, caixa de remédio, óculos escuros, um isqueiro cor de
	rosa, a ficha do flíper. Chico pega a ficha do flíper, sorri.
	Começa a dançar mais animadamente. Pega o isqueiro.
CENA 67 - COZINHA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/DIA
Chico, na cozinha, acende o fogo sob a leiteira. Volta ao quarto.
CENA 68 - QUARTO DE ROZA - INTERIOR/DIA
	Chico guarda o isqueiro na bolsa. Guarda o cigarro, a ficha do
	flíper, a carteira, os óculos, examina a caixa de remédio. Pára
	de dançar. Chico abre a caixa de remédio e vê a bula. Lê. Examina
	uma cartela de pílulas, parcialmente vazia. As pílulas tem os
	dias marcados: QUA, QUI, SEX.
CENA 69 - COZINHA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/DIA
	Chico volta a cozinha, procura o pedacinho de alumínio no lixo.
	Encontra. Compara o pedacinho de alumínio onde está escrito TER
	com a cartela de pílulas. O pedaço de alumínio se encaixa
	perfeitamente. Toca o telefone.
	Chico fica parado no meio da cozinha, com as pílulas na mão. A
	secretária eletrônica atente o telefone.
	               ROZA (OFF)
	               (gritando) Chico! Chico acorda! Atende Chico!
	               Chico! Tu tem que sair daí agora! O dono do
	               apartamento tá chegando. Chico! Sai daí, rápido!
CENA 70 - QUARTO DE ROZA - INTERIOR/DIA
Chico vai até o quarto e atende o telefone.
	               CHICO
	               Alô.
	CENA 71 - CALÇADA - EXTERIOR/DIA
	(em paralelo com cena 70)
	Roza, num orelhão em frente ao prédio, do outro lado da rua. Ao
	fundo, na calçada do prédio, Inácio e uma MULHER de casaco
	vermelho, 25, descarregam malas de um táxi.
	               ROZA
	               (ao telefone) Chico, sai daí. Rápido.
	               CHICO
	               (ao telefone) Tu tá tomando pílula.
O Homem paga o táxi.
	               ROZA
	               O quê? Chico, tu tem que sair daí agora.
	               CHICO
	               Responde. Tu tá tomando pílula? Pílula
	               anticoncepcional?
	               ROZA
	               E aí? Pega a minha bolsa e sai daí, Chico.
	               
	               CHICO
	               Tu tomou uma hoje de manhã, terça. Por que tu tá
	               tomando pílula? Tu tá grávida.
Pausa.
	               CHICO
	               Tu não tá grávida?
O táxi parte. Inácio, na porta do prédio, procura as chaves.
	               ROZA
	               Pode ser. Pára com essa conversa e me escuta. Pega
	               a minha bolsa e sai daí, correndo. Agora.
	               CHICO
	               Como, pode ser? Tá ou não tá?
	               ROZA
	               Acho que não estou.
	               CHICO
	               Não está ou pode ser?
	               ROZA
	               Não estou. Me escuta...
	               CHICO
	               Não está?
	               ROZA
	               Eu descobri que não estava, agora de manhã.
	               CHICO
	               E já está tomando pílula?
	               ROZA
	               É. Não.
	               CHICO
	               Fala a verdade, uma vez na vida.
	Inácio abre a porta do prédio, tem alguma dificuldade com as
	malas.
	               ROZA
	               Eu menti. Menti que estava grávida. Não quero mais
	               mentir pra ti, mas ontem eu menti. Eu não estou
	               grávida.
	               CHICO
	               Por quê?
	               ROZA
	               Não estou porque não estou.
	               CHICO
	               Por que tu mentiu?
Inácio e a Mulher entram no prédio.
	               ROZA
	               Eu queria que tu fosse embora. Agora cala a boca e
	               me escuta! Essa casa não é minha. Era emprestada.
	               Eu estou aqui na frente, o dono está chegando, já
	               entrou no prédio, deve estar entrando em casa.
	               Pega a minha bolsa e te manda daí agora!
A porta do prédio se fecha.
	               CHICO
	               Tu é louca! Tu não tinha outro jeito de me mandar
	               embora? Tinha que dizer que estava grávida e que o
	               filho podia ser meu?
	               ROZA
	               Eu disse para tu ir embora, tu não foi. E disse
	               que o filho não era teu.
