Jorge Furtado

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Poemas ortográficos

número 38:

Brilha o olho de quem diz:
“Eu sempre quis ser atriz.”
Pergunta se é tino ou vício.
Pode ser um bom ofício,
capaz de fazer feliz
quem de pronto reconhece
que espectador é com s,
expectativa, com x.

x

número 37:

Em tudo difere o pobre,
do rico, que é seu oposto,
outros gastos, outros gostos,
um tem, outro não tem cobre,
são outros pratos na mesa.
A pobreza, com a riqueza,
numa coisa só parece:
escreve com z, não com s.

x

número 26:

Para descansar a bunda
você precisa de assento,
com dois esses, não confunda.
Com dois esses, não com cê.
Acento com cê, lembra tu,
é o que aparece em você.
Preste atenção, tome tento,
pois se no assento tem cu,
no cu nunca tem acento.

x

número 15

Os pobres são solidários
São gregários, vão em bando
Os ricos são solitários,
têm par só de vez em quando
Quem sobe, fica sozinho.
Já quem despenca, isto é certo,
logo encontra seus amigos,
colegas, primos, vizinhos.
A multidão é um abrigo.
O vértice, um deserto.
No fim, tudo é igualado
na solidão de um defunto.
Porque em cima é separado
mas embaixo é tudo junto.

x

número 12

Nenhum homem é uma ilha.
A solidão endoidece
quem se embrenha numa trilha
e o resto do mundo esquece
em busca de maravilhas.
Nem tudo é o que parece,
não caia nesta armadilha.
Nem tudo que queima, aquece,
nem tudo que é ouro brilha.
Obsessão tem três esses;
exceção, xis, cê, cedilha.

x

número 23

É uma odisseia,um castigo,
eu me esforço, luto, tento,
mas quase nunca consigo
ter ideias sem acento.

x

número 8

Por conta da nova norma,
que a mim parece ter nexo,
não há acento na forma.
Na fôrma há, o circunflexo.
É opcional, pode pôr,
se for compor uma ode,
seja na forma que for,
soneto, samba ou pagode.
Acento em fôrma é um favor,
ontem não pôde, hoje pode.

x

número 9

O doente não tem nada.
A doença é egoísta,
guarda para si o que lhe agrada
por mais que o doente insista.
Um do outro não esquece,
o outro só pensa no um.
Obsessão tem três esses.
O obcecado, nenhum.