Jorge Furtado

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Contra a pena de morte

A pena de morte é inaceitável, um resquício de barbárie que, por incrível que pareça, permanece em uso em alguns países como o Irã, os Estados Unidos, o Japão e a China. É totalmente inadmissível entregar ao estado – frequentemente corrupto e autoritário e sempre falível –  o poder de condenar pessoas à morte, sob qualquer pretexto. Além de ser inaceitável, a pena de morte é também inútil como forma de repressão ao crime: todos os estudos sérios sobre o assunto atestam que a criminalidade não diminui com sua implantação, às vezes aumenta.
 
Segundo os dados da Anistia Internacional, 95 países não têm pena de morte para nenhum tipo de crime, 9 mantêm a pena de morte em situações excepcionais (crimes de guerra, é o caso do Brasil), 35 têm pena de morte apenas na teoria (não aplicada há 10 anos ou mais), e 58 países ainda usam a pena de morte para punir crimes comuns.
 
O campeão absoluto de penas de morte em 2009 foi a China, com mais de 1000 execuções. O Irã vem em segundo lugar (338 execuções), seguido do Iraque (120), Arábia Saudita (69) e Estados Unidos (52). O Japão ocupa o décimo posto no ranking na morte, com 7 execuções.
 
Fonte:
http://www.amnesty.org/en/death-penalty
 
Nos 58 países que mantém a pena de morte os métodos de execução são os mais variados: cadeira elétrica, injeção letal, fuzilamento, enforcamento, câmara de gás, etc. O apedrejamento, utilizado em alguns países muçulmanos, é a barbárie acrescida de sadismo, uma doença de estado. É apavorante imaginar que isso ainda aconteça. Se houver inferno, é certo que os apedrejadores irão direto para lá. (O primeiro a combater o apredejamento de adúlteros, previsto pela lei de Moisés, foi Cristo: "Aquele que não tiver pecado que atire a primeira pedra.")
 
Vez por outra surge por aqui alguém sugerindo um plebiscito sobre a adoção da pena de morte no Brasil, como fez, na tribuna do Congresso, o vice de José Serra, deputado Indio da Costa*. Felizmente, por enquanto, a idéia não colou. O Brasil é um dos 104 países que, em 18 de dezembro de 2007, votaram a favor da resolução da ONU contra a pena de morte. (54 foram contra a resolução e houve 29 abstenções).
 
Isso não significa, na minha opinião, que o Brasil ou qualquer outro país deva romper relações diplomáticas ou comerciais ou tomar qualquer atitude beligerante contra o Irã, os Estados Unidos, o Japão ou a China ou com qualquer país, pelo fato deles adotarem a pena de morte. A autodeterminação dos povos e a política de não-interferência em assuntos internos de outros países é fundamental para a manutenção da paz. É triste que países como o Irã, a China, os Estados Unidos e o Japão mantenham a pena de morte. O Brasil pode (e deve) se manifestar contra esta prática, sempre que possível. O que não inclui, eu acho, oferecer asilo político aos cidadãos destes países que, de acordo com suas leis, tenham sido condenados.**
 
A Anistia Internacional protestou – provavelmente com toda a razão – contra a entrevista na televisão em que a iraniana Sakineh Ashtiani “confessava” sua participação no assassinato do marido. Sem liberdade de imprensa no Irã –  e sem imprensa por aqui interessada em fazer o seu trabalho, qual seja, apurar a verdade factual – fica difícil saber se a iraniana foi condenada por adultério, como informam todas as manchetes dos jornais brasileiros, ou por assassinato, como informa a ditadura fundamentalista iraniana.
 
http://www.amnesty.org/en/news-and-updates/tv-‘confession’-iran-ston...
 
A criminalização do adultério é um absurdo completo. Como considerar o amor, ou a falta dele, um crime? O que o estado ou a lei tem a ver com isso? Pois este absurdo completo é mais comum do que parece. O adultério foi crime no Brasil até 28 de março de 2005, quando passou a vigorar a lei nº 11.106, assinada pelo Lula, que extinguiu o artigo 240 do código penal, em vigor desde 1940, e que previa pena de detenção de 15 dias a seis meses. (Veja só, no governo demo-tucano adultério ainda era crime por aqui. “Nunca em toda a história deste país...”)
 
Em sua busca incessante pela popularidade, Lula às vezes escorrega no populismo. Parece ter sido o caso quando ofereceu, num palanque, asilo para a iraniana condenada (por adultério ou assassinato). Lula é presidente do Brasil, não do mundo. Deve, segundo seu juramento de posse, respeitar a constituição e as leis brasileiras, não chinesas, iranianas, americanas ou japonesas.
 
É previsível que a imprensa serrista, procurando cabelo em ovo para combater a popularidade do governo, busque no caso da iraniana um flanco de ataque ao Lula. Não vi esta turma sugerindo que o governo brasileiro interferisse em favor dos 1000 chineses ou dos 52 americanos condenados à morte. Pena que o presidente tenha, ainda que por um momento, levado a sério este humanismo de ocasião.
 
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* Pronunciamento do deputado federal Indio da Costa na tribuna do Congresso, sugerindo um plebiscito sobre a pena de morte:
O SR. PAULO MALUF - Sei do seu amor, Deputado Indio da Costa, pelo Rio de Janeiro, e lhe faço uma sugestão, pelo amor que tenho ao Rio de Janeiro. (...) Pessoalmente, sou contrário à pena de morte. Acho que esses bandidos que estão infernizando o Rio de Janeiro deveriam pegar prisão perpétua. Pergunto a V.Exa.: que tal um plebiscito sobre a implantação de prisão perpétua para esses mercadores da morte?
 O SR. INDIO DA COSTA - Deputado Paulo Maluf, a sua idéia é muito boa, e agrego mais um ponto a ela, embora seja a favor da vida e contrário à morte, se levarmos em consideração que um traficante contribui para o vício, para a morte, para a desintegração social e familiar de milhares de pessoas: um plebiscito para saber se a sociedade é favorável à pena de morte para narcotraficantes, que, repito, estão matando lentamente, destruindo as famílias brasileiras e o que há de melhor no País, a nossa juventude.
Fonte: Câmara dos Deputados, notas taquigráficas.
http://www.camara.gov.br/
 
** Pela mesma lógica, questiono a presença de Cesare Battisti no Brasil. Ele foi condenado em seu país, a Itália, uma democracia, e julgado por crimes de morte, supostamente políticos, praticados em plena vigência do estado de direito. Não tem nada a ver com os atos praticados pelos que foram à luta contra as ditaduras. Mas este é um outro assunto. 
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Lei 11.106, de 2005, que tirou o adultério do Código Penal brasileiro:
http://www.planalto.gov.br/ccivil/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11106.htm
 
Site da Anistia Internacional:
http://www.amnesty.org/en
 
Sobre a Pena de Morte, na Wikipedia:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Pena_de_morte
 
Sobre a morte por apedrejamento:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Lapidação_(pena_de_morte)