	               CHICO
	               Disse que achava que não era.
	               ROZA
	               Pois então?
	               CHICO
	               Se achava que não era, podia ser.
	               ROZA
	               Não interessa. Eu não estou grávida. O Inácio vai
	               te pegar aí, tu não tá entendendo? Pega a minha
	               bolsa e sai!
	               CHICO
	               Tu é louca. Tu é completamente louca. Tu acha que
	               pode fazer isso com as pessoas, dizer que elas vão
	               ter um filho, depois dizer que não, depois dizer
	               que sim e dizer que não outra vez?
	               ROZA
	               Eu gosto de ti. Eu gosto muito de ti, Chico. Gosto
	               de verdade, Chico. Eu juro! Eu não vou mais mentir
	               para ti. Mas sai daí agora! O dono do apartamento
	               tá entrando. Ele não sabia que eu estava usando o
	               apartamento, nem sabe que eu tenho a chave. Ele
	               vai te matar. Sai daí agora!
	               CHICO
	               O leite.
	               ROZA
	               Chico, eu te amo.
	               CHICO
	               Vai te fuder!
Chico bate o telefone.
CENA 72 - COZINHA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/DIA
O leite está subindo, vai derramar.
CENA 73 - SALA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/DIA
Na sala, gira o trinco da porta.
CENA 74 - COZINHA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/DIA
Chico, na cozinha, desliga o leite.
CENA 75 - SALA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/DIA
	A porta se abre. Inácio e a Mulher entram na sala. Largam as
	malas. Inácio fecha a porta, tranca a correntinha. A Mulher tira
	o casaco.
CENA 76 - QUARTO DE ROZA - INTERIOR/DIA
	No quarto, Chico, pega a bolsa de Rosa. Enfia as meias e os
	tênis. Escuta as vozes.
	               MULHER (OFF)
	               Tu deixou leite no fogão?
	               INÁCIO (OFF)
	               Deixei? Pode ser.
	               MULHER (OFF)
	               Ai!
	               INÁCIO (OFF)
	               O que foi?
	               MULHER (OFF)
	               Tá quente.
	               INÁCIO (OFF)
	               O quê?
	               MULHER (OFF)
	               A leiteira. Tá fervendo.
CENA 77 - SALA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/DIA
Mulher olha para dentro da casa.
	               MULHER
	               Tem alguém aí?
	               INÁCIO
	               Não, claro que não.
	               MULHER
	               Mas alguém saiu daqui faz pouco.
	               INÁCIO
	               Que estranho.
Inácio caminha para o quarto.
CENA 78 - QUARTO DE ROZA - INTERIOR/DIA
	Inácio entra no quarto. Vazio. A cama está desarrumada. Ele corre
	e arruma rapidamente a cama. A mulher entra no quarto.
	               MULHER
	               Quem mais tem a chave?
	               INÁCIO
	               Minha mãe. Mas ela quase nunca vem aqui. Só se
	               veio limpar.
Mulher vê um celular sobre a cômoda. Pega.
	               MULHER
	               De quem é esse celular?
	               INÁCIO
	               Deixa eu ver.
Inácio pega o celular.
	               INÁCIO
	               É o meu. Onde estava?
	               MULHER
	               Estava aqui. Tu não disse que tinha perdido?
	               INÁCIO
	               Tinha. Procurei pela casa toda.
	               MULHER
	               Sei.
	               INÁCIO
	               Que estranho.
	               MULHER
	               Muito estranho. Eu te liguei várias vezes, tu não
	               atendeu e depois me disse que tinha perdido o
	               celular. E ele estava bem aqui.
	               INÁCIO
	               Não sei como. Será que estava com a minha mãe?
	Mulher tira os sapatos e joga para baixo da cama, quase acertando
	Chico que, com a bolsa na mão, está de olhos fechados.
	               INÁCIO (OFF)
	               Quer tomar alguma coisa?
	               MULHER (OFF)
	               Um banho.
Inácio se aproxima dela. Chico abre os olhos.
	               INÁCIO (OFF)
	               Depois.
	               MULHER (OFF)
	               Não, estou suada.
Inácio puxa a Mulher para a cama.
	               INÁCIO (OFF)
	               Melhor.
	               MULHER (OFF)
	               Ai...
	               INÁCIO (OFF)
	               Tira isso.
