Roteiro em modo texto: [ Download ]
LUNA CALIENTE (CAP. 4)
microssérie em 4 capítulos
roteiro de Jorge Furtado,
Carlos Gerbase
e Giba Assis Brasil
a partir da novela homônima de
Mempo Giardinelli
versão de 11/08/1998
produção: Casa de Cinema de Porto Alegre
para TV Globo
***********************************************************
PRIMEIRO BLOCO
CENA 102 - INT/DIA - DELEGACIA / SALA DE MONTEIRO
Ramiro permanece sentado em sua cadeira, no centro do escritório
de Monteiro. À sua frente, de pé, o caminhoneiro o encara. Ao
lado da porta, Monteiro observa os dois.
Ramiro olha rapidamente para Gomulka que, de pé ao seu lado, faz
cara de quem não está entendendo nada. Ramiro resolve encarar o
caminhoneiro.
MONTEIRO
(para o caminhoneiro, insistindo) Conhece este
homem?
O caminhoneiro olha para Monteiro e depois, meio envergonhado,
para Ramiro. Ramiro levanta o olhar e encara-o com ar superior. O
caminhoneiro encolhe-se, hesita.
CAMINHONEIRO
Não tenho certeza.
MONTEIRO
(para Ramiro) Fique de pé, por favor.
Ramiro levanta-se. Monteiro fecha a porta e volta até a sua mesa.
MONTEIRO
Dê uma volta na cadeira.
GOMULKA
Inspetor, o senhor pode me explicar o que está
acontecendo?
Monteiro senta-se, calmamente.
MONTEIRO
Segundo o depoimento do seu cliente, o doutor
Bráulio deixou-o em casa, às quatro horas. Mas
o senhor João Pedro aqui (apontando) passou
pela ponte de Resistência às cinco,
provavelmente pouco depois que o seu carro,
doutor Gomulka, caiu no rio.
GOMULKA
E o que o meu cliente tem a ver com isso?
MONTEIRO
O senhor João Pedro declarou que deu carona a
um homem, da ponte até a cidade. (lendo um
papel sobre a mesa) Um homem moreno, de mais
ou menos quarenta anos.
GOMULKA
Então isso é uma acareação? O senhor sabe que
o meu cliente pode se negar a isso.
MONTEIRO
Sim, doutor Gomulka. O seu cliente pode se
negar a isso, se achar que vai ser
incriminado. (para Ramiro) É sua a escolha.
Ramiro olha para Monteiro, depois para o caminhoneiro e por fim
para Gomulka.
RAMIRO
Tudo bem.
Ramiro caminha, pausadamente, em volta de sua cadeira. O
caminhoneiro observa-o. Ao passar por ele, Ramiro mantém o olhar
erguido.
MONTEIRO
Agora o reconhece?
CAMINHONEIRO
É parecido, senhor, mas a verdade é que... não
tenho certeza. Estava muito escuro e eu vinha
distraído.
MONTEIRO
Mas ele não esteve sentado mais de meia hora
ao seu lado?
CAMINHONEIRO
(nervoso, amassando o chapéu com as mãos) Quem
sabe se o moço falasse...
MONTEIRO
(para Ramiro) Fale alguma coisa, por favor.
RAMIRO
(escolhendo as palavras) Não sei o que quer
que eu diga, inspetor. (olhando fixo para o
caminhoneiro) Eu nunca vi este homem em toda a
minha vida e não estou compreendendo o que o
senhor deseja.
O caminhoneiro olha para Ramiro, nervoso. Monteiro observa os
dois.
MONTEIRO
E então?
CAMINHONEIRO
Não, senhor, a pessoa que levei era um gringo,
acho que um paraguaio. O moço é parecido, mas
fala brasileiro.
MONTEIRO
O senhor Bernardes viveu na Europa, certamente
fala outra língua...
RAMIRO
Je parle français, inspecteur. É a língua que
se fala em Paris, onde eu morei.
Monteiro levanta-se, dirigindo-se ao caminhoneiro.
MONTEIRO
Esqueça o jeito que ele fala. Diria que é a
pessoa que levou ou não?
CAMINHONEIRO
Pois... me parece que era de outra condição.
Este senhor...
MONTEIRO
Era de madrugada, ele devia estar sujo,
cansado... Você só precisa dizer se o
reconhece ou não. Não tenha medo.
O caminhoneiro, cada vez mais nervoso, olha para Monteiro e para
Ramiro, indeciso.
CAMINHONEIRO
Olha, senhor, eu não... eu acho... (balançando
a cabeça) Sinceramente...
MONTEIRO
(interrompendo) Tudo bem. Você não precisa dar
uma resposta agora. Você será chamado a depor
mais tarde, no inquérito.
Ramiro, aliviado, olha para Gomulka, que reage. O caminhoneiro,
ainda confuso, coloca o chapéu na cabeça e prepara-se para sair.
GOMULKA
Isso é altamente irregular, inspetor. O senhor
sabe que não pode fazer uma coisa dessas. Se
isso fosse um interrogatório formal, se nós
estivéssemos na presença de um juiz...
Ramiro tira do bolso a carteira de cigarros. Pega um cigarro,
bate-o duas vezes na mesa. Antes de colocá-lo na boca, pára, como
se percebesse alguma coisa. Olha com o canto do olho para o
caminhoneiro.
INSERT DA CENA 49 - EXT/NOITE - CAMINHÃO
Ramiro põe a mão no bolso e tira um cigarro. Distraidamente, bate
duas vezes com o cigarro no painel do caminhão.
VOLTA PARA CENA 102 - INT/DIA - DELEGACIA / SALA DE MONTEIRO
O caminhoneiro está olhando para Ramiro, reconhecendo-o.
MONTEIRO
Eu conduzo o inquérito, advogado. (para o
caminhoneiro) Pode ir embora. Você será
procurado em breve. Obrigado.
Ramiro olha para o inspetor, e percebe que ele não percebeu nada.
Volta a olhar para o caminhoneiro. O caminhoneiro, humildemente,
baixa a cabeça e vai embora.
CAMINHONEIRO
Com licença...
Monteiro conduz o caminhoneiro até a porta. Abre-a. Gomulka olha
para Ramiro, sem entender a sua inquietação. O caminhoneiro sai.
Parado junto à porta aberta, Monteiro volta-se para Gomulka.
MONTEIRO
O senhor também pode ir embora, advogado. Seu
cliente agora está aos cuidados da polícia.
Gomulka balança a cabeça afirmativamente. Depois, olha para
Ramiro e bate-lhe amigavelmente no ombro.
GOMULKA
Boa sorte. Te vejo amanhã.
Ramiro concorda com a cabeça, preocupado.
CENA 103 - INT/DIA - DELEGACIA / SALA DE IDENTIFICAÇÃO
A carteira de identidade de Ramiro é depositada em uma caixinha
de metal.
Ramiro tira o relógio do pulso e entrega-o para o policial
Oliveira, à sua frente na sala de identificação. Oliveira coloca
o relógio dentro da caixinha e faz um sinal indicando a cintura
de Ramiro.
O cinto de Ramiro é retirado das calças. Ramiro entrega-o a
Oliveira.
Um cordão de sapato é puxado, soltando-se do último furo. Ramiro
entrega dois cordões de sapato a Oliveira.
