Jorge Furtado
Corajosa a entrevista do deputado tucano Luiz Paulo Vellozo Lucas, defendendo que o modelo de concessão - que, como diz a palavra, concede a empresas privadas o direito de buscar e explorar as reservas de petróleo no país - seja aplicado também para as reservas do pré-sal, já descobertas pela Petrobrás.
Lula mudou o sistema e Dilma diz que pretende manter a mudança, assegurando à Petrobrás e ao governo brasileiro o controle da exploração do pré-sal. Questionado por Dilma, no debate da Band, sobre a sua opinião sobre a exploração do pré-sal (Dilma citou entrevistas de um outro tucano que defendia sua privatização), Serra enrolou, disse que tinha "suas próprias idéias" sobre o assunto, só não disse quais seriam.
O governo mudou a regra alegando que o risco no investimento é mínimo, as reservas do pré-sal comprovadamente existem e estão localizadas, e que o país precisa evitar a "maldição do Petróleo", que atinge países que são grandes produtores mas não conseguem escapar da pobreza e ainda enfrentam sérios problemas ambientais (ver Nigéria).
A última resposta do deputado tucano me parece esclarecer uma diferença de lógica entre o governo petista e um eventual governo tucano.
Pergunta da Folha - As ações da Petrobras se desvalorizaram muito neste ano, apesar do futuro promissor que o pré-sal garante à empresa. O mercado tem razão?
Resposta de Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB-ES) - A Petrobras está desviando recursos para investimentos de rentabilidade duvidosa, como as refinarias do Nordeste. A empresa contrata serviços e equipamentos pagando três, cinco vezes mais caro que as concorrentes. É isso o que o mercado olha.
O mercado, como esclarece o deputado tucano, olha primeiro para a "rentabilidade" do investimento, já que é ela, a rentabilidade, que mais determina o valor das ações da empresa na bolsa. O mercado (isto é, a BOVESPA) acha que os investimentos que a Petrobrás, isto é, o governo, faz na construção de refinarias no Nordeste são de "rentabilidade duvidosa". O mercado acha que a Petrobrás paga caro demais ao contratar os serviços da construção da refinaria e, portanto, o investimento tem baixa "rentabilidade".
Um governo, ao contrário do mercado, ao olhar para um grande investimento (como a construção de uma refinaria no Nordeste), deve levar em conta muitos aspectos além dos que possam virar imediatamente um número nos painéis da BOVESPA. Quantos empregos o investimento gera? Qual seu impacto para a economia da região? Como a geração de empregos na região altera os seus índices sociais, tais como escolaridade, assistência médica ou índices de violência? Quais os problemas ambientais que o investimento provoca? É um investimento sustentável?
O mercado, olhando para os números, talvez vislumbre maior rentabilidade num investimento que duplique refinarias já existentes nas proximidades dos grandes centro consumidores, como São Paulo ou o Rio. O governo, que é eleito para representar a vontade da maioria, deve pensar primeiro na rentabilidade social de seus investimentos.
O deputado nega que o governo FHC tenha pensado em privatizar a Petrobras e o entrevistador (que talvez tenha feito as perguntas por escrito) não lhe perguntou nada sobre a tal Petrobrax. De qualquer maneira, é corajosa a postura de um tucano que vem a público, na véspera da eleição, afinal falar de um assunto mais relevante para o futuro do país que bolinhas de papel ou louvores ao nome de Cristo. Os argumentos do deputado são consistentes e, fora uma exaltação ou outra, ponderados.
Na Folha:
ENTREVISTA LUIZ PAULO VELLOZO LUCAS
Petrobras não tem como explorar sozinha o pré-sal
Gabriel Lordello/Folhapress
Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB-ES)
DEPUTADO TUCANO DEFENDE ADOÇÃO DE MODELO CRIADO NO GOVERNO FHC E ENTRADA DE GRUPOS ESTRANGEIROS EM NOVOS CAMPOS DE PETRÓLEO
RICARDO BALTHAZAR
DE SÃO PAULO
A Petrobras não tem como explorar sozinha as gigantescas reservas de petróleo do pré-sal e o governo deveria trabalhar para atrair grupos estrangeiros em vez de inibir sua entrada nos novos campos, diz o deputado Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB-ES).
"Vamos precisar de centenas de bilhões de dólares para explorar o pré-sal e é uma sandice completa achar que a Petrobras e o Estado brasileiro terão dinheiro para tudo", disse na semana passada, em entrevista à Folha.
A entrada da Petrobras na batalha do segundo turno deixou os tucanos numa posição desconfortável. A petista Dilma Rousseff acusa o rival José Serra de defender a privatização da maior empresa do país e entregar as riquezas nacionais a estrangeiros. Serra nega a intenção, mas é vago sempre que lhe pedem para expor seus planos para o setor. "O PT propôs ao país um debate mentiroso e ficou difícil discutir assim", diz Vellozo Lucas, aliado de Serra.
Folha - Que avaliação o sr. faz dos resultados obtidos com o fim do monopólio da Petrobras na exploração de petróleo e a abertura do setor?
Luiz Paulo Vellozo Lucas - Foi a mais bem sucedida política de desenvolvimento setorial da história do país. A abertura atraiu capital para novos investimentos, sem privatizar nem vender nada. A produção dobrou. Nossas reservas de petróleo quintuplicaram. A receita obtida pelo governo com a exploração das nossas riquezas minerais cresceu mais de cem vezes.
É verdade que o governo Fernando Henrique Cardoso tinha a intenção de privatizar a Petrobras, como diz o PT?