As roupas dos dois vão caindo no chão. Camisas, saia, calça.
	               MULHER (OFF)
	               Calma.
	               INÁCIO (OFF)
	               Vem aqui...
	               MULHER (OFF)
	               Ai...
	               INÁCIO (OFF)
	               Olha só como eu estou.
	               MULHER (OFF)
	               Hummm.
	               INÁCIO (OFF)
	               Vem.
	               MULHER (OFF)
	               O que é isso?
	               INÁCIO (OFF)
	               O quê?
	               MULHER (OFF)
	               De quem é esse sutiã, Inácio?
	               INÁCIO (OFF)
	               Não é o seu?
Chico fecha os olhos.
	               MULHER (OFF)
	               Claro que não. Vai dizer que é da sua mãe.
	               INÁCIO (OFF)
	               Não. Não sei.
	               MULHER (OFF)
	               Tem uma mulher dormindo aqui?
	               INÁCIO (OFF)
	               Claro que não. Imagina.
	               MULHER (OFF)
	               Imaginar o quê? Leite quente no fogão, o celular
	               que tu disse que tinha perdido, um sutiã na cama.
	               INÁCIO (OFF)
	               Eu não sei. Não sei mesmo.
	               MULHER (OFF)
	               Tá bom.
	               INÁCIO (OFF)
	               Onde é que tu vai?
	               MULHER (OFF)
	               Vou tomar um banho.
A mulher joga o sutiã no chão e sai. Chico abre os olhos.
	               INÁCIO (OFF)
	               Vem cá.
	               MULHER (OFF)
	               Me deixa.
	Inácio, de cueca e camiseta, senta na cama. Pega o sutiã e joga
	para baixo da cama. Som do chuveiro sendo ligado. Inácio vai até
	o banheiro, entreabre a porta.
	               INÁCIO
	               Talvez eu tenha esquecido o telefone na minha mãe,
	               ela veio trazer, esquentou o leite. Talvez ela
	               tenha dormido aqui.
	               MULHER (OFF)
	               Sei. E tua mãe usa aquele sutiã.
	               INÁCIO
	               Pode ser de uma amiga.
	               MULHER (OFF)
	               Claro. Tua mãe é sapata, por acaso? Quer fazer o
	               favor de fechar a porta? Tá frio.
	Ele fecha a porta. Aciona a secretária eletrônica e veste as
	calças. Inácio vai até a sala. A secretária transmite os recados.
	               Recado 1:
	               (voz da Mulher) Inácio. Ináaacio. Sou eu. Oi? Já
	               saiu? Estou na porta do prédio já faz quinze
	               minutos. Alô? Que saco!
	               Recado 2:
	               (voz de Roza) Inácio, sou eu, a Roza, com Z.
	               Lembrou? Da praia. Alô? Alô...
	Inácio, com uma faca de pão na mão, surge na porta, escuta o
	recado.
	               Recado 3:
	               (voz de Roza) Alô. Inácio, sou eu de novo, a Roza,
	               da praia. Oi? Quero devolver a televisão. Tu
	               esqueceu o seu celular comigo, quero devolver
	               também. Alô?
	Inácio corre e baixa o volume da secretária. Olha para a porta do
	banheiro, senta na cama e ouve os recados.
	               Recado 4:
	               (voz de mulher) Sou eu meu filho. Tu já voltou? Me
	               liga quando chegar.
	               Recado 5:
	               (voz de Roza) Chico! Chico acorda! Atende Chico!
	               Chico! Tu tem que sair daí agora! O dono do
	               apartamento tá chegando. Chico! Sai daí, rápido!
	Inácio se ergue, assustado, faca do pão na mão em posição de
	ataque. Dá uma olhada em torno e fixa-se no armário. Aproxima-se
	do armário. Aproxima o ouvido do armário. Escuta. Afasta-se um
	pouco. Abre a porta do armário. Nada, só roupas.
	Inácio examina o quarto, olha para a cama. Vai se abaixando, faca
	em punho. Ajoelha-se. A mulher, secando-se, sai do banheiro.
	               MULHER
	               O que foi?
	               INÁCIO
	               Nada. Uma barata.
	               MULHER
	               E tu vai matar a barata com a faca do pão.
	               INÁCIO
	               Não. Só estou olhando.