As mãos de Ramiro, espalmadas, encostam-se na parede, a três
palmos de distância uma da outra. Ramiro está de costas, pernas
abertas, as mãos na parede, e Oliveira se abaixa para revistá-lo.
Na caixinha de metal, uma carteira de couro é colocada sobre os
demais objetos de Ramiro.
Pequenos números de madeira são colocados em seqüência dentro de
um pequeno trilho, formando uma data:
17-1-1970
Ramiro, ar perplexo, posiciona-se frente a um fundo preto,
olhando para a frente. Como que por reflexo, sua boca tenta
esboçar um sorriso, a que o rosto inteiro não corresponde.
Um flash congela a expressão de Ramiro.
CENA 104 - INT/NOITE - DELEGACIA / CELA E CORREDOR
Ramiro está sentado, sem sapatos, cabeça baixa, a um canto do
chão de cimento de uma cela escura e pequena, mas de teto bem
alto. A seu lado, uma pequena cama simples, com um lençol sujo. A
luz vem de uma vigia gradeada, na parte de cima da parede.
As paredes da cela têm manchas de umidade, e algumas palavras e
desenhos pouco identificáveis riscados a carvão.
De repente, ouve-se um ruído brusco, uma porta de ferro sendo
aberta, a uma certa distância. Ramiro levanta o olhar. Ouve a voz
frágil e assustada de um preso.
PRESO (FQ)
O que é isso? Pra onde vocês estão me levando?
Ramiro ergue-se, ficando de pé na cela.
PRESO (FQ)
Eu já disse que eu não sei onde eles estão.
Por que vocês não me deixam dormir?
Ramiro corre até a porta da cela, que possui uma pequena abertura
retangular quase junto ao chão. Ramiro agacha-se e olha pela
abertura, tentando espiar para fora.
No corredor escuro, um PRESO vem vindo arrastado pelos ombros por
DOIS GUARDAS. Ao passar pela cela de Ramiro, o preso procura
auxílio com os olhos, e sua voz vai ficando mais desesperada.
PRESO
Por favor, alguém me ajude. Alguém pode me
dizer que dia é hoje?
Ramiro, com ar de pavor, enfia o rosto na vigia gradeada,
tentando acompanhar a trajetória do preso corredor afora.
PRESO
Eu preciso voltar pro meu trabalho, pra minha
casa. Eu já disse que eu não sei onde eles
estão. Por que vocês não param com isso?
A silhueta dos três chega ao fim do corredor, onde se abre uma
porta para algum lugar mais iluminado.
PRESO
(gritando) Não! Eu não quero voltar lá! Vocês
não podem fazer isso comigo. Assassinos!
Assassinos! Assassinos!
O preso é arrastado pelos policiais através da porta, que se
fecha atrás deles, com um estrondo.
Ramiro ainda fica com o rosto colado à abertura, tentando ver
alguma coisa. Mas a porta permanece fechada. Os gritos que
continuam vindo de lá não são mais identificáveis.
Ramiro afasta-se da porta e fica parado, encostado à parede, sem
saber o que fazer. Ouve um berro apavorante.
Depois, um rádio tocando música bem alta.
Ramiro olha em volta. A música parece entrar pelas paredes da
cela. Ramiro coloca as duas mãos nos ouvidos, mas a música
continua.
Sempre com as mãos apertando os ouvidos, Ramiro escorrega as
costas pela parede até cair no chão, enquanto seu rosto se
contrai de dor. Ramiro aperta os olhos e começa a chorar,
enquanto fala baixinho, como que para si mesmo.
RAMIRO
Eu não sou um assassino. Eu não sou um
assassino...
FADE OUT
CENA 105 - INT/NOITE - DELEGACIA / CELA
FADE IN
Ramiro está deitado na cama da cela, encolhido. Sua cabeça está
entre as mãos, os olhos fechados. A música agora é outra, mas
continua soando através das paredes.
De repente, Ramiro abre os olhos, assustado. Ouve passos no
corredor.
Ramiro senta-se na cama, as costas apoiadas na parede da cela.
Esfrega os olhos com as mãos, com força. Os passos aproximam-se.
Ruído na tranca da porta. Ramiro põe-se de pé.
A porta se abre. Aparece um GUARDA, armado, que dá passagem ao
Policial 1.
POLICIAL 1
Me acompanhe, por favor.
RAMIRO
Para onde?
MONTEIRO
O senhor já vai descobrir.
Ramiro caminha para a porta, lentamente. Passa pelo policial e
pelo guarda, sai da cela.
CENA 106 - INT/NOITE - DELEGACIA / CORREDOR
Ramiro chega ao corredor, escoltado pelo guarda e pelo policial
1. Monteiro está esperando por ele, à frente de uma porta.
MONTEIRO
Boa noite.
RAMIRO
Por enquanto a noite está muito agradável.
Ouvi gritos na cela ao lado. E depois uma
música alta. A sua delegacia não parece muito
discreta, inspetor.
MONTEIRO
(balançando a cabeça) Acho que eles vão
continuar a noite toda. Eu quero deixar claro
que eu sou contra este tipo de procedimento.
Eu sou um policial, não me envolvo com
política.
RAMIRO
Que política?
MONTEIRO
Eu não julgo ninguém. Meu trabalho é descobrir
criminosos e prendê-los. Só isso. Mas, o
senhor entende, eu também tenho que prestar
conta dos meus atos.
RAMIRO
Para quem?
MONTEIRO
O senhor já vai descobrir.
Aproximam-se da porta. Monteiro bate.
GAMBOA (FQ)
Entre.
Monteiro abre a porta.
CENA 107 - INT/NOITE - DELEGACIA / SALA DE GAMBOA
Monteiro e Ramiro entram na sala, que é muito bem arrumada,
contrastando com a sujeira e desorganização do resto da
delegacia. Uma prateleira com livros, um tapete. Poltronas de
couro, quadros na parede. Uma grande mesa de reuniões ao centro,
com cadeiras de espaldar alto.
De pé, de costas para Ramiro e Monteiro, examinando um livro na
estante, está o capitão GAMBOA, 35 anos, magro, terno e gravata
impecáveis.
MONTEIRO
Capitão... Esse é o doutor Ramiro.
Gamboa indica a mesa de reuniões e continua examinando o livro.
GAMBOA
Ele pode sentar, já cuido disso. E o senhor
pode sair, inspetor.
MONTEIRO
Capitão, se o senhor quiser a minha
participação no interrogatório...
GAMBOA
Sim?
MONTEIRO
Eu estou acompanhando o caso desde o início
e... Qualquer dúvida...
GAMBOA
Tenho certeza que o doutor Ramiro é uma pessoa
razoável. O senhor está dispensado.
Monteiro sacode a cabeça e sai, dando uma olhada para Ramiro, que
permanece de pé ao lado da mesa de reuniões.
GAMBOA
O senhor pode sentar.
Ramiro puxa uma cadeira e senta, cauteloso. Gamboa volta a
examinar o livro que tem nas mãos. Lê em voz alta.
GAMBOA
"A morte é o fato primeiro e mais antigo, e
quase me atreveria a dizer: o único fato. Tem
uma idade monstruosa e é sempiternamente
nova."
Ramiro acompanha a leitura de Gamboa, sem entender. Gamboa
recoloca o livro na estante, vem até a mesa e senta-se, de frente
para Ramiro.
GOMULKA
Não esperava encontrar Canetti numa biblioteca
de delegacia do interior.