Isso nunca passou pela cabeça de ninguém. Com a abertura, a Petrobras passou a operar num ambiente competitivo e cresceu. Era fundamental que continuasse estatal, porque no início os grupos estrangeiros que vieram para o país entraram associados à Petrobras. Ninguém teria vindo sem a segurança que ela oferecia. Não era necessário privatizá-la, e teria sido um tiro no pé fazer isso.
A entrada de multinacionais no setor gerou benefícios?
Hoje as companhias estrangeiras têm uns 5% da exploração de petróleo no Brasil. Seria interessante, e oportuno, que tivessem um pouco mais. Haveria mais investimentos, mais produção. O que importa é maximizar a geração de riqueza no país.
O modelo de concessões em vigor atualmente é adequado para a exploração das reservas encontradas no pré-sal?
Não há nada errado com esse modelo. O PT está no poder desde 2003 e fez seis leilões seguindo as regras desse modelo. Agora dizem que concessão é privatização, porque querem fazer desse troço uma bandeira eleitoral.
O governo argumenta que precisa de outro modelo para a exploração do pré-sal porque os riscos são menores nos novos campos, onde não há dúvidas sobre a existência de grandes reservas de óleo.
O argumento é falso. Não se pode dizer que não há risco nenhum numa atividade como essa. Há riscos ambientais, desafios tecnológicos a superar, riscos empresariais.
O que justifica então a decisão do governo de propor um novo modelo de exploração?
O PT mudou de ideia nesse assunto em 2007, quando a descoberta do campo de Tupi mostrou o tamanho das reservas existentes no pré-sal. Havia um leilão previsto para o fim do ano e vários blocos próximos de Tupi seriam oferecidos. O interesse por essas áreas era enorme e grupos brasileiros e multinacionais estavam se preparando para pagar caro por elas. A Petrobras não ia ter dinheiro para disputar todos os blocos e certamente ia perder alguma coisa para o Eike Batista, a Shell e outras companhias.
Qual seria a consequência?
Em vez de ter 95% do mercado como hoje, a Petrobras ficaria com 92, 93%. Qual o problema para o Brasil? Nenhum. Estaríamos trazendo dinheiro, investimentos, criando empregos do mesmo jeito. Mas o que estava em jogo era a entrega dos novos campos para a Petrobras sem licitação, e sem que eles precisassem pagar o bônus elevado que teriam que desembolsar no leilão. Foi por isso que o governo tirou a maioria dos blocos do leilão e decidiu mudar as regras no pré- sal.
Por que o governo deveria permitir que as multinacionais ficassem com esses blocos em vez da Petrobras?
Mas não se trata de entregar a riqueza nacional como o PT diz. Nós estaríamos pegando o dinheiro dos grupos estrangeiros para desenvolver nossas jazidas e gerar recursos para o país. Vamos precisar de centenas de bilhões de dólares para explorar o pré-sal e é uma sandice completa achar que a Petrobras e o Estado brasileiro terão dinheiro para fazer tudo.
O governo argumenta que, com o novo modelo, poderá controlar melhor o ritmo de exploração do pré-sal e usar os novos campos para desenvolver a indústria naval e outros fornecedores do setor.
Bobagem. O ritmo de exploração poderia ser determinado pelo ritmo dos leilões, sem mudar regra nenhuma. Se o que eles querem é desenvolver a indústria nacional, bastaria exigir nos leilões que os interessados fizessem aqui uma parcela maior das suas encomendas. A mudança da lei é o maior erro estratégico de política econômica da nossa história.
Por quê?
O Tesouro se endividou para capitalizar a Petrobras. O setor de petróleo deveria estar gerando recursos para os investimentos que precisamos fazer em aeroportos, estradas e escolas. Em vez disso, o governo se endividou para financiar a Petrobras, para que ela assuma a responsabilidade de ser a única operadora nos novos campos. Não tem sentido.
O governo diz que as companhias estrangeiras virão mesmo assim porque não há oportunidades tão boas para investir em outros países.
Precisamos ver se vão entrar com capital, assumindo riscos. Se o modelo defendido pelo governo for aprovado, uma nova empresa estatal vai controlar os custos de cada projeto e dizer o que vai poder ser fabricado aqui ou ali. Os petistas garantem que a empresa será formada apenas por técnicos, sem ingerência política. Só se a sede for em Frankfurt. Quem vai mandar nessa empresa vai ser o PMDB do Maranhão.
As ações da Petrobras se desvalorizaram muito neste ano, apesar do futuro promissor que o pré-sal garante à empresa. O mercado tem razão?
A Petrobras está desviando recursos para investimentos de rentabilidade duvidosa, como as refinarias do Nordeste. A empresa contrata serviços e equipamentos pagando três, cinco vezes mais caro que as concorrentes. É isso o que o mercado olha.
PERFIL, da Folha de S. Paulo:
O deputado Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB-ES) apanhou feio nas urnas nas eleições deste ano. Candidato ao governo do seu Estado, ele só conseguiu 15% dos votos e foi derrotado pelo senador Renato Casagrande (PSB), eleito governador com 82% dos votos.
Vellozo Lucas perderá seu mandato na Câmara dos Deputados com a posse do novo Congresso no ano que vem e só terá outra chance em 2012, quando poderá se candidatar à Prefeitura de Vitória, que administrou de 1997 a 2004.
Funcionário de carreira do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), ele chefiou a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda por dois anos no governo Fernando Henrique Cardoso.
No início deste ano, Vellozo Lucas participou ativamente no Congresso do debate sobre o novo modelo proposto pelo governo para a exploração do pré-sal. O projeto foi aprovado no Senado e remetido à Câmara, onde deverá ser examinado depois das eleições. (RB)