	Ela acende um cigarro, larga a toalha e sai. Inácio se abaixa
	perto da cama, faca em punho.
Ele dá um grito e olha sob a cama.
	               INÁCIO
	               Há!
	Não há ninguém embaixo da cama. Inácio vê um bilhete amassado no
	chão.
CENA 79 - SALA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/DIA
	A mulher, nua, fumando, entra na sala. Dá de cara com Chico, com
	a bolsa e sutiã na mão, perto da porta.
	               CHICO
	               Bom dia.
	               MULHER
	               Aaaaah!
CENA 80 - QUARTO DE ROZA - INTERIOR/DIA
	Inácio, que estava tentando pegar o bilhete ergue-se rapidamente
	e bate a cabeça na cama.
CENA 81 - SALA DO AP. DE ROZA - INTERIOR/DIA
	Chico tenta abrir a porta, mas ela está trancada com a
	correntinha. A mulher grita.
	               MULHER
	               Aaaaaaah!
	Chico fecha a porta, tira a correntinha, abre a porta e sai
	correndo.
Inácio surge na sala, de faca na mão. Mulher aponta para a porta.
	               MULHER
	               Aaaaaaaaah!
	               INÁCIO
	               Aaaaaaah!
CENA 82 - CORREDOR - INTERIOR/DIA
	Inácio sai para o corredor, a Mulher o segue. Chico desce as
	escadas, voando. A Mulher sai ao corredor para acender a luz.
	Inácio vê Chico descendo as escadas e chama o elevador. A porta
	do apartamento bate. A Mulher tenta abrir, mas a porta não abre
	por fora.
	               MULHER
	               Cadê a chave?
	               INÁCIO
	               Lá dentro.
	               MULHER
	               Aaaaaaaah!
	               INÁCIO
	               Calma. Eu te dou minha roupa!
Ele tira a calça.
	               MULHER
	               Aaaah!
	               INÁCIO
	               Fica quieta!
	A luz do corredor se apaga. TRÊS GAROTAS abrem a porta do
	elevador e vêem Inácio sem calça, de faca na mão, e a Mulher nua.
	               TRÊS GAROTAS
	               Aaaaahhh!
	               MULHER
	               Aaaaaah!
	               INÁCIO
	               Aaaaaaah!
CENA 83 - CALÇADA - EXTERIOR/DIA
	Chico, de bolsinha e sutiã na mão, sai do prédio correndo. Ouve
	uma sirene. Chico diminui o passo, enfia o sutiã na bolsinha e a
	bolsinha no braço, disfarça. Um camburão chega. DOIS POLICIAIS
	descem correndo e entram no prédio.
	Chico vê o orelhão. Olha em volta. Ninguém. Chico se afasta
	caminhando.
CENA 84 - ÔNIBUS - EXTERIOR/DIA
O ônibus Tristeza se aproxima e pára. Chico sobe no ônibus.
	               JUCA (OFF)
	               Quando foi isso?
	               CHICO (OFF)
	               Faz mais de um mês.
CENA 85 - BAR COQUINHO - EXTERIOR/DIA
Juca come batatinhas fritas. Há dois copos vazios sobre a mesa.
	               JUCA
	               E ela te ligou a troco de quê?
	               CHICO
	               Quer conversar. E quer a bolsa.
	               JUCA
	               Tem dinheiro na bolsa?
	               CHICO
	               Tem um pouco.
	               JUCA
	               Então ela vem. Ela disse "eu te amo"?
	               CHICO
	               Disse.
	               JUCA
	               E tu disse "vai te fuder".
	               CHICO
	               Disse.
	               JUCA
	               Legal. Tu não é tão idiota como eu pensava.
	               CHICO
	               Sou mais idiota do que eu pensava. Sabe o que eu
	               devia ter dito?
	               JUCA
	               O quê?
	O GARÇOM (o HOMEM da cena 1) chega, põe dois copos de suco na
	mesa. Chico se aproxima de Juca.
	               CHICO
	               Eu também te amo.
O Garçom fica olhando para Juca.
	               JUCA
	                (para o Garçom) O senhor podia trazer a nossa
	               continha?
O Garçom sai, levando os copos vazios.
	               JUCA
	               Tu acha que ela vem?
	               CHICO
	               Foi ela que ligou. Disse que vinha.