Ramiro não diz nada.
GAMBOA
Sabe quem eu sou?
RAMIRO
Não tenho o prazer.
GAMBOA
Capitão Alcides Carlos Gamboa.
Ramiro escuta o nome mas não parece muito impressionado.
GAMBOA
Vamos colocar as coisas claramente. Você se
saiu muito bem com o caminhoneiro, mas nós
sabemos que você matou o doutor Tennembaun.
Ramiro vai responder, mas desiste.
GAMBOA
Ainda não temos como provar, mas isso é o de
menos. Quando nós queremos provar algo,
provamos e pronto. Não vá pensar que estamos
na França, doutor. Estamos num país em guerra,
uma guerra interna, mas sempre uma guerra,
correto?
RAMIRO
Eu não matei ninguém.
Gamboa tira do bolso um estojo de couro e coloca-o sobre a mesa.
Abre-o, tira papel e fumo, e começa a enrolar um cigarro.
GAMBOA
Meu querido doutor Bernardes, eu disse que eu
SEI que você matou Tennembaun. Não estou
fazendo suposições. Verdade que ainda não sei
por quê, mas, sinceramente, nem faço questão
de descobrir. Você sabe que, se eu quisesse
fazê-lo confessar... não ia ser difícil,
correto?
Ramiro tenta disfarçar o nervosismo. Arrisca.
RAMIRO
Vai me torturar, capitão? Pensei que esses
métodos eram só para os subversivos.
GAMBOA
(indiferente) Isso não é um assunto que eu
queira discutir com você. Não agora. O que
quero dizer é que... é uma pena que logo você
esteja envolvido neste crime.
RAMIRO
Por que "logo eu"?
GAMBOA
Porque se esperava muito de você. Neste país
estão faltando homens preparados e sem
contaminação ideológica.
RAMIRO
Que quer dizer com isso?
GAMBOA
Você não está sendo admitido na universidade
apenas por seus estudos, ou por seus títulos.
Atualmente, isso não é possível sem a
aprovação das Forças Armadas.
Gamboa oferece o cigarro que acabou de enrolar para Ramiro, que o
recusa com um gesto.
GAMBOA
Seus antecedentes são impecáveis. Este...
digamos, este incidente estraga tudo. Por isso
eu tenho uma porposta: se confessar, eu posso
ajudá-lo.
RAMIRO
(escolhendo as palavras) Eu não entendo. Se eu
fosse o assassino e confessasse, o que eu
ganharia?
Gamboa acende o cigarro e dá uma primeira tragada.
GAMBOA
Se confessar, podemos ajeitar as coisas.
Atenuá-las. Um crimezinho desses, você sabe,
acontece toda hora. Podemos encerrar o
processo por falta de provas. Na verdade, o
senhor está apenas sob prisão preventiva.
Podemos até mesmo desistir de processá-lo pela
morte do doutor Tennembaun.
RAMIRO
Eu não matei ninguém.
Gamboa levanta-se, fuma, fica de costas para Ramiro. Caminha até
a janela.
GAMBOA
Não me decepcione, Bernardes! Tudo o que tem
que fazer é confessar. Eu garanto que você sai
inteiro dessa. Pode retomar sua vida, assumir
seu posto na Universidade... Basta querer
colaborar conosco. Está claro?
RAMIRO
Claríssimo, capitão. Eu assino uma confissão,
mas ela é escondida em alguma gaveta. O senhor
encerra o processo e eu passo a ser
chantageado o resto da vida, trabalhando como
dedo-duro na Universidade. Se eu me recusar a
delatar os colegas, o senhor "encontra" a
confissão e eu volto pra cadeia. É isso?
Gamboa, ainda à janela, coloca o cigarro na boca e dá uma longa
tragada antes de responder.
GAMBOA
Veja, Bernardes. Nosso verdadeiro inimigo é
muito maior. Pequenas violências como a morte
desse doutor Tennembaun podem ser esquecidas.
Você não acha?
RAMIRO
(ajeitando-se no sofá) Não. (mudando de tom)
De qualquer forma, eu não matei o doutor
Bráulio. E também não sei se eu iria colaborar
com vocês.
GAMBOA
Isso nós veremos. Porque neste país, agora,
não há neutros.
Ramiro não responde. Gamboa volta-se para Ramiro, encarando-o.
GAMBOA
Então? Que me diz?
RAMIRO
Não sei o que espera que eu diga, capitão...
GAMBOA
Não vai confessar?
RAMIRO
Não tenho nada para confessar.
Gamboa balança a cabeça, decepcionado. Volta à janela e continua
fumando.
GAMBOA
É uma pena. Acho que você vai se arrepender.
CENA 108 - INT/NOITE - DELEGACIA / CELA
A música volta a soar através das paredes da cela. Em um canto da
parede, inscrições feitas com pedra, carvão, canivete: nomes de
pessoas, desenhos simples e quase pornográficos, palavras
desconexas.
Ramiro está deitado de costas na cama, olhando a parede, suando.
Coloca as mãos nos ouvidos, rola na cama. A música pára.
Silêncio.
Em seguida, um quadrilátero de luz é projetado no chão da cela,
através da abertura na porta. Ruídos no corredor. Ramiro ergue-se
na cama, olha na direção da porta.
Sombras no chão, ruídos de passos: guardas arrastando o preso,
movimento em sentido contrário ao da cena 104, mas agora sem
gritos, sem gemidos. A luz do corredor volta a apagar-se.
Ramiro volta a virar-se na cama, encolhendo-se e voltando o rosto
em direção à parede.
Silêncio. Ramiro sozinho na cela, a cama ao lado do chão de
cimento.
FADE OUT
CENA 109 - INT/DIA - DELEGACIA / CELA
FADE IN
Ramiro, deitado de costas sobre a cama na cela, de repente abre
os olhos, assustado. Ouve um ruído de passos no corredor.
RAMIRO
Elisa...
Ruído no trinco da porta. Ramiro senta-se sobre a cama, passa a
mão nos cabelos, tenta recompor-se.
A porta se abre. O policial 1 aparece no vão da porta.
POLICIAL 1
Visita pra você.
Ramiro ergue-se.
FIM DO PRIMEIRO BLOCO
SEGUNDO BLOCO
CENA 110 - INT/NOITE - DELEGACIA / SALA DE VISITAS
Uma sala pequena com uma única janela basculante. Com grades. A
janela dá para um corredor interno onde eventualmente passam
policiais.
Dora, sentada numa das duas cadeiras da sala, em frente a uma
mesa pequena, usa um vestido escuro e está sem maquilagem.
Carrega um pacote de papel. Ramiro entra e senta na outra
cadeira. Dora tenta sorrir, sem muito sucesso. Ramiro nem tenta.
DORA
Como você está?
RAMIRO
Mal.
DORA
Está precisando de alguma coisa?
RAMIRO
Sair daqui.
Ela tira uma fruta do saco de papel e mostra a ele. Guarda a
fruta e tira do saco um leque. Abre e abana-se. O leque tem um
desenho de motivos parisienses.
Dora cobre a boca com o leque e pisca rapidamente os olhos,
tentando fazer uma graça. Ele sorri. Ela põe o leque no saco.
Entrega-lhe o saco.
RAMIRO
Obrigado.
DORA
Precisa de mais alguma coisa que eu possa
trazer?
