Jorge Furtado
Um dia desses assisti “Ladrões de Bicicleta”, numa sessão seguida de debate com Eneas de Souza e Flavio Koutzzii. Já vi o filme muitas vezes e ele não para de melhorar. No público, muita gente que estava vendo pela primeira vez, teve quem riu e chorou feito criança.
Ninguém assiste a um clássico impunemente, “Ladrões de Bicicleta” transforma quem o vê. Tudo ali é excepcionalmente bom, começando pela direção de De Sica, talento que mudou a história do cinema, os atores e a idéia de produção, a sólida base política, moral e estética de sua linguagem, mas a grandeza de “Ladrões de Bicicleta” ergue-se sobre a estrutura brilhante do seu roteiro, uma aula de dramaturgia, desde a sua primeira cena.
Parte do serviço foi feito por uma moça italiana de muito talento, Suso D’Amico. Ela nasceu em Roma em 1914, era filha de um tradutor de peças teatrais, a filha de um intelectual - ela leu Dostoievski aos 13 anos - a quem os amigos cineastas do pai davam roteiros para ler, para opinar se os jovens poderiam vir a se interessar pela fita. Até que um dos amigos do pai teve a boa idéia de convidá-la para trabalhar num roteiro, em parceria com Alberto Moravia. Ela não parou mais. Tinha 34 anos quando trabalhou com Cesare Zavattini no roteiro de “Ladrões de Bicicleta”. A idéia de Zavattini era acompanhar um dia de um desempregado em Roma, um homem que tem sua bicicleta roubada. Suso sugeriu que o homem roubasse uma bicicleta e o roubo fosse presenciado por seu filho.
No seu currículo estão os roteiros de “Roma, Cidade Aberta” e “Milagre em Milão”, também do De Sica, “Rocco e seus irmãos”, “O Leopardo” e “Belíssima”, do Visconti. Nem precisava mais. Mas tem, muito mais. Ela trabalhou como roteirista em mais de cem filmes.
Suso D’Amico, uma grande artista, morreu hoje em Roma, aos 96 anos.
Filmografia de Suso D’Amico no IMDB:
http://www.imdb.com/name/nm0147599/