	               JUCA
	               Pelo menos dois sucos ela vai nos pagar. Dá aqui
	               esta bolsa.
Juca pega a bolsa.
O Garçom chega com a nota.
	Juca abre a bolsinha, tira a presilha de cabelo, o sutiã, o
	isqueiro cor-de-rosa, pega o dinheiro. O Garçom fica olhando para
	a bolsinha de Juca. Juca mantém a pose e paga.
	               JUCA
	               Pode ficar com o troco.
O Garçom pega o dinheiro e sai.
	               JUCA
	               Chico, essa guria tem um irmão para criar, dá para
	               qualquer um por quinhentos reais, roubou o teu
	               amplificador e fica grávida toda quarta-feira.
	               CHICO
	               Eu sei. Mas eu te juro que se ela disser que me
	               ama eu caso com ela.
	               JUCA
	               Por quê?
	               CHICO
	               Ela guardou a ficha do flíper.
	               ROZA (OFF)
	               Chico.
	               CHICO
	               Oi.
	               ROZA
	               Oi.
	               CHICO
	               Esse é o Juca.
	               ROZA
	               Eu sei.
	               JUCA
	               Já sei. Tu tá grávida!
	               CHICO
	               Juca, não enche o saco.
	               JUCA
	               Olha, eu vou ao banheiro, rapidinho, se ela ficar
	               grávida nesse meio tempo vocês não digam nada pro
	               garçom, que aqui a consumação é cinco por pessoa
	               ele pode querer cobrar da criança.
Juca sai. Roza senta.
	               ROZA
	               Chico, eu...
	               CHICO
	               Desculpa.
	               ROZA
	               Desculpa por quê?
	               CHICO
	               Por aquele dia. Eu fiquei louco, desculpa. Uma
	               hora eu ia ter um filho, meia hora depois não ia
	               mais, fiquei louco. É estranho, mas eu estava
	               achando legal ter um filho. Mesmo que isso fosse
	               abagunçar completamente a minha vida, eu estava
	               achando legal ter um filho. Um filho contigo.
	               ROZA
	               Chico...
	               CHICO
	               Desculpa.
	               ROZA
	               Eu estou grávida.
Roza fica olhando para ele e sorri.
CENA 85A - ECOGRAFIA
Um bebê se mexe na barriga da mãe.
CENA 85B - TABLE-TOP
	Notícia de jornal: "Pílulas Falsas Geram Processo". Foto de Roza
	e Chico.
CENA 85C - PORTA DE QUARTO DE HOSPITAL - INTERIOR/DIA
	Mão de Chico pendura na porta os sapatinhos cor-de-rosa que
	encontrou no bric.
CENA 85D - TABLE-TOP
	Notícia de jornal: "Laboratório vai pagar indenização". Foto de
	Roza, Chico e Bebê.
CENA 86 - PRAIA - EXTERIOR/DIA
	Chico abre um sorriso. Ergue uma máquina fotográfica e bate um
	flash.
Roza, com uma Menina no colo, posa para a foto.
	               CHICO (OFF)
	               Desta vez era verdade. Eu errei nos patos e
	               conheci a Roza.
	O irmão de Roza com a Menina no colo. Juca com a menina no colo
	mostra uma manchete de jornal
	               CHICO (OFF)
	               O laboratório vendeu pílulas de farinha e a Roza
	               ficou grávida.
Juca e Roza com a menina no colo.
	               CHICO (OFF)
	               A gente processou o laboratório e eles vão pagar
	               uma mesada para a Margarida até ela completar
	               dezoito anos.
A menina sozinha.
	Chico e Roza fazem caretas para provocar o riso do bebê. HOMEM
	(da cena 1, GARÇON da cena 85) passa ao fundo caminhando pela
	praia.
	               CHICO (OFF)
	               Acho que até lá eu arrumo um emprego.
Homem cai num buraco, uma armadilha igual a da cena 1.
	Chico e Roza ajudam o Homem a se erguer. O Homem resmunga e vê
	Juca. Juca fica duro, tentando não rir. Garçon reconhece Juca.
	Brigam. O bebê assiste a briga.
FIM
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	(c) Jorge Furtado, 2001-2002
	Casa de Cinema de Porto Alegre
	http://www.casacinepoa.com.br
	15/03/2001
| Anexo | Tamanho | 
|---|---|
| houve1.txt | 94.49 KB |