RAMIRO
Não, obrigado. Queria um fio dental, mas eles
não deixam entrar. Têm medo que eu me
enforque, ou enforque alguém. Já imaginou?
Enforcar alguém com um fio dental, com flúor.
Dora sorri. Ficam alguns segundos em silêncio.
DORA
O que foi que você fez, Ramiro?
Ramiro fica olhando para Dora. Suspira fundo.
RAMIRO
Você também acha que eu sou um assassino?
DORA
Não sei. Você está diferente.
RAMIRO
Eu já lhe disse, muita coisa aconteceu.
Dora fica observando Ramiro, em silêncio.
DORA
Você me contou uma vez que, quando seu pai
morreu, vocês foram passar uns tempos com uma
tia, numa fazenda.
RAMIRO
É. Era a colheita do algodão. Isso distraía a
minha mãe um pouco. Ela estava muito mal. Por
quê?
DORA
Você contou que, num fim de semana, você
precisou voltar à cidade, acho que para um
exame médico.
RAMIRO
Por que você lembrou disso agora?
DORA
Você passou em casa e viu que uma família de
gatos estava morando na cozinha.
RAMIRO
Você lembra disso?
DORA
Lembro.
RAMIRO
Dois gatos fugiram pela janela da cozinha
quando eu entrei, levei um susto.
DORA
Aí você viu uns gatinhos, filhotes recém
nascidos, morando embaixo do fogão.
Ramiro fica observando Dora.
RAMIRO
Entendi por que você lembrou disso agora.
DORA
Você fechou a janela e a porta da cozinha.
RAMIRO
(justificando-se) Eles tinham sujado a casa
toda.
DORA
Você deixou os gatinhos trancados na cozinha e
foi embora.
RAMIRO
O meu pai tinha morrido, eu não estava bem.
DORA
E vocês só voltaram um mês depois.
RAMIRO
Eu estava com muita raiva.
DORA
Você contou essa história para mais alguém?
Pausa.
RAMIRO
Não. Nunca. Só para você.
DORA
Como eles estavam?
RAMIRO
Quem?
DORA
Os gatinhos. Como eles estavam quando vocês
voltaram para a casa?
RAMIRO
Mortos, claro. Um mês...
DORA
Mortos como?
RAMIRO
Mortos. Mortos, que diferença faz?
DORA
Eles morreram onde? No chão? Quantos eram?
RAMIRO
Eram quatro, eu acho. Morreram no chão.
DORA
Estavam perto da janela? A janela que você
fechou?
RAMIRO
Estavam.
DORA
Quem encontrou? Quem abriu a cozinha?
RAMIRO
Minha mãe.
DORA
Tinha cheiro? Ou já estavam secos?
RAMIRO
Dora...
DORA
Tinha ou não?
RAMIRO
Tinha. Um cheiro insuportável. Mas já estavam
secos. Pareciam uns... pedaços de couro,
colados nas lajotas do chão. Tive que raspar
com uma espátula, para tirar.
DORA
E sua mãe? Ela não se perguntou como aqueles
gatos foram parar ali?
RAMIRO
Perguntou.
DORA
Perguntou para você?
RAMIRO
Perguntou.
DORA
E o que foi que você disse?
RAMIRO
Disse que eu não fazia idéia. Que talvez eu
tivesse fechado a janela, quando fui buscar as
roupas.
DORA
"Talvez"?
Dora fica em silêncio alguns segundos. O Policial 1 surge no
corredor, bate no vidro. Dora, com um gesto, pede ao policial 1
que lhe dê mais algum tempo. Ele mostra o relógio. Ela se
levanta.
DORA
Você me disse, ontem, que sua vida estava uma
confusão. Que tipo de confusão?
RAMIRO
O pior tipo.
DORA
Quer me contar?
RAMIRO
Não. Não posso.
Ela pára junto a porta.
DORA
Eu vou voltar para Paris hoje à noite.
RAMIRO
Eu sei.
DORA
Você não quer me dizer nada mesmo?
RAMIRO
Não posso.
DORA
Então... é isso?
Ramiro sacode levemente a cabeça.
DORA
Você fez alguma coisa...
Pausa. Ramiro pensa um pouco.
RAMIRO
Talvez.
DORA
Talvez?
RAMIRO
É. Talvez.
Dora observa Ramiro alguns segundo antes de abrir a porta e sair.
CENA 111 - INT/NOITE - DELEGACIA / CELA
A música soando através das paredes da cela. Através da janela,
por sobre o telhado do velho prédio da delegacia, um jato cruza o
céu estrelado, deixando um rastro iluminado pela grande lua
cheia.
Ramiro está deitado na cama, sem camisa, suando muito, olhando
para cima.
FUSÃO PARA:
CENA 112 - INT/DIA - DELEGACIA / CELA
Ramiro está deitado em sua cela, dormindo, posição um pouco
diferente da cena anterior.
A luz da cela é acesa e a porta se abre. Ramiro desperta. Senta
na cama. Policial 1 entra.
POLICIAL 1
Levante-se. O inspetor Monteiro quer falar com
o senhor.
Ramiro pega os seus sapatos e a camisa. Pega o leque parisiense
de Dora sobre a cama.
CENA 113 - INT/DIA - DELEGACIA / SALA DE MONTEIRO
A porta se abre e Ramiro entra, já de camisa, com o Policial 1
atrás. Em sua escrivaninha, Monteiro pega uns papéis, confere.
Indica a cadeira à sua frente.
MONTEIRO
Sente-se.
Ramiro obedece. Monteiro pega um saquinho, confere rapidamente,
entrega-o a Ramiro.
MONTEIRO
Veja se não falta alguma coisa.
RAMIRO
O que é isso?
MONTEIRO
Suas coisas. Você vai sair, mas antes quero
que saiba umas coisinhas.
RAMIRO
Encontraram o assassino?
Monteiro dá uma olhada para Ramiro.
MONTEIRO
O assassino é você. Não tenho nenhuma dúvida e
inclusive já sei por que fez aquilo. Na
verdade até o invejo. De certo modo, claro.
Monteiro ri.
RAMIRO
De que está rindo?
MONTEIRO
Você é um fenômeno, doutor.
RAMIRO
Por quê?
MONTEIRO
Você disse que sua mãe podia testemunhar que
sua volta para casa foi antes das quatro, não
é?
RAMIRO
Disse.
MONTEIRO
Pois a senhorita Elisa disse que você passou a
noite do crime com ela. E na cama dela.
Ramiro olha para Monteiro mas não diz nada.
MONTEIRO
Por isso eu disse que o invejava. Você é um
fenômeno... mas, para mim, continua numa
situação de merda. Os policiais do carro-
patrulha confirmaram que lhe viram com o
doutor Bráulio, às três e pouco. Mas ela disse
que você voltou para o quarto dela e que,
juntos, vocês viram o doutor Bráulio ir embora
com o Ford, completamente bêbado.
Pausa.
MONTEIRO
É claro que eu não acreditei numa só palavra,
mas é uma declaração assinada. Por enquanto,
você está salvo.
RAMIRO
Por enquanto?
Monteiro levanta-se.
MONTEIRO
Tenho um palpite que vamos voltar a nos ver.
Vamos embora.
Ramiro ergue-se.
CENA 114 - INT/DIA - DELEGACIA / RECEPÇÃO
Maria e Carmem estão sentadas num comprido banco de madeira,
recostadas na parede, em silêncio, chorosas, vestidas de preto.
Ao lado delas, Gomulka. De pé junto a uma janela, Elisa controla
a porta da guarda com um olhar langoroso, braços caídos, mãos
cruzadas sobre o púbis.
Ramiro chega, com Monteiro ao seu lado. Ao vê-lo, Elisa corre
para ele e se pendura no seu pescoço, beijando-o.
ELISA
Meu amor...
Carmen começa a chorar, assoando-se com um lencinho, e Gomulka
ergue-se como impulsionado por uma mola.
ELISA
Eu disse toda a verdade, meu amor, que ficaste
a noite inteira comigo e que estamos
apaixonados.
Maria aproxima-se, balançando a cabeça.
MARIA
Ramiro, que fizeste...
Gomulka olha para Ramiro com ar de desaprovação. Ramiro fica sem
saber o que dizer, com Elisa, muito feliz, pendurada no seu
pescoço.
FIM DO SEGUNDO BLOCO
TERCEIRO BLOCO
CENA 115 - INT/DIA - BAR LA ESTRELLA
Ramiro e Gomulka numa mesa do La Estrella. Tomam cerveja. Ramiro
encosta o copo de cerveja no pescoço, nas têmporas, tentando
atenuar o forte calor. Gomulka lê o código penal.
GOMULKA
(lendo) Sedução, artigo duzentos e dezessete:
Seduzir mulher virgem, menor de dezoito anos e
maior de catorze, e ter com ela conjunção
carnal, aproveitando-se de sua inexperiência
ou justificável confiança. Pena: reclusão, de
dois a quatro anos.
RAMIRO
Foi ela quem me seduziu, ela já declarou isso
à polícia.
GOMULKA
Ninguém acreditou.
Gomulka fecha o código penal, toma um gole de cerveja.
GOMULKA
Insanidade temporária. Estava quente demais,
você bebeu e comeu demais. Ela era gostosa
demais... Você enlouqueceu. Tudo isso é
atenuante.
RAMIRO
Atenuante de quê? Eu não cometi crime algum.
Gomulka sorri, observa Ramiro.
GOMULKA
Você acha que eu sou idiota, Ramiro?
RAMIRO
Você também não acreditou na minha história?
GOMULKA
Qual delas? Primeiro você me disse que o velho
pediu o carro emprestado e você não teve como
dizer não. Depois você me disse que o velho
acusou você de seduzir a filhinha dele, você
lhe deu uns tabefes, desceu do carro e ele
pegou a direção e se mandou. Agora você me diz
que estava na cama com a filhinha dele, ele
pegou a chave e se mandou. Em qual destas
histórias eu devo acreditar? Mais uma?
RAMIRO
Pode ser.
Gomulka faz sinal para o garçon, ergue a garrafa de cerveja.
GOMULKA
Você não quer me contar mesmo?
RAMIRO
Contar o quê?
GOMULKA
O que realmente aconteceu.
RAMIRO
Por quê?
Ao fundo, às costas de Ramiro e Gomulka, Braulito entra no bar.
Ele vê Ramiro e se aproxima, decidido.
GOMULKA
Sei lá. Porque eu sou seu amigo. Aliás, seu
único amigo. Porque eu sou seu advogado.
Porque você destruiu meu carro. Porque... ia
ser um alívio para você contar a verdade para
alguém.
Braulito dá um soco na cabeça de Ramiro, por trás. Gomulka ergue-
se, tentando segurá-lo. Braulito continua batendo, chutando,
socando, com raiva. Ramiro apenas se defende.
GOMULKA
O que é isso? Calma, Braulito. Pára, porra!
BRAULITO
Desgraçado, filho da puta!
Copos e garrafas caem pelo chão. O GARÇOM chega para separar os
dois.
GOMULKA
Calma, Braulito!
Gomulka e o garçom conseguem seguram Braulito. Ele continua
tentando chutar Ramiro.
GOMULKA
Te acalma, Braulito!
BRAULITO
Eu sei que foi você. Você matou meu pai!
Assassino, desgraçado. Eu vou te pegar! Seu
doutorzinho de merda!
GOMULKA
Calma, Braulito! Isso não resolve nada!
BRAULITO
Você acha que engana alguém? Você acha que me
engana?
Braulito se acalma um pouco.
BRAULITO
Acha que engana a Elisa?
Um estranho sorriso ilumina o rosto de Braulito.
BRAULITO
Você não conhece a Elisa.
O garçom arrasta Braulito para longe de Ramiro.
RAMIRO
Braulito, eu...
GOMULKA
Deixa, Ramiro...
BRAULITO
Você não sabe de nada.
O garçom arrasta Braulito para fora do bar.
BRAULITO
Eu tenho pena de você!
Gomulka junta do chão o código penal, pingando cerveja.
GOMULKA
Melhor sair daqui.
Gomulka faz um gesto ao garçom.
GOMULKA
Podia ver a nossa continha, por favor?
CENA 116 - EXT/DIA - RUA CALÇADA
Ramiro e Gomulka caminham pela calçada.
RAMIRO
Foi como você disse.
GOMULKA
Como é?
RAMIRO
O que aconteceu. Foi como você disse.
GOMULKA
O que foi que eu disse?
RAMIRO
Estava quente demais. Eu bebi e comi demais.
GOMULKA
Ela é gostosa demais...
RAMIRO
É. Eu enlouqueci. Mas nada disso é atenuante.
Pelo menos, não para mim.
GOMULKA
Ela te convidou para dormir lá?
RAMIRO
O pai dela. A mãe também. Eu não aceitei.
GOMULKA
Mas ficou.
RAMIRO
O carro afogou.
GOMULKA
O carro afogou? Não é possível, o carburador
daquele carro...
RAMIRO
Eu afoguei. De propósito.
GOMULKA
Ah...
RAMIRO
Não sei o que me deu. Ela estava na janela, me
olhando. Eu tinha bebido demais, estava quente
demais.
GOMULKA
Você enlouqueceu.
RAMIRO
É. Acho que sim.
GOMULKA
E aí?
RAMIRO
Aí eu fiquei para dormir. Ela deixou a porta
do quarto aberta. Estava quase nua.
GOMULKA
Ela é gostosa demais. Isso é atenuante.
RAMIRO
Eu achei que ela queria. E ela queria mesmo.
GOMULKA
Claro. Ela disse que sim, para a polícia.
Disse e assinou.
RAMIRO
Pois é. Só que, na hora...
GOMULKA
O que é que tem?
RAMIRO
Na hora, ela disse que ia gritar.
GOMULKA
Como é? Na hora assim... na hora mesmo?
RAMIRO
Na hora mesmo. A gente na cama. E ela disse
que ia gritar. Os pais dela ali do lado. Não
sabia o que fazer.
GOMULKA
E o que você fez?
RAMIRO
Tentei impedir, sei lá. Tapei sua boca. Não
sei.
GOMULKA
E aí?
RAMIRO
Aí, quando eu me dei conta, ela estava morta.
Gomulka pára.
GOMULKA
Como é?
RAMIRO
Ela estava morta. Pelo menos eu pensei que
estava. Acho que desmaiou, não sei. Parecia
morta. Completamente morta.
GOMULKA
Puta que o pariu!
RAMIRO
Pois é. Imagina a minha situação. Estupro e
assassinato. Que tal?
GOMULKA
O que você fez?
Recomeçam a caminhar.
RAMIRO
Fiquei desesperado. Só pensei em fugir dali.
Foi aí que encontrei o velho.
GOMULKA
Ele viu vocês?
RAMIRO
Não. Quer dizer, primeiro achei que sim.
Depois eu vi que não, ele só estava bêbado.
Depois achei que sim outra vez. Não sei. Acho
que ele viu.
GOMULKA
Vocês saíram?
RAMIRO
Saímos. Ele queria beber mais.
GOMULKA
E aí?
RAMIRO
A Elisa.
GOMULKA
Onde? Ela saiu com vocês?
RAMIRO
Não. Ali.
Elisa está sentada no muro da casa de Ramiro. Ela se ergue e se
aproxima pela calçada. Tem um leve ferimento no rosto.
ELISA
Oi.
RAMIRO
O que foi isso?
ELISA
Braulito. Ele encontrou você?
RAMIRO
(tocando a boca ferida) Encontrou.
ELISA
Ele está louco. Posso dormir na sua casa?
RAMIRO
Não acho uma boa idéia.
GOMULKA
Eu também não.
ELISA
Eu não tenho onde ficar.
RAMIRO
É melhor você ir para casa.
ELISA
Você me leva?
RAMIRO
Não tenho carro.
Ela olha para Gomulka.
GOMULKA
Minha irmã vai precisar do carro, é dela.
Ficam os três parados, em silêncio. Gomulka olha para o carro,
estacionado na frente da casa de Ramiro.
GOMULKA
Tudo bem... (pega a chave) Ramiro, pelo amor
de Deus...
RAMIRO
Não se preocupe.
GOMULKA
Não diga isso! Na última vez que eu te mandei
cuidar de um carro e você disse "não se
preocupe" ele acabou no fundo de um rio! (olha
para Elisa) Desculpa.
Gomulka entrega a chave a Ramiro.
GOMULKA
Ela vai precisar do carro às nove. Olha lá,
hein?
Elisa e Ramiro entram no carro.
RAMIRO
Gomulka...
GOMULKA
O quê?
RAMIRO
Obrigado.
Gomulka faz um gesto de "tudo bem". Ramiro liga o carro e se
afasta. Gomulka fica na calçada, preocupado.
FIM DO TERCEIRO BLOCO
QUARTO BLOCO
CENA 117 - EXT/CREPÚSCULO - FIAT / ESTRADA ASFALTADA
O Fiat da irmã de Gomulka cruza a estrada.
Dentro do carro, Ramiro dirige, com Elisa ao seu lado.
ELISA
Eu não quero ir para casa.
Elisa tenta levar a mão ao rosto de Ramiro.
ELISA
Ele te machucou.
Ramiro afasta a mão de Elisa com um tapa.
RAMIRO
Será que você não percebe que a cidade inteira
está falando de nós, que é melhor a gente
ficar bem longe um do outro? Eu vou te levar
para casa.
ELISA
(infantil) Não. Por favor. A mãe não pára de
chorar. Todo mundo me olha como se eu fosse
uma criminosa.
RAMIRO
Você mentiu pra polícia. Você é uma criminosa.
ELISA
(sorrindo) Eu? Tem certeza?
Ramiro olha para Elisa. Ela está linda. A saia, levantada acima
dos joelhos, deixa as pernas à mostra. Ramiro fraqueja, e Elisa
percebe. Ela movimenta-se no banco, aproximando-se dele. Ramiro
reage empurrando-a com o cotovelo.
RAMIRO
Fica aí, Elisa.
ELISA
Tudo bem.
Elisa volta a encostar-se na janela, mas puxa ainda mais a saia
para cima. Ramiro lança um olhar rápido, mas depois fixa olhar em
frente
RAMIRO
Elisa, nós precisamos esclarecer algumas
coisas.
ELISA
Sobre o quê?
RAMIRO
Sobre tudo que aconteceu. Aconteceram muitas
coisas.
ELISA
Eu não tenho nada para falar. Não quero falar.
RAMIRO
Por quê?
ELISA
Não quero porque não quero.
Elisa liga o rádio do carro, sintonizando uma estação que toca um
bolerão dramático.
Ramiro franze o cenho. Dirige em silêncio, atravessando o centro
da cidade. Ela se balança no banco, ao compasso da música.
RAMIRO
Afinal, onde te levo?
ELISA
Para onde você quiser. Vamos sair da cidade?
Lá fora às vezes é mais fresquinho
Elisa continua balançando-se, com as coxas à mostra. Ramiro faz o
carro contornar o trevo de acesso à estrada.
CENA 118 - EXT/NOITE - FIAT / ESTRADA ASFALTADA
Arredores da cidade. O carro passa por um mal iluminado
restaurante de caminhoneiros.
Depois, a estrada vazia. A noite está clara, a lua cheia domina o
céu. Ramiro dirige em silêncio. A música acaba e começa um
programa de notícias. Ramiro apaga o rádio.
Elisa volta a aproximar-se. Cola sua coxa na perna de Ramiro.
Desta vez, Ramiro não a empurra de volta.
ELISA
(sensual) Pára o carro.
RAMIRO
Não, hoje não. Sossega, tá?
Ramiro aperta o acelerador. O carro, mais veloz, faz uma curva
com alguma dificuldade. Ramiro está suando.
ELISA
(manhosa, meio rouca) Eu quero. Eu quero
agora.
Elisa coloca a mão esquerda sobre a perna de Ramiro.
RAMIRO
(sem a menor força) Tira a mão.
Elisa sorri e aperta a perna de Ramiro.
RAMIRO
Não, Elisa.
Ramiro respira fundo e retira a mão dela.
RAMIRO
Hoje eu não conseguiria, mesmo que quisesse.
Ficam algum tempo em silêncio. Ramiro dá uma espiada e vê que
Elisa faz beicinho, como se fosse chorar, os olhos tristes e
brilhantes.
RAMIRO
Não fica assim.
Elisa funga e olha para Ramiro.
ELISA
Você não gosta mais de mim?
Ramiro não responde. Fica alternando o olhar entre a estrada à
sua frente e Elisa. De repente, ela se aproxima e coloca outra
vez a mão sobre a coxa de Ramiro. Ramiro abre um pouco a boca,
como se procurasse ar. Respira fundo. Outra vez. O carro rasga a
estrada, que, iluminada pela lua, parece um caminho de prata.
Elisa, sempre com a mão na perna de Ramiro, lança-se sobre ele.
Começa a beijar-lhe o pescoço. Geme no seu ouvido. Ramiro fecha
os olhos por um instante.
O carro ziguezagueia.
Ramiro recobra o auto-controle e aperta o freio, ao mesmo tempo
que vira a direção para a direita.
O carro pára no acostamento, perto de uma cerca.
Ramiro empurra Elisa, ainda pendurada em seu pescoço. Ela resiste
um pouco, mas depois se afasta. Então, outra vez sorridente,
Elisa desliga os faróis e gira a chave na ignição, desligando o
carro.
ELISA
(rouca) Me faz, meu amor, me faz.
E mergulha sobre o ventre de Ramiro. Ele não resiste mais. Olha
para a frente e vê a lua. Depois, olha para baixo e vê as pernas
de Elisa, as coxas, o desenho da calcinha, que aparece na fenda
da saia entreaberta. De repente, Ramiro geme alto, como se
sentisse muita dor. Puxa a cabeça de Elisa com violência.
RAMIRO
O que você está fazendo? Quer me matar?
ELISA
Quero.
Ramiro a agarra pelos cabelos e começa a beijá-la. Os dois
parecem furiosos um com o outro. Mordem-se. Gemem. Ramiro, com um
movimento brusco, a puxa para o seu colo. Levanta a saia e baixa
a calcinha.
Ramiro a penetra. Ela grita alto e depois começa a chorar de
prazer.
ELISA
Meu amor. Meu amor...
Esfregam-se. Estreitam-se cada vez mais. Parecem dois animais. O
carro balança. Atingem o orgasmo juntos. O Fiat deixa de sacudir.
Iluminado pela lua, parece um bicho que recebeu um golpe mortal.
Passa um carreta carregada de toras de madeira, fazendo muito
barulho. Ramiro abre os olhos. Elisa continua montada nele, de
olhos fechados. Seus lábios ainda estão grudados no pescoço dele.
Os dois corpos estão muito suados. Ramiro olha a noite além do
pára-brisa.
Ramiro tenta afastar Elisa para pegar o maço de cigarros, preso
no cinzeiro do carro, mas ela se agarra nele.
ELISA
Não, não.
Começou a lamber seu pescoço e mover os quadris lentamente,
sensualmente. Ele ainda está dentro dela. Ramiro a segura com
força, impedindo-a de mexer-se.
RAMIRO
(em voz baixa) Elisa, você pensa que matei seu
pai, não é?
ELISA
E daí? Eu não quero falar. (infantil) Quero de
novo... Só mais um pouquinho...
E se move compassadamente, primeiro bem devagar, depois mais
rápido. Ramiro vai se entregando, mas ainda tenta resistir.
Agarra os pulsos de Elisa.
RAMIRO
Isso não pode continuar.
Ela dá um salto, furiosa, erguendo o torso, mas sem afastar as
virilhas. Bate com os punhos no peito dele e começa a cavalgá-lo
com violência.
ELISA
Eu quero mais. Mais!
Ramiro a empurra com toda força, lançando-a para o outro banco,
contra a porta. Elisa se agarra no banco com uma das mãos, no
retrovisor com a outra, e torna a erguer-se.
Por um momento, ele pode ver os olhos dela desorbitando e um
pequeno fio de sangue que lhe escorre da boca. Elisa respira
fundo. Outra vez, parece uma criança.
ELISA
Você me bateu...
RAMIRO
Eu não queria.
ELISA
Mas você bateu. Bateu sim.
Uma lágrima escorre pelo rosto de Elisa. Em silêncio, lentamente,
ela volta a sentar no colo de Ramiro. Olha no fundo dos olhos
dele.
Num gesto rápido, abaixa uma das mãos e "encaixa-se" outra vez.
Ramiro geme. Elisa sorri, diabólica. Arrebenta os botões da
camisa de Ramiro e morde-lhe um mamilo. Ramiro grita de dor e dá
um murro brutal na nuca de Elisa.
Elisa solta-se. Ramiro pega o pescoço de Elisa e começa a
apertar.
Aperta com toda a sua força. O rosto de Ramiro mostra raiva e
loucura. O de Elisa, surpresa e dor. Ramiro continua apertando.
Elisa tenta resistir, mas não consegue soltar-se. Fecha os olhos.
Ramiro, com o rosto muito suado, músculos todos tensionados,
começa a chorar.
Olha para trás de Elisa e vê a lua. Elisa abre os olhos.
Desesperada, num impulso final de sobrevivência, fecha as mãos
nos pulsos dele, arranhando-o, cravando-lhe as unhas até sangrar.
Mas Ramiro não a larga. Continua a apertar. Ramiro vê que o rosto
dela vai ficando roxo.
Elisa começa a ter convulsões. Emite ruídos guturais, que pouco a
pouco tornam-se mais profundos, até que, de repente, se acabam.
Ramiro agora chora convulsivamente, arquejante, mas não deixa de
apertar. O corpo de Elisa amolece completamente. Seu pescoço cai
para o lado, num ângulo agudo demais. Está morta.
Ramiro passa a mão no rosto e limpa a mistura de suor e lágrimas.
Afasta um pouco o rosto de Elisa para olhá-la mais uma vez.
O corpo de Elisa despenca sobre a direção do carro, à frente de
Ramiro.
CENA 119 - EXT/NOITE - FIAT / ACOSTAMENTO DA ESTRADA / CAMPO
Ramiro desce do carro. Dá a volta e abre a porta direita. Puxa
para fora o corpo de Elisa.
Pelos pulsos, Ramiro arrasta o corpo para fora do acostamento, na
direção do alambrado. Tem alguma dificuldade para passar o corpo
pela cerca, mas consegue.
Do outro lado, carrega o corpo por mais um dez metros, no meio de
um campo preparado para a semeadura. Larga o corpo no chão. Limpa
o suor da testa.
Ajoelhado, começa a cavar com as mãos. No início, é fácil, porque
a terra está bem fofa e revolta. Mas depois o terreno revela-se
mais duro e compacto. Ramiro levanta. Caminha na direção do
carro.
CENA 120 - EXT/NOITE - ACOSTAMENTO DA ESTRADA
Ramiro abre o porta-malas e tira a chave de rodas, que tem uma
das extremidades em forma de cunha.
CENA 121 - EXT/NOITE - CAMPO
Ramiro usa a chave de rodas para perfurar e revolver a terra.
Assim, consegue fazer uma cova rasa. Extenuado, arrasta o corpo
de Elisa até a cova. Cobre o corpo com terra. Tenta disfarçar um
pouco a cova, refazendo com os pés e as mãos os monturos
alinhados de terra deixados pela passagem do trator.
Ramiro observa seu trabalho e parece satisfeito. Pega a chave de
rodas e dá um passo na direção do acostamento. Imediatamente olha
para o chão e vê a pegada que acaba de imprimir na terra fofa. Ao
lado dela, muitas outras, registros vívidos de suas várias
passagens entre o local da cova e o acostamento. Respira fundo.
Ramiro passa por cima do alambrado. Coloca a chave de rodas no
chão. Inclina-se sobre o alambrado e espalha a terra, disfarçando
as últimas pegadas. Olha para o campo, na direção da cova. O
serviço está quase perfeito. Ramiro respira fundo e volta para o
carro.
CENA 122 - EXT/NOITE - ACOSTAMENTO DA ESTRADA / CAMPO
Ramiro põe a chave de rodas no porta-mala, entra no carro e
arranca, afastando-se rapidamente.
A cova, sob a luz do luar. Uma nuvem, a mais escura e pesada
vista até agora, passa sobre a lua.
FIM DO QUARTO BLOCO
QUINTO BLOCO
CENA 123 - EXT/AMANHECER - ADUANA / POSTO POLICIAL
O Fiat (da irmã) de Gomulka está parado num posto de polícia,
atrás de uma cancela fechada. Na parede do posto, há um cartaz
com a inscrição:
BIENVENIDO A PARAGUAY
Um POLICIAL, perto da janela do motorista, examina atentamente
alguns papéis. Ramiro está sentado ao volante, fumando. O
policial olha para Ramiro. Ramiro sorri amarelo para o policial.
O policial dá a volta no carro e olha para a placa.
O policial vai até um OUTRO POLICIAL e mostra os documentos para
ele. Conversam alguma coisa. O outro policial sacode a cabeça,
negando. Os dois caminham até a traseira do carro e olham para a
placa.
Ramiro fica olhando para eles pelo espelho retrovisor. Ramiro
está suando. O primeiro policial volta e encara Ramiro. Devolve
os documentos.
Faz um sinal na direção do posto. A cancela abre. Ramiro olha
para a frente. Engata a primeira. O policial, de repente, faz um
sinal com a mão, detendo-o. A cancela baixa.
O outro policial chega, com um rádio no ouvido, onde uma voz
castelhana fala alguma coisa ininteligível. Os dois policiais
olham fixamente para Ramiro. A voz no rádio pára de repente. O
primeiro policial sorri. O segundo policial faz sinal de
positivo. A cancela abre. Ramiro acelera e o carro arranca.
CENA 124 - EXT/DIA - ESTRADA ASFALTADA
O carro (da irmã) de Gomulka, em alta velocidade, passa por uma
placa que indica:
ASSUNCIÓN - 190 km
CENA 125 - INT/DIA - HOTEL EM ASSUNCIÓN / QUARTO
A porta abre. Um BOY de hotel entra, carregando uma sacola grande
de plástico de uma loja de roupas de Assunção. Coloca a sacola em
cima de uma cadeira e faz aquelas coisas tradicionais na entrada
de um novo hóspede: acende as luzes, mostra o banheiro, acende a
TV, fecha a janela e liga o ar condicionado.
Ramiro abre a carteira e dá uma cédula para o boy, que sai.
Ramiro pega a sacola e senta na cama. Tira da sacola uma calça,
uma cueca, uma camisa branca, uma camiseta e um par de meias.
Levanta e tira as próprias roupas, ainda sujas de terra.
CENA 126 - INT/DIA - HOTEL EM ASSUNCIÓN / BANHEIRO DO QUARTO
Ramiro toma banho. Olha para as mãos. Suas unhas estão pretas.
Esfrega os dedos, tentando limpá-las.
CENA 127 - INT/DIA - HOTEL EM ASSUNCIÓN / QUARTO
Ramiro, de cueca, veste a camiseta. Guarda as outras roupas no
armário. Vai até a janela. O ar condicionado faz muito barulho.
Ramiro olha para fora e vê a cidade, oito andares abaixo:
achatada, subdesenvolvida, suja, mas com traços de sua antiga
beleza colonial. Há um rio ao longe. Não ouvimos som algum da
cidade, apenas do motor possante do ar condicionado.
Ramiro vai até o frigobar e pega um refrigerante. Olha-se no
espelho na frente da cama. Passa a mão no pescoço, que exibe a
marca do chupão de Elisa. Levanta a camiseta e coloca a ponta dos
dedos no mamilo. Faz uma careta de dor.
Ramiro acende um cigarro e recosta-se na cama para fumá-lo. Bebe
outro gole do refrigerante. Um tremor percorre seu corpo. Leva os
braços de encontro ao peito. Está com frio. Sorri e balança
levemente a cabeça, como se não acreditasse naquela sensação.
Olha para a janela, onde o ar condicionado continua fazendo muito
barulho.
Ramiro levanta e fecha a cortina. O quarto fica na penumbra.
Volta para a cama, apaga o cigarro e deita. Primeiro puxa o
lençol. Depois, ainda com um sorriso nos lábios, puxa a colcha.
Encolhe-se. Fecha os olhos.
CENA 128 - INT/NOITE - HOTEL EM ASSUNCIÓN / QUARTO
Ramiro abre os olhos. O quarto está mais escuro que antes. E,
principalmente, muito mais silencioso: o ar condicionado está
mudo. O rosto de Ramiro está todo suado. O lençol e a colcha
estão no chão. A camiseta está molhada.
Ramiro levanta e vai até a janela. Abre a cortina e olha para
fora.
É noite. As luzes da cidade parecem tímidas e desbotadas, perto
do esplendor vigoroso e espetacular da lua cheia no horizonte.
Ramiro respira fundo quando olha para a lua. Examina o botão do
ar condicionado. Vira o botão para todos os lados, bate no
aparelho, esmurra-o com força, mas é inútil: ele continua mudo.
Ramiro, num gesto brusco, abre a janela. O som da rua chega
forte: buzinas, carros, o apito de um guarda de trânsito.
Ramiro volta para a cama. Senta. Enxuga o suor da testa. Um ruído
agudo de sirenes. Ramiro vai até a janela e olha para baixo: dois
carros de polícia estacionam na frente do hotel. QUATRO POLICIAIS
desembarcam e entram no hotel.
Ramiro acende a luz do quarto. Vai até o banheiro.
CENA 129 - INT/NOITE - HOTEL EM ASSUNCIÓN / BANHEIRO DO QUARTO
Ramiro lava o rosto.
CENA 130 - INT/NOITE - HOTEL EM ASSUNCIÓN / QUARTO
Ramiro pega as roupas limpas no armário. Parece calmo. Começa a
vestir-se. Toca o telefone. Ramiro atende. Ouve.
RAMIRO
Tudo bem. Eu já vou descer.
CENA 131 - INT/NOITE - HOTEL EM ASSUNCIÓN / PORTARIA
Ramiro sai do elevador e olha para a recepção, que está
movimentada, com alguns hóspedes novos chegando. Os quatro
policiais estão ali, bem no meio da confusão. Caminha, resoluto,
até eles. Pára na frente do que parece ser o chefe.
RAMIRO
Boa noite.
POLICIAL PARAGUAIO
Buenas noches.
RAMIRO
Sou Ramiro Bernardes.
O policial olha para Ramiro, sem saber o que dizer. Ramiro fica
um pouco confuso, mas logo retoma sua expressão de mártir.
RAMIRO
Vocês vieram me buscar? Na portaria disseram
que...
Os outros três policiais também olham para Ramiro.
POLICIAL PARAGUAIO
Hay algun engaño, señor. Estamos acá por una
pelea.
O outro policial sorri.
POLICIAL PARAGUAIO
El calor pone la gente loca. Algunos pueden
incluso matar-se.
Ramiro sorri amarelo e dá as costas para os policiais. Vai até um
FUNCIONÁRIO DO HOTEL, que está atrás do balcão.
RAMIRO
Alguém me telefonou, dizendo que me
procuravam.
FUNCIONÁRIO
Ah, señor Ramiro. Por supuesto. Alli...
O funcionário aponta na direção da grande porta envidraçada do
hotel. Uma MENINA muito bonita, parecida com Elisa, está pegando
um cartão postal numa gôndola sobre o balcão do hotel.
Ramiro, por um momento, fica perturbado.
Uma SENHORA, 50 anos, chega junto da menina, fala com ela e as
duas se afastam.
Ao saírem, a menina e a senhora revelam, atrás delas, Elisa, que
está junto ao balcão, e sorri para Ramiro, mais linda e mais
diabólica do que nunca. Imagem congela.
FADE-OUT
FIM
***********************************************************
(C) Jorge Furtado, Carlos Gerbase e Giba Assis Brasil, 1998
Casa de Cinema de Porto Alegre
http://www.casacinepoa.com.br
11/08/1998
Anexo | Tamanho |
---|---|
lunacal4.txt | 63.69 KB |